Francisco Assis apela a uma "reforma da lei" do Conselho Económico e Social
O presidente do Conselho Económico e Social (CES), Francisco Assis, apelou a uma "reforma da lei" da instituição, que comemora 30 anos, com a apresentação de um livro sobre a sua história.
Em declarações à Lusa, Francisco Assis disse que a organização conta com três objetivos principais para o futuro. Assim, destacou, o primeiro passa por "reforçar o papel do CES no apoio ao processo de concertação social", e o segundo por acentuar "o papel do CES enquanto entidade fundamental da administração consultiva do Estado".
Por fim, realçou, o terceiro objetivo é "valorizar o papel do CES enquanto promotor de novas iniciativas no âmbito da chamada democracia deliberativa, que sirvam para rejuvenescer um pouco a democracia portuguesa".
Para o líder da entidade, "é necessário uma reforma da lei do CES", uma tarefa que compete à Assembleia da República.
"Vou apelar ao parlamento para que se empenhe e que este ano seja o ano da reforma da lei do CES", indicou, salientando que a instituição tem de se "atualizar, pois tem 30 anos", tendo surgido "num contexto histórico que está hoje notoriamente ultrapassado".
Assis apontou depois as principais mudanças que defende para a lei do CES.
"Criar condições para reforçar de facto a função do CES no processo de concertação social, clarificando algumas coisas", começou por explicar.
Além disso, destacou, "é preciso criar condições para que o CES seja o organismo que concentre, o máximo possível, a administração consultiva do Estado".
Segundo Francisco Assis, "há uma serie de órgãos ligados a essa administração consultiva que existem separados uns dos outros", sendo que, defendeu, "haveria alguma vantagem em colocá-los no CES".
Por fim, o responsável quer que o CES possa "desenvolver iniciativas como a criação de assembleias de cidadãos a semelhança do que faz o CES francês", onde se "possam discutir determinados temas cujas conclusões serão enviadas para a Assembleia da República, Governo, Presidente da República e sociedade portuguesa em geral", referiu.
Questionado sobre a contestação social atual, Assis disse que é natural, visto que há "um processo complicado de inflação, perda de rendimentos. É natural que haja alguma contestação social".
Quanto aos desafios para este ano, lembrou que "foi assinado um acordo de concertação social há três meses", que incide sobre duas dimensões: "rendimentos e competitividade da economia", salientando que "é preciso concretizar plenamente o acordo".
O CES apresenta hoje um livro, da autoria de Pedro Tadeu, chamado "30 anos de Conselho Económico e Social" que relata alguns factos, através de testemunhos de personalidades relevantes na vida da instituição e lança o debate sobre o futuro.
As "luzes e as sombras" de três décadas do CES na opinião de 29 personalidades
As divergências sobre o papel fundamental ou inútil, corporativista ou conciliador do Conselho Económico e Social na transformação do país marcam 29 depoimentos no livro editado pela Almedina, que reúne depoimentos de governantes, sindicalistas, líderes de confederações e ex-presidentes da instituição, além de oferecer cronologias, detalhes sobre como funciona e os acordos obtidos na Concertação Social.
"Os trinta anos do CES que agora se comemoram terão tido luzes e sombras", escreve o antigo Presidente da República Aníbal Cavaco Silva no primeiro depoimento do livro, cuja apresentação contará com a presença de Marcelo Rebelo de Sousa.
Cavaco Silva sublinha que apesar desse histórico misto, na genése do CES está um conceito "que se mantém atual" e que deve continuar: diálogo para encontrar compromissos que levem a melhorias económicas e sociais.
Essa difícil tarefa e as divergências nos depoimentos que avaliam a Concertação Social são resumidas pelo autor na introdução do livro.
"[Opiniões] negativas: líderes patronais que pensam que esta estrutura não devia existir, governantes que confessam não ter lido os pareceres do CES sobre as Grandes Opções do Plano, sindicalistas que acusam a instituição de corporativismo e de prejudicar sempre os trabalhadores, membros do CES que acham as reuniões inúteis, autores de pareceres que sentem desvalorizados pelo poder político", escreve Pedro Tadeu.
Do lado positivo, o autor destaca governantes "que sentem que o debate ali feito melhora a legislação, líderes patronais que veem um instrumento de fundamental para o sucesso empresarial, sindicalistas que encontram nesse espaço a melhor forma de contrabalançar o poder patronal, membros do Plenário que descobrem no Conselho um relevante ponto de contacto direto com o do poder político, autores de pareceres que defendem o contributo do CES para uma visão mais estratégica do país".
Francisco Assis, presidente do CES desde julho de 2020, optou por não conceder uma entrevista para o livro, mas salienta no prefácio que o CES, tal como outras instituições homólogas europeias dedicadas a promover o diálogo permanente entre sindicatos e patronato, viu o mecanismo ser criticado por partes opostas, nomeadamente os liberais radicais e os marxistas ortodoxos.
"Os primeiros recusam a ideia de um conflito que não possa e deva ser resolvido pelas leis naturais do mercado; os segundos rejeitam qualquer tipo de entendimento dado que só a revolução social permitirá a superação da luta de classes", vinca.
A cronologia destaca não só os marcos do CES - incluindo a criação em 1983 do Conselho de Concertação Social e a passagem deste para integrar o CES em passos entre 1989 e 1992 - mas também os eventos principais da luta sindical, da atividade política e da vida económica do país.
Além das greves, da entrada na CEE e dos pedidos de resgate, grande destaque é dado à recusa inicial da CGTP-IN de integrar a Concertação Social e à criação da UGT.
Os 29 depoimentos são divididos em três capítulos.
Nos governantes, Manuela Ferreira Leite diz que se sentiu "inútil" no CES, enquanto Vítor Gaspar realça o papel da instituição na prestação de contas pelo Governo e José Vieira da Silva, recordista de Acordos na Concertação sublinha o período de 2006 a 2008 como o mais produtivo, devido à estabilidade governativa da maioria absoluta do PS.
O capítulo dedicado às entrevistas com sindicalistas arranca com Manuel Carvalho da Silva. O líder da CGTP-IN entre 1987 e 2021 acredita que a Concertação Social "representa o lado mais conservador do velho arco da governação", pois limita qualquer projeto político que queira entendimentos à esquerda.
Entre os patrões, Ferraz da Costa mostra-se descrente na Concertação pois a soberania reside no parlamento, enquanto Eduardo Oliveira e Sousa, da CAP, lamenta o recente "esvaziamento" da Concertação Social pelo Governo.
O depoimento final é precisamente do Governo, com o primeiro-ministro António Costa a apontar os 18 acordos de Concertação Social com prova da vitalidade do CES.
"O CES não é apenas um órgão de consulta e Concertação Social, mas é hoje, cada vez mais, um elemento fundamental da democracia portuguesa", sublinhou.