"Isto pode ser o princípio do fim de Putin", diz ex-primeiro-ministro finlandês
O ex-primeiro-ministro finlandês e atual diretor do Instituto Universitário Europeu (EUI) Alexander Stubb considerou que situação na Rússia é imprevisível, que se deve estar preparado para o pior e que pode até ser o fim de Putin.
"Não quero prever nada, mas isto pode ser o principio do fim para Putin. O seu discurso [sobre a mobilização parcial na Rússia] foi de desespero, ele está encurralado e por isso é uma situação perigosa", disse numa entrevista à Lusa, em que também abordou o papel dos meios de comunicação social.
Alexander Stubb participou numa Conferência Internacional do Observatório da Europa Central para os Meios Digitais, que termina hoje em Praga, tendo sido o orador principal num debate sobre "Fact-checking: factos, informação e media".
Para o político finlandês, o líder russo deixou três mensagens-chave no discurso que pronunciou há dois dias: "mobilização parcial de jovens, continuação da guerra e ameaça velada de usar armas nucleares."
"Ninguém pode saber, mas, com Putin, temos de estar preparados para o impossível. Muita gente diz que ele é irracional, mas ele é racional na sua perspetiva", afirmou.
Segundo o antigo primeiro-ministro finlandês, Putin queria tornar a Rússia grande de novo, à semelhança do discurso de Donald Trump, e fazer uma guerra simples e rápida, mas tudo o que pretendia virou-se ao contrário: a Ucrânia tornou-se europeia, a Europa uniu-se, a aliança transatlântica revitalizou-se, a NATO ganhou um novo propósito e a Finlândia e a Suécia entraram na NATO.
"Para nós parece que Putin foi estúpido ou irracional, mas não se espere que ele esteja a fazer 'bluff', ele pode estar a fazê-lo e não usar armas nucleares, mas temos de estar preparados para o pior. Isto é muito importante", advertiu.
Para Stubb, há golpes palacianos ou mudanças de regime na Rússia, mas os lideres em geral são afastados e não mortos e nem se pode saber se lhe seguiria um nacionalista mais extremista. "A Rússia é uma sociedade muito disfuncional, mas não pensámos que chegasse a este ponto", afirmou.
"A Rússia tinha dois instrumentos de poder, a energia, que já não tem, já que a Europa se está a separar da dependência face ao gás russo; e o outro era o aparelho militar, e agora vê-se que a NATO nem sequer teve de aparecer para se verificar o seu mau desempenho no terreno", acrescentou.
Sobre a situação na Rússia, o político finlandês é da opinião que "pode levar a uma nova fase da guerra".
"A partir de agora, todos perceberam que isto vai levar muito tempo e as pessoas que, na Rússia, têm vivido com a narrativa da operação especial, vão perceber que isto é uma guerra e começar a pensar que podem ter de ir combater e morrer (...),levando a jovem geração a reagir contra o regime", defendeu.
"Talvez por isso Putin tenha sido sempre tão relutante em falar de mobilização e agora fala apenas numa mobilização parcial", acrescentou.
Stubb argumentou que as dificuldades da Rússia vão, todavia, manter-se, "especialmente porque se sabe que eles [os russos] não conseguem sustentar ou fornecer material a 150 mil tropas, dos quais segundo as estimativas americanas terão morrido entre 70-90 mil".
"Como poderão fazê-lo para 300 mil?", questionou.
Sobre os meios de comunicação social perante a atual situação, Stubb considerou que a guerra na Ucrânia os está a por à prova: "todos vivemos numa bolha de informação".
"Tal como os media russos são alimentados por uma propaganda de guerra dirigida para uma certa direção (...) o mesmo acontece no Ocidente, onde a informação e propaganda que temos é também numa perspetiva ucraniana, a qual, penso, é todavia mais factual do que a russa", disse.
Citando a expressão de Miguel Poiares Maduro, também presente na conferência, de que "os media são os editores da democracia", Alexander Stubb realçou que, embora o problema do jornalismo é ter de dar os dois lados e fazer o contraditório, questionou: "Que fazer se um dos lados é mais factual em 90% do que os outros 10% - é correto pô-los no mesmo plano?"
Sem resposta explícita à sua própria pergunta, Stubb aproveitou para sublinhar que "a liberdade de expressão acarreta a responsabilidade e, por isso, o papel dos media tradicionais como guardiões da democracia é tão importante".
Tal como acontece com um político em que uma mentira ou uma verdade mal confessada pode levar as pessoas a descrer nos políticos de modo geral, os media são igualmente afetados pela perda da confiança dificilmente recuperável, quando exageram uma história ou a contam afastada da verdade, disse.
"Os media tradicionais devem ver-se como guardiões e verificadores de factos, o que por vezes pode ser desconfortável porque pensam que estão do lado certo da cerca... mas ninguém é perfeito", concluiu o diretor do EUI.