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A idade da reforma vai descer, mas a que preço?

Para todos os que aguardam pela idade para poderem deixar de trabalhar sem penalizações é uma boa notícia saber que em 2023 (e talvez em 2024) essa idade vai diminuir, permitindo que possam antecipar alguns meses a concretização do seu desejo. Isto significa que em 2023 é previsível que o número de pedidos de reforma aumente e esperemos que o sistema esteja preparado para responder atempadamente a este aumento para não se dar o caso de o ganho ser perdido em tempo de espera acrescido pela decisão de concessão do pedido.

Se a diminuição da idade da reforma é um ganho para muitos, o que a provoca é uma diminuição da esperança de vida aos 65 anos, ou seja, a expetativa anos de vida que o indivíduo espera ainda viver aos 65 anos diminui. Uma das principais causas desta diminuição foi o número de mortes provocadas pelo COVID19 entre a população mais idosa, mas, infelizmente, continuamos a ter um excesso de mortalidade entre esta população mesmo descontando o efeito das mortes COVID. As razões subjacentes a este excesso de mortalidade e as variáveis explicativas cabe aos especialistas estudar e, estou certo, que nos tempos próximos poderemos compreender melhor este fenómeno.

Olhando para os dados do portal PORDATA verificamos que, para os 28 países que existem dados e para as mulheres em 2021, Portugal aparece em 12º lugar com 21,7 anos de esperança de vida aos 65 anos e para os homens aparece em também em 12º lugar com 19,9 anos, valores acima da média da União Europeia (20,9 e 17,8 respetivamente). O país que apresenta o melhor valor para as mulheres é a Espanha com uma esperança de vida aos 65 anos de 23,5 anos e para os homens é a Suíça com uma esperança de vida de 21,7 anos. No entanto, estes anos de vida não vão ser todos passados sem limitações físicas ou mentais e Portugal apresenta valores inferiores à média europeia tanto para as mulheres como para os homens na esperança de vida saudável aos 65 anos.

A esperança de vida saudável aos 65 anos em Portugal (2020) para as mulheres era de 7,7 anos e para os homens era de 8,4 anos, o que significa que a maior parte da vida restante após os 65 anos é passada com alguma limitação física ou mental. No caso das mulheres o número de anos de vida saudável diminuiu entre 1995 e 2020 passando de 9,9 para 7,7 anos, ficando abaixo do valor para os homens em 2021 de 8,4 anos ligeiramente superior ao valor de 1995 que era de 8,1. Só 6 países apresentam um valor inferior para as mulheres do que para os homens, sendo que Portugal é o único que apresenta uma diferença superior a um ano (1,3 anos). Penso que haverá de explicar o que se passa em Portugal, pois tal deve ser uma preocupação para todos nós. Não é justo que um País veja a sua população mais idosa estar a ser dizimada e, aparentemente, não se preocupar em colocar um travão a tal. Não só a população idosa merece ser bem tratada como merece o respeito de todos nós por aquilo que nos deram e do qual todos ainda beneficiamos. Dizem especialistas na área social e da saúde que não é a falta de recursos humanos e técnicos que está na base do problema. Ora, se assim não é, será falta de vontade política? Será a gestão de recursos humanos, técnicos e financeiros que terá de ser revista?

Neste momento Portugal é um país com uma população envelhecida e com muitos anos de vida com limitações físicas ou mentais. A qualidade de vida deste sector da população é uma responsabilidade de todos nós. Perante esta realidade é urgente uma reflexão sobre o tipo de organização social necessária para que a população mais idosa não deixe de se sentir incluída e participante na vida social e que seja financeiramente sustentável. A crise COVID mostrou que a solução dos lares de idosos deve ser repensada. Estou convencido que a só uma política de apoio à família nos permitirá ultrapassar o grande desafio do envelhecimento que temos pela frente. É urgente mudar o paradigma e Portugal devia desejar passar a ser um lugar onde a população idosa seja respeitada, tenha condições de vida dignas, em que as famílias sejam apoiadas para conseguirem dar o apoio material, emocional e afetivo aos seus idosos. O carácter de uma nação deve-se também medir pelas condições que possibilita para a convivência, entreajuda, cuidado e diálogo intergeracional no seio familiar. A idade da reforma vai descer, mas o preço que estamos a pagar por tal está a ser demasiado alto para não ser discutido e pensado por todos.