Bispo apela a “economia inspirada pela justiça e pela solidariedade” no Dia da Região
“Não podemos afirmar que vivemos numa Região verdadeiramente desenvolvida apenas porque nela existem alguns que detêm uma riqueza abundante”, lembra D. Nuno Brás
A homilia da missa 'Te Deum', que celebra o feriado civil da Região e Comunidades Madeirenses, na Sé Catedral do Funchal, fica marcada por um apelo de D. Nuno Brás, que pediu a uma “economia inspirada pela justiça e pela solidariedade”, na cerimónia eucarística com a presença das mais altas individualidades civis e militares da Região.
A palavra de Deus constitui sempre uma oportunidade para examinarmos a nossa existência, deixando que as nossas sombras sejam iluminadas e vencidas pela sua luz. Por isso, cada um de nós não deixará de se confrontar com ela. Mas que poderá esta palavra dizer à nossa Região, neste dia em que celebra a sua existência e a sua identidade?
O Bispo do Funchal socorreu-se das palavras do profeta Amós, na I Leitura – lembrando que “a palavra de Deus é sempre pronunciada num contexto histórico concreto” mas “atravessa a história”- como “aviso” de que “nem tudo é lícito para criar riqueza”.
O trecho de Amós, diz-nos, em primeiro lugar, que nem tudo é lícito para criar riqueza. A riqueza não é (não pode ser) uma finalidade em si mesma — e, para a obter, não vale tudo. A riqueza, a acumulação de bens materiais, tem um objectivo: ajudar todos a crescer em humanidade.
É neste sentido, explica D. Nuno Brás, que a Doutrina Social da Igreja não hesita em afirmar: “O desenvolvimento não pode ser reduzido a um mero processo de acumulação de bens e serviços” e que, ao mesmo tempo, a moralidade da vida económica “constitui um factor de eficiência social da própria economia”.
“Ou seja: uma economia inspirada pela justiça e pela solidariedade é essencial para que uma sociedade se possa dizer justa e desenvolvida, coesa, eficiente, capaz de caminhar em segurança para patamares sempre mais elevados de humanidade”, sublinha.
No sentido inverso, “o egoísmo e a injustiça poderão dar origem a altos resultados económicos, mas a sociedade que daí deriva permanecerá minada nas suas bases — e, por isso, tais resultados serão sempre frágeis e incapazes de construir uma sociedade coesa e segura”.
“Dito ainda de outro modo: não podemos afirmar que vivemos numa Região verdadeiramente desenvolvida apenas porque nela existem alguns que detêm uma riqueza abundante. Teremos uma Região verdadeiramente desenvolvida, uma sociedade coesa, quando todos tiverem a oportunidade de aceder ao necessário para viver dignamente como seres humanos. Uma sociedade não é desenvolvida quando tem ricos; uma sociedade é desenvolvida quando não tem pobres. Ou seja: quando a riqueza de uns não é construída à custa da pobreza de outros, antes se encontra ao serviço do bem comum”, reforçou.
Na sua homilia, o bispo fez ainda uma alusão à Guerra na Ucrânia, cintando o filósofo russo Aleksandr Solzhenitsyn ao receber o Prémio Templeton, para dizer que “os homens esqueceram-se de Deus” e “é por isso que tudo isso aconteceu”.
Voltando à realidade regional, D. Nuno Brás reconheceu que “de há vários anos a esta parte, a nossa Região tem claramente realizado um caminho de desenvolvimento” e que “as condições materiais de vida do nosso povo são decisivamente melhores”. Insta, porém, os fiéis a “interrogar acerca da qualidade desse desenvolvimento e da coesão social efectiva que ele faz ou não gerar”.
“E que nos deixemos igualmente interrogar acerca do espaço que damos a Deus — não apenas na vida de cada um mas também na nossa existência como sociedade. Não nos basta ter a Cruz de Cristo na bandeira. Que cada madeirense seja sempre — para si e para os outros — um sinal, uma presença que a todos recorda a importância e o lugar de Deus, a sua centralidade na vida de cada ser humano e de toda a sociedade”, concluiu.