Câmara baixa dos EUA responde a massacre racista com lei que combate terrorismo doméstico
A Câmara dos Representantes dos Estados Unidos aprovou esta quarta-feira uma lei que pode permitir a aplicação de mais recursos federais na prevenção do terrorismo doméstico, na sequência do massacre racista que fez dez mortos no sábado em Buffalo.
Este tipo de iniciativas legislativas não é novo, pois a câmara baixa aprovou uma medida semelhante, em 2020, que esbarrou no Senado norte-americano.
Sem apoio no Senado para avançar com uma legislação de controlo de armas, que dizem ser necessária para impedir tiroteios em massa, os democratas estão a pressionar para que haja um foco federal mais amplo contra o terrorismo doméstico.
"Nós, no Congresso, não podemos impedir pessoas como Tucker Carlson [apresentador da Fox News] de vomitar ideologia odiosa e perigosa da teoria da substituição nas rádios. O Congresso não conseguiu proibir a venda de armas de assalto. A Lei de Prevenção ao Terrorismo Doméstico é o que o Congresso pode fazer esta semana para tentar evitar futuros tiroteios em Buffalo", salientou o congressista democrata Brad Schneider.
A lei procura evitar outro massacre como o que ocorreu em Buffalo, Nova Iorque, onde um jovem adepto de teorias da conspiração como a da "grande substituição" entrou num supermercado e abriu fogo indiscriminadamente, matando dez pessoas e ferindo outras três.
Segundo os democratas, o projeto de lei irá preencher lacunas na partilha de inteligência entre o Departamento de Justiça, o Departamento de Segurança Interna e o FBI, para que possam rastrear e responder melhor à crescente ameaça do terrorismo extremista branco.
Segundo a legislação atual, as três agências federais já trabalham para investigar, prevenir e processar atos de terrorismo doméstico.
Mas este projeto exigiria que cada agência abrisse gabinetes especificamente dedicados e estas tarefas e criasse uma 'task force' interagências para combater a infiltração da supremacia branca nas Forças Armadas.
O gabinete de orçamento do Congresso estima que a aplicação deste projeto de lei custaria cerca de 105 milhões de dólares (cerca de 100 milhões de euros) ao longo de cinco anos, com a maior parte do dinheiro a ser aplicado na contratação de pessoal.
Os democratas no Senado norte-americano comprometeram-se a apresentar o projeto para votação na próxima semana, mas as perspetivas são incertas, com os republicanos a oporem-se a um reforço do poder do Departamento de Justiça na vigilância doméstica.
Os congressistas do Partido Republicano também defendem que o projeto não dá ênfase suficiente ao combate ao terrorismo doméstico cometido por grupos de extrema-esquerda.
"Este projeto de lei ignora flagrantemente a persistente ameaça de terrorismo doméstico da esquerda radical neste país e, em vez disso, faz a suposição de que tudo está no branco e na direita", referiu o congressista republicano Darrell Issa.
As divergências entre democratas e republicanos sobre o terrorismo doméstico nos EUA, e como este deve ser definido e processado, têm décadas.
Na sequência do massacre racista em Buffalo, a governadora de Nova Iorque, Kathy Hochul, divulgou que vai exigir que a polícia obtenha ordens judiciais para manter as armas longe de pessoas que podem representar uma ameaça para si mesmas ou para outros.
Nova Iorque é um dos estados norte-americanos que tem a chamada lei de 'bandeira vermelha' [red flag, em inglês], que permitem às autoridades desarmar pessoas, caso estas sejam potencialmente perigosas por causa de um problema de saúde mental.
A governadora de Nova Iorque elogiou este tipo de leis de controlo de armas e pretende que as autoridades solicitem ordens de proteção contra riscos extremos sob a lei de 'bandeira vermelha'.
Esta lei estava em vigor na primavera passada, quando a polícia questionou o suspeito do tiroteio, Payton Gendron, sobre os comentários por ele produzidos quando frequentava o último ano da Susquehanna Valley High School, de que pretendia cometer um homicídio-suicídio.
Payton Gendron foi levado para um hospital para uma avaliação psiquiátrica e libertado um dia e meio depois, sendo que a polícia estatal não iniciou o processo judicial para tirar temporariamente o acesso do suspeito às armas.
A polícia estatal aplicou com sucesso 300 das mais de 1.000 ordens de proteção concedidas pelos tribunais sob a lei de 'bandeira vermelha', que entrou em vigor no outono de 2019.
Kathy Hochul explicou que estes pedidos duram normalmente um ano, mas que podem ser renovados.
Os tribunais podem impedir as pessoas de possuir ou comprar armas de fogo ou ordenar que estas entreguem as suas armas de fogo.