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Comissão recomenda "reponderação" da base de dados prevista na Lei de Saúde Mental

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A Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD) recomendou a "reponderação" da base de dados prevista na Lei de Saúde Mental, alegando ser imprecisa a sua finalidade, a categoria dos dados a recolher e o seu prazo de conservação.

"A imprecisão revela-se, desde logo, quanto à finalidade da base de dados, que em ponto algum vem explicitada, bem como quanto às categorias de dados pessoais a recolher e ao respetivo prazo de conservação", refere o parecer da CNPD solicitado pela comissão de Saúde da Assembleia da República e que a Lusa teve hoje acesso.

Segundo o documento, em causa está o artigo que prevê uma base de dados informática, no âmbito da comissão para o acompanhamento da execução do regime jurídico do tratamento involuntário, a "que terão acesso entidades públicas ou privadas que nisso tenham interesse legítimo".

"Na verdade, o artigo 43º da proposta revela imprecisões no seu texto-norma, que não permitem compreender o sentido global do seu âmbito normativo, mas também revela insuficiências na definição dos elementos principais do tratamento de dados pessoais, e em especial na regulação do acesso por terceiros", alerta o parecer.

A comissão salienta ainda que merece "maior perplexidade" a parte final do artigo em causa, quando admite o acesso à base de dados por entidades "que nisso tenham interesse legítimo".

Neste ponto, o parecer sublinha que, numa matéria sensível como o tratamento de dados de pessoas especialmente vulneráveis, admitir que o "interesse legítimo" de uma entidade privada é suficiente para "comprimir os direitos fundamentais" à proteção dos dados e à reserva da vida privada, "revela-se uma disposição desproporcionada e em manifesta contradição" com o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados.

Perante isso, a CNPD recomenda a revisão do artigo em causa, em especial para que "se repense a criação de uma base de dados de saúde mental", ainda para mais "num tempo que se tem caracterizado por manifestas vulnerabilidades dos sistemas de informação".

Caso o legislador persista na sua constituição, a comissão alerta para a necessidade de a lei densificar as condições da criação dessa base de dados, especificando em concreto as medidas de segurança e de proteção dos dados que devem ser adotadas.

Além disso, o regime de acesso a esta informação pessoal deve ser revisto, preconiza o parecer, ao sublinhar que o "acesso a dados pessoais de saúde mental representa um grau de ingerência tão elevado na vida privada dos respetivos titulares que apenas interesses específicos e em circunstâncias bem densificadas no plano legislativo devem legitimar o acesso a tal informação".

A CNPD recomenda também que se estabeleça a natureza secreta do processo de tratamento involuntário, que constava do anterior regime legal e que "caiu" na atual proposta, ou pelo menos um regime de acesso reservado.

O parecer defende ainda que seja regulado o procedimento de identificação de "pessoa de confiança", eventualmente no processo clínico ou no processo de tratamento involuntário, por razões de certeza jurídica.

Esta figura de "pessoa de confiança" é uma inovação prevista na nova Lei de Saúde Mental, sendo indicada pelas pessoas com necessidades de cuidados de saúde mental, mas não sendo necessária qualquer intervenção judicial para a sua designação.

Segundo a CNPD, a lei nada diz "sobre a forma ou procedimento a seguir para a designação da pessoa de confiança, nem tão-pouco se e onde fica registada tal qualidade", o que pode levar a que "qualquer terceiro invoque essa qualidade e tenha acesso a dados relativos à saúde mental de outrem".

O diploma do Governo sobre a saúde mental foi aprovado, na generalidade, no parlamento em outubro de 2022 e pretende substituir a legislação sobre esta matéria em vigor há cerca de 20 anos.

A proposta de lei, que baixou à Comissão de Saúde, insere-se na reforma da saúde mental que o Governo quer concluir até final de 2026 e que recorre a 88 milhões de euros para investimentos nesta área, disponíveis no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).

De acordo com o Ministério da Saúde, o diploma, que teve o contributo de um grupo de peritos, pretende atualizar a legislação que vigora nas últimas duas décadas, tendo em conta os desenvolvimentos científicos, jurídicos e de direitos humanos registados ao longo desse período.