O legado de Donald Trump para as mulheres americanas
Durante o seu mandato, o agora ex-presidente americano, nomeou para a mais alta instituição judicial americana, o Supremo Tribunal, três novos juízes. Estes, tidos como juízes ultraconservadores, alteraram a aritmética da instituição. Antes, um equilíbrio entre conservadores e liberais, 4/4 com um moderado a presidir, passou agora a 6/3 e é dominado por aqueles que defendem teses tradicionalistas, numa rígida ortodoxia conservadora.
Não é de estranhar que uma das primeiras decisões do novo elenco deste tribunal tenha sido proibir os Estados Americanos, no caso New York, de ter Leis que controlem e moderem o uso e porte de armas. A partir de agora, por decisão do Supremo, os nova-iorquinos podem transportar armas de fogo de diferentes calibres, nos locais públicos, quase sem limitações.
Na passada sexta-feira foi conhecida outra decisão: as americanas perderam o direito constitucional a abortar, passando o mesmo para uma decisão de cada Estado e cada Governador. Na verdade, retira esse direito da Constituição, mudando a norma “Roe c. Wade” que vigorava há cinco décadas.
Assim, uma americana vivendo na Califórnia, onde a Lei do seu parlamento autoriza livremente o aborto, continuará a poder fazê-lo. No Texas, por exemplo, já não. E em mais de metade dos estados americanos, também não.
Também inaudita, é a intenção de criminalizar as mulheres que façam o aborto em outro estado que não aquele em que vivem. Num caso até, se a conceção puder ser provada ter acontecido num certo estado, por exemplo durante a “Lua de Mel”, a criminalização acompanhará a americana durante a gravidez, viva ela em qualquer outro estado americano ou no estrangeiro...
Para complicar as coisas, os países vizinhos dos Estados Unidos, ou seja, o Canadá e o México, optaram por permitir o aborto com muito poucas restrições. No caso do Canadá, o seu governo até autoriza o acesso ao aborto a mulheres americanas no seu sistema público de saúde.
É algo estranho para os europeus, que tal fique ao arbítrio da Lei estadual, permitindo que algumas regiões do país o aceitem e que outras o proíbam em quaisquer circunstâncias. Mesmo quando haja violação comprovada, incesto, perigo para vida da mãe ou a existência de deformidades fetais.
Com exceção da Polónia, toda a Europa optou por uma posição de compromisso. O aborto é legal, mas com regras limitativas. Geralmente, só é permitido nos casos de violação, incesto, perigo para vida da mãe, existência de deformidades fetais e também por decisão pessoal da mulher, nas primeiras 12 semanas de gravidez.
Duas coisas parecem certas: este é um assunto onde, provavelmente, quase ninguém convence quem pensa diferente. Segundo, a “desunião” americana salta aos olhos do mundo. Duas visões de sociedade tão distintas, quase opostas na mesma nação.
Muitos receiam que após a liberalização constitucional do porte livre de armas na América e da proibição do aborto, a agenda conservadora continue para a restrição da contraceção, a nulidade do casamento do mesmo sexo e a limitação de algumas liberdades de expressão na América.
Uma coisa é certa, é o legado de Donald Trump.