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A Droga, vista à lupa por um Polícia

A crónica que hoje aqui partilho é certamente diferente de todas as outras. Não se refere a qualquer assunto de natureza reivindicativa ou de carácter sindical.

Na verdade, depois de vários anos que tenho o privilégio de colaborar com o Diário de Notícias da Madeira, escrevo pela primeira vez sobre o mundo da droga. Decidi fazê-lo por uma questão que há muito tempo, me inquieta, sobretudo preocupa os tribunais, as forças de segurança, as autoridades de saúde, os psicólogos, os psiquiatras, e, muito particularmente a sociedade civil.

Quem me conhece sabe que nos meus primeiros anos como profissional da PSP, desenvolvi funções nas antigas brigadas à civil, onde adquiri alguma experiência na área da toxicodependência.

Numa abordagem pessoal, mas procurando ser colaborativo, todas as pessoas têm uma ideia sobre drogas, as suas origens, efeitos ou consequências, desde o cidadão comum que nunca as consumiu até aqueles que vivem diariamente em função delas. A droga circula, portanto, na cabeça e nas vozes de muita gente mesmo em quem mantém fisicamente com elas um contacto quotidiano mínimo ou até mesmo inexistente.

É inegável, que a droga tornou-se um caso de emergência pública, uma epidemia diante do consumo indevido das novas substâncias psicoativas, que veio substituir as chamadas drogas tradicionais, chegando em força à Madeira, à dez anos a esta parte, nomeadamente: o ecstasy, o bloom ou miau miau, o gorbymix, a flakka, entre muitas outras, algumas tão desconhecidas que ainda não constam da tabela de substâncias proibidas, pelo que o seu consumo e venda constitui apenas contraordenação, criando sobretudo problemas para as polícias, para os organismos de saúde e para a sociedade, em geral.

Logo, é fácil de perceber, que estas drogas sintéticas sendo mais baratas, conquistaram quer consumidores tradicionais, quer jovens com propensão para as dependências, muitas vezes vendida utilizando as facilidades do mercado dark-web para promover o consumo por meio das vendas online, custando cerca de 15 vezes menos do que a cocaína.

Mas, a verdade verdadinha, antropologicamente falando, é natural do ser humano consumir drogas. O problema é quando as drogas passam a ser a base da sociedade, como está acontecendo atualmente. Drogas para dormir, drogas para acordar, drogas para se divertir, curar e matar.

Infelizmente a maioria das pessoas usa o termo “droga” apenas quando se refere às ilícitas (cocaína, heroína, liamba e o haxixe, crack, entre muitas), excluindo dessa classificação as bebidas alcoólicas, cigarros, cafeína, anabolizantes, anfetaminas, antidepressivos, entre outros, que são as drogas socialmente aceites, mas tão letais quanto as proibidas por lei.

A hipocrisia social é o começo de toda essa violência que a dependência das substâncias tóxicas provoca. Violência física, emocional, mental, social. Parece-me que a situação piora quando existe uma relação entre a violência doméstica e o consumo de substâncias psicoativas. É do conhecimento que ambas as realidades se influenciam e se potenciam. Tudo está interligado, não existe separação porque uma coisa leva a outra.

Como vê, caro leitor, a escalada das drogas é um fato assustador. Enfrentá-la só é possível com informação correta, prevenção e recuperação. Só assim, podemos captar eventuais mudanças comportamentais e dar uma orientação segura aos nossos filhos. Exige carinho, diálogo, firmeza, e impõe a presença do pai e da mãe. Ela é, de facto, o pré-requisito da prevenção.

O que as pessoas precisam compreender é que “droga” é apenas uma “coisa”, uma substância “inconsciente”, sem vida. Para que a substância tenha efeito, é preciso que alguém a consuma. Dessa forma, o problema não é a droga, são as pessoas.

Agora, como profissional da PSP, espero que o Estado faça a sua parte, na adoção de medidas legislativas para criminalizar a sua venda e punir os traficantes. O que não se pode admitir é que os nossos jovens estejam a consumir misturas de pesticidas, inseticidas, diluentes e venenos de ratos, tenham surtos psicóticos e deambulem aos ziguezagues pelas ruas, nus e aos gritos.