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ONG venezuelana documentou mais de 14 mil execuções extrajudiciais em dez anos

Foto Shutterstock
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A organização não-governamental (ONG) venezuelana Comité de Familiares das Vítimas (COFAVIC) informou hoje que documentou, nos últimos dez anos, 14.296 alegadas execuções extrajudiciais cometidas por funcionários de segurança do Estado contra a população.

Numa carta enviada ao Alto-Comissário da ONU para os Direitos Humanos, Volker Turk, que iniciou quinta-feira uma visita de três dias à Venezuela, a COFAVIC sublinhou que se trata de "uma média superior a 1.400 mortes anuais".

"Ao longo de uma década (2012-2022), a COFAVIC registou dados independentes sobre alegadas execuções extrajudiciais, que ascendem a 14.296 casos a nível nacional, ou seja, uma média de mais de 1.400 mortes anuais, causadas por agentes de segurança do Estado", lê-se numa cópia da carta, divulgada pela ONG.

No documento explica-se que se trata de informação "de especial relevância sobre a situação dos direitos humanos na Venezuela", resultante de uma "investigação permanente e de documentação e acompanhamento direto das vítimas".

A COFAVIC sublinhou que é "necessário expor a natureza sistemática destas violações", o que demonstra "a gravidade desta situação no contexto nacional".

"Desde 2012, desenvolveu-se na Venezuela um padrão caracterizado por um aumento dos índices de violência estatal e no referente à impunidade. Em particular (...) em operações de segurança dos cidadãos, especialmente em áreas urbanas muito vulneráveis, durante as quais foram cometidas violações muito graves dos Direitos Humanos", explica-se.

No documento refere-se que "o Ministério Público da Venezuela informou a ONU de que entre 2017 e 2021 iniciou 4.890 investigações sobre execuções extrajudiciais" com "sentenças condenadas em 16% dos casos" e explica que os dados oficiais, evidenciam "a gravidade deste fenómeno que viola o direito à vida e, sobretudo, a margem de impunidade que prevalece".

Por outro lado, destaca-se que organizações nacionais e internacionais têm denunciado a natureza "letal que caracteriza as operações realizadas pelas Forças de Ações Especiais (FAES), uma unidade fundada em 2016 no seio da Polícia Nacional Bolivariana (PNB), e apelado à sua dissolução".

A este respeito, explica-se que entre maio de 2021 e abril de 2022 foi iniciado um processo de reestruturação daquela força policial e que declarações oficiais asseguraram a extinção das FAES, mas "numerosos testemunhos de vítimas asseguram que continua a funcionar e a levar a cabo operações de segurança dos cidadãos".

A ONG diz que continuar a ser feito uso desproporcionado da força e referiu "casos muitos graves" ocorridos em 2021 na Cota 905 (Caracas) e em 2022 em Las Tejerías (estado de Arágua) e no bairro José Féliz Ribas (estado de Miranda), que afetaram "muitas famílias de baixos rendimentos".

"Em paralelo, temos denunciado o reforço de uma política estatal que procura fechar o espaço cívico democrático, através da constante criminalização, perseguição e ameaças a indivíduos e organizações que defendem os direitos humanos", acusou a COFAVIC, frisando que documentou 1.221 casos entre 2018 e 2021.

Segundo a COFAVIC, o Estado venezuelano tem construído "restrições judiciais, legais e administrativas destinadas a obstaculizar e tornar impossível a ação livre e independente que deveria caracterizar o trabalho das ONG", o mais recente o projeto de Lei de Fiscalização, Regularização, Atuação e Financiamento das ONG e Afins que "estabelecerá restrições definitivas ao direito de associação na Venezuela".

A ONG diz ainda que na Venezuela se está "a enfrentar uma grave crise de direitos humanos, cujas razões estruturais não só permanecem, como se aprofundaram," tal como salientado em relatórios da Missão de Averiguação dos Factos da ONU para a Venezuela e a Procuradoria do Tribunal Penal Internacional, segundo os quais existem motivos razoáveis para afirmar que foram cometidos crimes contra a humanidade no país.