Crónicas

O Norte

1Disco: “Home, before and after”, de Regina Spektor, é o resultado do trabalho de alguém que nunca falha. Temas que todos vivemos. Parecem conversas banais, sussurradas ao ouvido. As palavras valem metade do todo sendo tratadas com cuidado. E a música alterna entre o mais melódico e uma espécie de art-punk que se funde com outras sonoridades.

2. Livro: fiz as pazes com Fukuyama. Andei uns anos “chateado” com ele, mas este “Liberalismo e seus descontentes”, aproximou-nos de novo. Não é, de todo o seu melhor, mas funciona muito bem como um manual para quem quer saber o que é e como funciona o liberalismo. As suas vantagens, o seu alcance, os seus defeitos. As diferentes correntes que constituem o liberalismo e o modo como se articulam umas com as outras. Um livro curto e muito fácil de ler que aconselho vivamente a quem quiser saber o que são as ideias liberais.

3. O PSD, por intermédio do seu grupo parlamentar, congratulou-se por o Governo Regional, suportado pelo PSD e pelo CDS, ter baixado o IRC nos concelhos do Norte da Madeira e no Porto Santo. As empresas lá sediadas agradecem. E a medida não terá mais nenhuma utilidade, além disso. Particularmente, não tenho nada contra a baixa de impostos. Bem pelo contrário. Mas esta medida é avulsa e não resolverá absolutamente nada, daqueles que são os principais problemas do nosso fantástico Norte. O Porto Santo é outra realidade, por isso, vou deixá-lo de fora. Por agora.

Tenho um enorme amor pelo Norte da Madeira. Felizmente, e ao longo deste martírio socialista laranja, foram-se esquecendo de estraçalhar a sua beleza. O encanto bucólico de São Jorge, a rudeza da montanha a espremer a vila de São Vicente, as maravilhosas piscinas naturais do Porto Moniz, aquela praia do Seixal única no mundo, a inebriante vista do Miradouro de São Cristóvão, a Rocha do Navio. O descobrir recantos e pormenores, sempre que lá vamos, que nos remetem para o Fauno das Montanhas, esse filme maior de Manuel Luís Vieira, marco indelével da história do cinema português.

O nosso Norte, sim o NOSSO NORTE, tem que ser apresentado como um lugar privilegiado que funde natureza e tecnologia. Um local onde a vida moderna se combina com a vida rural, proporcionando uma maior harmonia entre a actividade profissional e a privada.

O mais importante não é que as pessoas vão até ao Norte. O importante é criar condições para que lá se instalem, para se fixarem. Sem habitantes não há economia, não há empresas, não há desenvolvimento.

É urgente a criação de uma Agência Desenvolvimento do Norte que reúna peritos de diferentes áreas, que desenvolvam programas para atrair pessoas; estruturem ofertas; monitorizem actividades; formem agentes territoriais que constituam células de acolhimento encarregadas de informar, orientar e acompanhar projectos de recém-chegados; lance um concurso de ideias para surgirem novas maneiras de tornear a desertificação do Norte da Ilha da Madeira.

A implementação de um regime especial de IRS, como fonte de atractividade, para que o Norte ganhe uma nova vida com os cidadãos que ali decidam viver.

Melhorar significativamente a prestação de serviços e cuidados médicos, é um factor de enorme importância para que alguém decida viver naquela parte da Madeira.

Descentralização de serviços de modo que, com rapidez, se possa aceder a documentos e licenças que sejam necessárias. Loja do cidadão móvel e atribuição de competências às autarquias, serão algumas das hipóteses a ter em conta.

É imprescindível avançar o mais rapidamente possível para a cobertura total de todo o Norte com banda larga gratuita. Criar um sítio na Internet onde se possam anunciar e reunir oportunidades de negócio.

Descentralização da programação cultural regional, por delegação organizacional às associações culturais do Norte, e apoio efectivo aos eventos culturais dinamizadores da economia local. Realizar uma inventariação e classificação exaustiva do património material e imaterial.

Regime de tratamento preferencial (em termos regulamentares e fiscais) para investimentos destinados à recuperação de imóveis devolutos, tendo em vista o seu arrendamento.

Criar Centros de Acolhimento de Empresas onde estas se instalem durante algum tempo sem despesas (renda, net, apoio jurídico, comercial e técnico), pelo menos, um ano. Isenção fiscal durante os primeiros 3 anos de actividade, podendo estes serem extensíveis até 5 anos, mediante apresentação de um plano que justifique este apoio. No final os impostos sobem gradualmente até ao valor que é comum ser pago.

Com o tempo, verificar do interesse da criação de uma Secretaria Regional do Norte tendo em vista a reintegração e adaptação de serviços, equipamentos e infraestruturas.

Seria muito mais interessante ouvir da boca dos responsáveis políticos e governamentais, propostas como as que vão acima, do que coisas avulsas que não acrescentam nada como fonte de sedução, tanto de novos residentes, como de empresas.

E por aqui me fico, havendo muito mais o que dizer. A vida ensinou-me que não se deve entregar o ouro todo ao bandido.

Quanto ao resto, é o que temos.

4. Tenho esta irresistibilidade de ter a mania que sei fazer análise política. Entro pelas canas dentro muito mais vezes do que consigo concluir com assertividade. É-me irresistível escapar ao assunto que marcou a semana passada. Depois de, num momento inicial, ter pensado que Pedro Nuno Santos ensandecera, com o passar do tempo comecei a ver um racional que me leva a concluir que tudo isto foi pensado. Que tudo foi muito bem maturado.

Que melhor momento para esticar a corda do que este, quando o PS governa com maioria absoluta. Os riscos não eram grandes e as consequências nunca seriam dramáticas.

Escolher a altura em que Costa não se encontrava no país, e sabedor de que nunca prestaria declarações sobre política interna no estrangeiro, é muito para ser um acaso. O despacho assinado pelo Secretário de Estado e não pelo Ministro, figuras gradas do PS a se chegarem à frente e a apoiar PNS e a decisão dos novos aeroportos, o acto de contrição e arrependimento sem nunca ter pedido desculpas a ninguém. É muito para não ter sido tudo muito bem pensado.

Costa tem delfins e Pedro Nuno Santos não é um deles. A partir da semana passada, o que já se sabia, fica evidente: o Ministro das Infraestruturas posiciona-se como o primeiro candidato à sucessão de Costa. Sobre a desdita, pode sempre dizer que a aceitou em nome da unidade do Governo e do partido.

PNS tentou uma golpada, que se fosse em frente, deixava-lhe o caminho aberto e matava o delfinário de Costa. O momento era agora, pois daqui a 4 anos, quando a questão da sucessão for efectiva, já ninguém se lembra do agora acontecido. Se dúvidas houvesse, está encontrado o sucessor.

Em relação ao aeroporto, a solução apresentada é a que o PS levará a Montenegro, que, do alto da sua empáfia, dirá que não presta, ajudando a manter o assunto na ordem do dia por mais uns tempos, mas com outros protagonistas. Daqui a um mês já ninguém se lembra da traquinice de PSN.

5. “Como comprovado à exaustão, não é fácil ser Homo Sapiens Sapiens. Seus desejos, muitas vezes, entram em conflito com a sua inteligência” – Ian McEwan