A Guerra Mundo

Kiev condena 'julgamento-espetáculo' de combatentes estrangeiros

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FOTO EPA/MARIA SENOVILLA

Um porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros ucraniano disse hoje que as condenações à morte, por um alegado tribunal separatista pró-russo, de dois cidadãos britânicos e um marroquino devem "ser consideradas nulas e sem efeito".

"O chamado 'julgamento' dos combatentes das Forças Armadas da Ucrânia nos territórios ucranianos não tem importância", afirmou Oleh Nikolenko à agência de notícias Interfax Ucrânia.

"Estes 'julgamentos-espetáculo' colocam os interesses da propaganda acima da lei e da moral; minam os mecanismos de regresso dos prisioneiros de guerra. O Governo ucraniano vai continuar a fazer todos esforços para libertar todos os defensores da Ucrânia", salientou.

Oleh Nikolenko enfatizou que todos os cidadãos estrangeiros que lutam como parte das forças armadas da Ucrânia devem ser considerados militares ucranianos e protegidos como prisioneiros de guerra.

Dois cidadãos britânicos e um marroquino foram condenados à morte, hoje, por separatistas pró-Moscovo no leste da Ucrânia, acusados de lutarem ao lado das forças de Kiev, com o Governo do Reino Unido a mostrar "preocupação".

Um tribunal da autoproclamada República Popular de Donetsk considerou os três homens culpados de estarem a preparar um violento golpe para recuperar o poder na região, um crime punível com a morte.

Os três homens também foram condenados por atividades mercenárias e terrorismo.

A agência de notícias estatal russa RIA Novosti informou que Aiden Aslin, Shaun Pinner e Saaudun Brahim devem enfrentar um pelotão de fuzilamento, tendo um mês para recorrer desta sentença de morte.

Os separatistas alegaram que os três combatentes são "mercenários", pelo que não têm direito às proteções usuais oferecidas aos prisioneiros de guerra.

Em resposta, as famílias de Aslin e Pinner disseram que os homens, que vivem na Ucrânia desde 2018, são membros de regulares das Forças Armadas ucranianas.

Os três combatentes lutaram ao lado das tropas ucranianas, e Pinner e Aslin renderam-se às forças pró-russas no porto de Mariupol, em meados de abril, enquanto Brahim se rendeu em meados de março, na cidade de Volnovakha.

Os militares russos argumentam que os mercenários estrangeiros que lutam ao lado da Ucrânia não são soldados e devem sofrer longas penas de prisão, se capturados.

Um porta-voz do primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, já reagiu, mostrando preocupação com este caso envolvendo dois concidadãos.

"Estamos naturalmente muito preocupados. Repetimos que prisioneiros de guerra não devem ser aproveitados para causas políticas" disse o porta-voz, lembrando que "nos termos da Convenção de Genebra, os prisioneiros de guerra não devem ser julgados pela sua participação nas hostilidades".

"Continuaremos a trabalhar com as autoridades ucranianas para garantir a libertação de qualquer cidadão britânico que esteja a servir as Forças Armadas ucranianas", acrescentou o porta-voz.

Por sua vez, a chefe da diplomacia britânica, Liz Truss, denunciou este processo como sendo "um simulacro de julgamento, sem qualquer legitimidade".

Um outro combatente britânico capturado pelas forças pró-Rússia, Andrew Hill, aguarda julgamento.

A Rússia lançou na madrugada de 24 de fevereiro uma ofensiva militar na Ucrânia que causou já a fuga de mais de 15 milhões de pessoas de suas casas -- mais de oito milhões de deslocados internos e mais de 7,2 milhões para os países vizinhos -, de acordo com os mais recentes dados da ONU, que classifica esta crise de refugiados como a pior na Europa desde a Segunda Guerra Mundial (1939-1945).

Também segundo as Nações Unidas, cerca de 15 milhões de pessoas necessitam de assistência humanitária na Ucrânia.

A invasão russa -- justificada pelo Presidente russo, Vladimir Putin, com a necessidade de "desnazificar" e desmilitarizar a Ucrânia para segurança da Rússia - foi condenada pela generalidade da comunidade internacional, que respondeu com o envio de armamento para a Ucrânia e a imposição à Rússia de sanções que atingem praticamente todos os setores, da banca ao desporto.

A ONU confirmou que 4.302 civis morreram e 5.217 ficaram feridos na guerra, que hoje entrou no seu 106.º dia, sublinhando que os números reais poderão ser muito superiores e só serão conhecidos quando houver acesso a zonas cercadas ou sob intensos combates.