Supremo do Brasil suspende censura a reportagem sobre imóveis de Bolsonaro
O tribunal supremo do Brasil suspendeu na sexta-feira a decisão judicial que proibiu uma reportagem sobre o uso de dinheiro vivo por parte do Presidente brasileiro e da sua família para comprar 51 propriedades, classificando-a de censura.
A decisão que ordenava ao portal de notícias UOL que retirasse a reportagem da Internet ficou sem efeito por decisão do magistrado André Mendonça, um dos membros do Supremo Tribunal Federal (STF), em resposta a um recurso apresentado pelo meio de comunicação censurado.
"No Estado Democrático de Direito deve ser assegurado aos brasileiros de todos os espectros político-ideológicos o amplo exercício da liberdade de expressão. O cerceamento a esse livre exercício, sob a modalidade de censura, a qualquer pretexto ou por melhores que sejam as intenções, não encontra guarida na Constituição Federal", escreveu o magistrado na sentença, reconhecendo assim que a decisão anterior configurava uma forma de censura.
A sentença do tribunal supremo foi anunciada na noite de sexta-feira, poucas horas após a decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal de Brasília obrigar o UOL a retirar as reportagens, provocando críticas de diversos organismos de defesa da liberdade de expressão.
A medida tinha sido ordenada pelo juiz Demetrius Gomes Cavalcanti, do Tribunal do Distrito Federal de Brasília, em resposta a um pedido do senador Flávio Bolsonaro, um dos filhos do chefe de Estado, Jair Bolsonaro, causando revolta em vários setores da sociedade brasileira que classificaram a decisão de censura.
O juiz justificou a sua decisão cautelar pela "proximidade do processo eleitoral em que o pai do peticionário concorre a um cargo público de notória expressividade e a continuidade da divulgação dos referidos assuntos trará, não só aos familiares mas também ao candidato, danos à sua imagem e honra".
Bolsonaro aspira a ser reeleito nas eleições de 02 de outubro, mas as sondagens colocam-no em segundo lugar, com cerca de 33% dos votos, atrás do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, favorito com cerca de 47%.
Depois de analisar 107 transações imobiliárias realizadas por Bolsonaro, seus filhos, suas ex-mulheres e seus irmãos desde 1990, o portal identificou que 51 propriedades foram adquiridas totalmente, ou parcialmente, em dinheiro.
Segundo a reportagem, 13,5 milhões de reais (cerca de 2,6 milhões de euros) em dinheiro foram utilizados para adquirir estas propriedades, que em valores atualizados ascenderiam a 26,6 milhões de reais (cerca de 5,1 milhões de euros).
O portal argumenta que, embora as transações em dinheiro não sejam um crime, podem destinar-se a dificultar a localização de montantes provenientes de fontes ilegais.
Num comício na sexta-feira à noite, Bolsonaro referiu-se à reportagem do UOL como "calúnia" e afirmou defender a liberdade de imprensa.
"Covardia. Covardia com a minha família, com a minha mãe já falecida. Esperar o quê do grupo Folha/UOL, a não ser mentira, calúnia", disse o Presidente brasileiro, acrescentando: "Eu defendo a liberdade de imprensa mesmo sendo atacado. O outro lado quer controlar a mídia".
Segundo a sentença do juiz que ordenou a retirada, parte dos dados constantes da reportagem vetada pelo tribunal foi obtida de forma irregular.
Isto porque algumas das informações utilizadas pelo UOL provêm de investigações realizadas pelo Ministério Público do Rio de Janeiro contra os filhos do Presidente, Carlos e Flávio Bolsonaro, por alegadas irregularidades na compra de bens imobiliários, parte das quais foram anuladas pelo sistema judicial por fazerem parte do segredo bancário.
Para o portal, que recorreu para o supremo, a decisão do juiz extrapola e procura evitar o debate político uma semana antes das eleições presidenciais.