O bom, o mau e a cópia
Portugal sofre de uma febre legislativa, inversamente proporcional à capacidade de executar o que se legisla. Veja-se o circo montado em torno do combate à corrupção. Primeiro, constituiu-se um grupo de trabalho para estudar o fenómeno. Depois, aprovou-se a Estratégia Nacional de Combate à Corrupção. De seguida, criou-se o Mecanismo Nacional Anticorrupção, uma entidade independente para fiscalizar as regras de prevenção da corrupção. Conclusão? Seis meses depois, a entidade não tem sede, órgãos diretivos, nem sequer funcionários. Temos prioridades, estratégia e mecanismo contra a corrupção, mas não há quem a fiscalize.
O bom: Campeonato do Mundo de Natação Adaptada
Ana Castro começou a nadar aos 11 anos. Aos 24 nadará, no Campeonato do Mundo, por Portugal. Juntamente com a Ana estarão, nas Piscinas Olímpicas do Funchal, mais de 600 atletas de 70 países. Alguns com limitações físicas, outros com deficiência intelectual, mas nenhum deles refém da limitação com que nasceu. Não é esse destino que os define. Muito pelo contrário. Em cada um dos nadadores, conta-se uma história de superação e de persistência. Mais um capítulo dessas histórias será escrito, de 8 a 19 de junho, no Funchal, naquele que, depois dos Jogos Paralímpicos, é o maior evento internacional de desporto adaptado. Depois da organização dos Europeus da mesma modalidade, em 2016 e 2020, o regresso da natação adaptada ao Funchal é o reconhecimento da qualidade da organização da nossa Associação de Natação, em parceria com a Federação, mas também a prova de que a Madeira está talhada para a organização de grandes eventos desportivos. O MIUT, organizado pelo Clube de Montanha do Funchal, que todos os anos preenche as serras com milhares de atletas. O MIUS, outro evento com o selo de qualidade da Associação de Natação, que colocou a Região no mapa da natação em águas abertas. O Transmadeira, montado pela Freeride e Caniço Riders, que leva ciclistas de todo o mundo numa travessia da Madeira em 5 dias. Os exemplos ultrapassam os limites da crónica. Não só recebemos bem, como provámos que numa ínfima ilha, isolada no Atlântico, mais próxima de África do que da Europa, se organizam eventos desportivos que rivalizam com os melhores do mundo.
O mau: A urgência da eutanásia
Contra tudo e todos, a Assembleia da República voltou a fazer da morte uma instituição legalizada. Contra a Ordem dos Médicos, que avisou que não indicará médicos para integrar a comissão para a validação da eutanásia, uma vez que essa prática afronta, diretamente, contra a profissão e a sua deontologia. Contra a Ordem dos Advogados, que alertou para o perigo de deixarmos de olhar para a vida como um direito irrenunciável e, por isso, indisponível. Contra o Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, contra a Ordem dos Enfermeiros. Não há um único parecer científico ou ético favorável à solução legislativa. Há a exigência de um debate mais alargado, alertas para a dificuldade de aplicação prática da lei e, acima de tudo, surpresa pela urgência na aprovação parlamentar. A eutanásia, (mais um) avanço civilizacional, suposta prova de modernidade nacional, assenta no pressuposto preocupante de que, em última análise, a solução para a doença é a morte. Essa mudança estrutural na sociedade portuguesa – a vida trocada pela suposta liberdade – deveria exigir uma reflexão nacional profunda e nunca um sprint parlamentar. Deveria colocar-nos mais dúvidas do que certezas. Se, por um lado, o direito à vida não é um dever de viver em qualquer circunstância, como refletiu o Tribunal Constitucional, não será menos verdade que o Estado, ao não garantir cuidados paliativos a todos, apenas oferece a morte como alternativa ao sofrimento, ainda que disfarçada de respeito pela autonomia individual. O problema da eutanásia é o mesmo de bater no fundo. Quanto mais se bate mais ele desce.
A cópia: Filipe Sousa
Antes da cópia, o original. O Porto, pela mão de Rui Moreira, abandonou a Associação Nacional de Municípios. A opção prendeu-se com a transferência de competências do Governo para os municípios sem o envelope financeiro necessário. Como foi a Associação que negociou o orçamento que acompanharia as novas competências municipais, Moreira tinha dois caminhos: pactuava com o acordo ou procurava solução fora da Associação. Optou pela segunda via. Vamos, então, à cópia. A 1000 km de distância do Porto, Filipe Sousa também ameaçou retirar Santa Cruz da Associação de Municípios da Madeira. A distância entre as duas cidades é a mesma que separa as razões de Moreira das justificações de Filipe Sousa. Rui Moreira foi a face mais visível de um processo desastroso de descentralização, dizimado por críticas de Norte a Sul do País. Por cá, Sousa reduziu a associação regional a capricho partidário e apontou à saída por não se sentir motivado a participar. Justiça lhe seja feita, não é a primeira vez que ameaça bater com a porta da Associação. Já em 2021, o edil confessava-se triste e frustrado pela inércia associativa. Também então, pouco se sabia sobre o pecado capital que estaria a ser cometido contra Santa Cruz e que justificaria o alvitrado abandono. Hoje, como então, Filipe Sousa ficou a falar sozinho. Nem um presidente de câmara o acompanhou na indignação, muito menos na saída. A única semelhança entre original e cópia, é que ambos são presidentes de câmara. A grande diferença é que Filipe Sousa esqueceu-se que quem faz parte da associação é Santa Cruz, não o seu presidente.