Talibãs destruíram num ano progresso e direitos construídos em vinte
Um ano bastou para o governo dos talibãs reverter duas décadas de progresso em direitos humanos no Afeganistão, acusou a Amnistia Internacional (AI) num relatório publicado hoje, denunciando "impunidade generalizada" para crimes como tortura e assassinatos por vingança.
"O que se seguiu ao fatídico dia de 15 de agosto de 2021 é uma crise de direitos humanos numa escala sem precedentes", aponta a AI num relatório documentado com entrevistas e fotografias.
"Há um ano, os talibãs assumiram compromissos públicos para proteger e promover os direitos humanos. No entanto, a rapidez com que estão a desmantelar 20 anos de ganhos é espantosa. Quaisquer esperanças de mudança evaporaram-se à medida que procuram governar através de uma repressão violenta com total impunidade", disse Yamini Mishra, diretora da AI para o Sul da Ásia.
O "ataque sustentado" aos direitos humanos inclui perseguir grupos minoritários, reprimir violentamente os protestos pacíficos, retirar os direitos das mulheres e usar execuções e desaparecimentos extrajudiciais para "espalhar o medo entre os afegãos", revela-se no relatório "O regime dos Talibãs: Um Ano de Violência, Impunidade e Falsas Promessas".
Houve centenas de assassinatos extrajudiciais, com corpos encontrados com ferimentos de bala ou sinais de tortura, e dezenas de pessoas desapareceram por causa do seu trabalho sob o governo anterior ou por suspeitas de resistência contra os talibãs.
Torab Kakar, de 34 anos, disse à Amnistia Internacional que, apesar de ter uma "carta de perdão" dos talibãs, o seu amigo Jalal, que tinha servido nas Forças de Segurança da Defesa Nacional afegã (ANDSF), foi levado para um local não revelado pelos fundamentalistas islâmicos.
As mulheres sofrem restrições crescentes, deixaram de poder circular livremente, perderam o direito à educação e dezenas foram detidas e torturadas por realizarem protestos pacíficos exigindo os seus direitos.
A investigação da AI aponta o uso de força excessiva em várias grandes cidades pelas forças de segurança para dispersarem protestos pacíficos, batendo e disparando sobre manifestantes desarmados.
Um manifestante da província de Herat relatou os ferimentos infligidos pelas forças de segurança: "Vi um homem deitado numa poça de sangue numa vala na rua. Creio que tinha sido morto... A minha mão estava fraturada, mas não fui ao hospital, temendo que pudesse ser preso por participar nos protestos."
A atividade da imprensa está fortemente limitada no Afeganistão desde que os talibãs reassumiram o poder e no último ano, mais de 80 jornalistas foram presos e torturados por relatarem protestos pacíficos.
Na perseguição às minorias étnicas e religiosas, a organização de defesa dos direitos humanos refere relatos de despejos de não- pachtuns em todo o país, sobretudo de hazaras, turquemenos e uzbeques, para os talibãs recompensarem os seus seguidores com terras que lhes são retiradas.
"Para evitar que a crise dos direitos humanos no Afeganistão cresça ainda mais, a comunidade internacional deve tomar medidas significativas para responsabilizar os talibãs por estes crimes", pede Yamini.
A Amnistia Internacional apela aos talibãs para que parem imediatamente de cometer violações e crimes graves em matéria de direitos humanos e para, como autoridades de facto do Afeganistão, restaurarem e promover os direitos do povo afegão.