Três décadas de Mercado Único em análise
Celebramos 30 anos do Mercado Único Europeu! Assinalamos um marco crucial no desenvolvimento e na coesão dos países da União Europeia. Há pouco mais de 30 anos, estaríamos longe de imaginar uma Europa sem fronteiras, de livre circulação e com uma moeda comum.
A livre circulação de pessoas proporcionou a deslocação de conhecimento entre países, num processo de transferência de recursos humanos para regiões com maior escassez em determinadas áreas. A multiculturalidade na União é hoje um dos seus pontos fortes e o fator que lhe confere a sua verdadeira identidade e autenticidade.
Apesar de se tratar de um projeto que proporcionou o mais longo período de paz e permitiu o acesso livre a um mercado concorrencial de aproximadamente 500 milhões de consumidores, o processo de adaptação ao longo destes 30 anos não está isento de obstáculos. São vários os países que têm tido desafios ao lidar com a concorrência, sobretudo em sectores mais tradicionais. No caso de Portugal, e muito por culpa própria, tem-se insistido em políticas de baixos salários como fator diferenciador, política essa que se tem traduzido na fuga de mão-de-obra especializada e descidas sucessivas no índice de competitividade face, por exemplo, a países do leste da Europa.
A indústria do Turismo e Viagens foi talvez aquela que mais beneficiou de um mercado sem fronteiras e de uma moeda única. Sem a livre circulação de pessoas e capitais, visitar a Europa não seria a mesma coisa. Países mais periféricos beneficiam hoje, em larga escala, de destinos mais conhecidos e que servem de chamariz ao turista.
No caso concreto do Turismo, a Região Autónoma da Madeira tem sido um caso exemplar de sucesso, tratando-se hoje de um destino (re)conhecido internacionalmente, continuando a atrair turistas de mercados tradicionais como o Reino Unido, Alemanha e França e procurando investir noutros mercados como os EUA, Canadá e Brasil, aos quais continua a oferecer um serviço de alto valor acrescentado.
O desenvolvimento da indústria da aviação, que culminou no surgimento de companhias “low-cost”, só foi possível por haver um Mercado Único de acesso livre. Destinos até então desconhecidos beneficiaram da chegada de companhias de baixo custo, facilitando também o desenvolvimento de aeroportos regionais. Ao nível do Turismo, o Mercado Único, muito mais que aumentar a concorrência, incrementou a complementaridade dos destinos. Também aqui a R.A.M sai beneficiada com estas companhias que, ao oferecerem um serviço competitivo, permitiram acabar com um longo período de monopólio da hoje tão polémica e estatal TAP.
Em 30 anos, o panorama no sector alterou-se de forma vincada, mas há ainda muito a fazer e a pandemia Covid-19 revelou essa necessidade. Apesar das competências nacionais, é importante desenvolver políticas europeias para o Turismo. Desde logo, uma Agência que permita a recolha e tratamento de dados, de acesso livre para os agentes deste ecossistema, permitindo uma análise e gestão inteligente dos fluxos e oferta turística. O Turismo de massa permite a obtenção de receita importante, mas aporta também muitos problemas, sobretudo para os habitantes locais. Através da “Big Data” será possível entender as mudanças no comportamento do consumidor e melhorar o sector com produtos, segmentos e mercados de origem direcionados. Nem todas as empresas do sector estão preparadas - ou têm capacidade financeira - para obter e tratar informação crucial para a tomada de decisões, daí ser fundamental o apoio europeu.
Com um peso de 10% no PIB da União, o Turismo é fundamental para todos os Estados-Membros, sendo que em alguns é mesmo o principal motor económico. É por isso crucial uma política uniformizada que promova o destino Europa.
Em períodos de maior dificuldade é o Turismo que mais sofre, mas também o que mais rapidamente recupera e impulsiona a recuperação. Deve, pois, ser do interesse dos decisores políticos criar condições de apoio ao sector, nomeadamente através de financiamento europeu direto, o que até hoje não acontece ou apenas se verifica de forma esporádica.
Extravasando as fronteiras do Turismo, as condições de vida dos Madeirenses e Portossantenses são hoje incomparavelmente melhores que há 30 anos. Sem o Mercado Único, este desenvolvimento teria sido, na melhor das hipóteses, mais lento.
Ao fim de trinta anos, é crucial que a União repense o seu Mercado Único, que faça uma avaliação séria do muito que foi conseguido, dos erros a corrigir e das prioridades futuras. Os próximos anos serão, por isso, determinantes. Haja coragem política para implementar as mudanças necessárias.