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Bolsonaro em podcasts para agarrar a 'bolha' e Lula na Televisão para a alargar

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Os dois principais candidatos às eleições presidenciais brasileiras têm utilizado formas distintas de falar com os eleitores, para além dos comícios, com Jair Bolsonaro frequentemente em podcasts, enquanto Lula da Silva aposta em entrevistas tradicionais nas televisões.

"Todo o candidato que vai à rede aberta tenta ampliar, todo o candidato que vai a podcasts tenta manter o que já conquistou", simplifica, assim, à Lusa, o professor permanente do programa de pós-graduação em ciência política e do programa de pós-graduação em comunicação da (Universidade Federal do Paraná) UFPR, Emerson Urizzi Cervi.

Analistas políticos ouvidos pela Lusa consideram que a aposta do atual Presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, em participar em podcast tem que ver com a forma como sempre fez política, falando para nichos de eleitores, agarrar o seu eleitorado mais fiel e assim agarrar votos para uma segunda volta eleitoral, mas também para fugir ao contraditório que existem nos debates e nas entrevistas com jornalistas.

Ao contrário, o ex-presidente brasileiro e candidato Lula da Silva, ainda confiante numa vitória à primeira volta (tem cerca de 45% nas sondagens à primeira volta, sem colocar os votos brancos na equação), tem procurado entrevistas televisivas, como a ida à CNN Brasil esta semana, para cativar um "audiência que ainda não conquistou", explica à Lusa Emerson Urizzi Cervi.

Bolsonaro, relembra, disputou oito eleições ao longo da sua carreira política de cerca de 30 ano, sete delas para deputado federal, ou seja, em campanhas políticas em que apenas precisava "de 1%, 2% dos votos para ser eleito deputado".

"Você fala para os seus convertidos", tal como nesta semana, em que Bolsonaro participou num podcast para jovens evangélicos, e é suficiente, analisa Emerson Urizzi Cervi.

Em 2018, recorda, "Bolsonaro fez esse tipo de campanha para uma eleição maioritária e ganhou", através de uma conjuntura favorável, com a prisão de Lula da Silva, a quebra da imagem da política tradicional, o aproveitamento dos casos de corrupção da Operação Lava Jato e pelo facto de os seus candidatos opositores não ter mobilizado as massas.

Agora, como já não é mais um 'simples' candidato e é Presidente, tem de responder pelos atos de Governo, sejam os atos durante a pandemia, ou os resultados da economia, e tem dificuldades resultantes da sua natureza política e "então opta ir para podcasts que são da bolha dele".

Alinhado na posição, Bruno Bolognesi, cientista político, professor na UFPR e coordenador do Laboratório de Partidos e Sistemas Partidários (LAPeS), afirma à Lusa que a característica mais marcante do mandato do presidente brasileiro é que este continua a comportar-se como um "deputado de baixo clero", "radicalizado, pouco expressivo, falando para meia dúzia de pessoas".

Apesar de considerar que a estratégia dos podcasts de Bolsonaro, "de pregar só para os convertidos", ser "uma estratégia datada", Bruno Bolognesi aposta que este estilo é o que vai fazer sobreviver à primeira volta das eleições, a 02 de outubro, e levá-lo a um segundo embate, na segunda volta, com o líder de todas as sondagens, Lula da Silva.

"O papel dele é chegar ao segundo turno", sublinha o coordenador do Laboratório de Partidos e Sistemas Partidários, ou seja, "carimbar o 'ticket' para o segundo turno".

"Imagino que no segundo turno vai ter uma estratégia mais abrangente", considera.

Por outro lado, defende Bruno Bolognesi, Lula tem um traço de personalidade política diferente de Bolsonaro, "é mais político", no sentido literal da palavra, e sempre fez acordos políticos ao longo da sua extensa carreira.

A ida de Lula da Silva a uma entrevista esta semana à CNN Brasil, onde foi confrontado pelo seu programa económico enquanto Presidente, "colocou-o na saia justíssima", considera.

Já o professor Emerson Urizzi Cervi diz que o candidato Lula ao ir a esses programas de entrevistas faz parte de uma estratégia e de uma tentativa de "furar a bolha".

O público desses programas de entrevistas, considera Emerson Urizzi Cervi, são, por norma, "eleitores de alta escolaridade e de renda alta" que o ex-presidente ainda não conquistou.

Analisando ainda outro segmento de campanha, o digital, que em 2018 foi fulcral para a vitória de Jair Bolsonaro nas eleições presidenciais, Emerson Urizzi Cervi fala da importância do deputado federal André Janones ter entrado nas fileiras da campanha de Lula.

André Janones, de 38 anos, "o maior achado" da campanha de Lula para a 'batalha digital', tem oito milhões de seguidores no Facebook, dois milhões no Instagram, e mais de 350 mil no Twitter, é deputado federal pelo estado de Minas Gerais e chegou a ser pre-candidato às eleições presidenciais deste ano, desistindo em agosto e anunciando a sua aliança a Lula.

"André Janones foi o maior achado", sublinha Emerson Urizzi Cervi, acrescentando: "Não pelo conteúdo, mas pela forma. André Janones é o único na campanha do Lula que consegue confrontar a lógica bolsonarista nas redes, no formato da lógica bolsonarista".

"O que 'lulistas' e os próprios 'ciristas' [canditado Ciro Gomes, terceiro nas sondagens] não entenderam é que o bolsonarismo ganha nas redes digitais, não pelo conteúdo, mas pela forma".

A forma da candidatura de Bolsonaro, considera, "é o ataque direto, chamando a audiência para partilhar".

"Quem se aproxima da forma é o Janones, por issso eu acho que é o grande capital agregado na campanha do Lula nessas eleições", conclui.