Guiné Equatorial é o país lusófono com menos liberdade de imprensa
Guiné Equatorial, Moçambique e Brasil são os países lusófonos com menos liberdade de imprensa, revela o índice anual da organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF), hoje publicado.
Na 20.ª edição do 'ranking' mundial da liberdade de imprensa, publicado hoje por ocasião do Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, a organização não-governamental (ONG) internacional, sediada em Paris, avalia a prática do jornalismo em 180 países.
A classificação dos 180 países - de entre 0 e 100, sendo 100 a melhor pontuação possível - baseia-se numa quantificação dos abusos contra jornalistas e numa análise qualitativa feita por especialistas em liberdade de imprensa em cada país.
A situação dos jornalistas é "muito grave" em 28 países, incluindo Rússia e Bielorrússia; "difícil" em 42 países, como Guiné Equatorial e Moçambique; e "problemática" em 62 países, incluindo Brasil, Angola e Guiné-Bissau.
A comparação com os países numa situação bastante boa (40 países, incluindo Timor-Leste e Cabo Verde) ou muito boa (oito países, incluindo Portugal) mostra o desequilíbrio a nível global.
Entre os países de língua portuguesa, Portugal destaca-se no 7.º lugar dos países com mais liberdade de imprensa e os restantes situam-se entre o 17.º (Timor-Leste) e o 141.º (Guiné Equatorial).
"Na Guiné Equatorial, um país liderado pelo mesmo homem há mais de quatro décadas, os 'media' estão amordaçados e a censura prévia é a norma", escrevem os autores do relatório da RSF.
Os especialistas dizem que "não há um pluralismo real nos média", já que a principal fonte de notícias da população é a rádio e televisão publica RTVGE, controlada pelo Governo e a única televisão privada no país pertence ao filho do Presidente e atual vice-presidente, Teodoro Obiang Ngema ('Teodorin').
A legislação da comunicação social é uma das mais rígidas de África, com processos judiciais frequentes contra jornalistas, o que provoca uma autocensura permanente; os jornalistas são ameaçados, intimidados e sujeitos e detenções arbitrárias; atos de violência contra jornalista ficam completamente impunes, alerta-se no relatório.
Apesar disso, os autores do índice admitem que nos últimos anos se tem verificado um "desenvolvimento encorajador -- a emergência de meios de comunicação online que fornecem uma cobertura noticiosa que escapa parcialmente ao controlo do Governo".
No índice da liberdade de imprensa, a Guiné Equatorial subiu do 164.º lugar em 2021 para o 141.º este ano, embora tenha perdido pontos, de 44,33 para 43,96.
Também Moçambique perdeu pontos na avaliação deste ano, de 64,61 em 2021 para 49,89 agora, tendo inclusive caído da 108.ª posição para a 116.ª num ano, uma tendência que se arrasta desde 2011/2012, quando o país chegou a estar na 66.ª posição.
A reeleição de Filipe Nyusi como Presidente e o frágil acordo de paz com o braço armado do principal partido da oposição "não abrandaram o preocupante declínio da liberdade de imprensa em Moçambique", diz o relatório da RSF.
A organização diz que o país tem um grande número de órgãos de comunicação social direta ou indiretamente controlados pelas autoridades ou por membros do partido no poder, o que mina a sua independência.
Apesar de a lei proteger a liberdade de imprensa e a independência jornalística, a legislação é raramente aplicada, "num ambiente marcado por um crescente autoritarismo e cada vez mais dificuldades de acesso à informação", diz o relatório, alertando ainda para um discurso hostil e ataques verbais contra os jornalistas.
O Brasil, que caiu do 111.º para o 110.º lugar no último ano, tem registado uma forte deterioração da relação entre a imprensa e o Governo desde a posse do Presidente, Jair Bolsonaro, que "ataca regularmente os jornalistas e os media nos seus discursos", conclui a RSF.
"Violência estrutural contra jornalistas, uma paisagem mediática marcada por uma alta concentração de propriedade privada e os efeitos da desinformação são grandes desafios ao progresso da liberdade de imprensa" no Brasil, escrevem os autores.
No relatório recorda-se ainda que, na década que terminou em 2020, pelo menos 30 jornalistas foram mortos no Brasil, o segundo país da região com mais profissionais dos média mortos naquele período.
Apesar de ter perdido quase nove pontos percentuais na sua classificação, Angola subiu no índice de liberdade de imprensa, da 103.ª para a 99.ª posição no último ano.
Os especialistas da RSF lamentam que a posse em 2017 do Presidente, João Lourenço, ao fim de quatro décadas de liderança de José Eduardo dos Santos não tenha representado um ponto de viragem na liberdade de imprensa em Angola.
"A censura e o controlo da informação ainda pesam fortemente nos jornalistas angolanos", alertam.
Na Guiné-Bissau, que subiu do 95.º para o 92.º lugar do índice, a RSF regista um ambiente difícil para o jornalismo, com uma "marcada deterioração da segurança para jornalistas, a par de pressões políticas e económicas".
"Os jornalistas têm de lidar com uma instabilidade política crónica, como se viu novamente com a tentativa de golpe de fevereiro de 2022. A pressão é constante", escrevem os analistas da RSF.
No relatório alerta-se ainda que os jornalistas e os 'media' são regularmente alvo de ataques físicos, como os ataques armados à rádio Capital FM e à casa de um dos seus jornalistas em fevereiro deste ano.