Carga fiscal na construção representa 50% no custo final do imóvel
Cristina Pedra, André Barreto e Paulo Pereira tornaram a abordar o assunto imobiliário, neste caso em concreto o paradigma regional
![Debate da Semana é emitido na TSF-Madeira às sextas-feiras com reposição aos domingos.](https://static-storage.dnoticias.pt/www-assets.dnoticias.pt/images/configuration/R/Clipboard_21_8TKQU2V_Mpp8ntd.jpg)
A questão imobiliária “é bastante interessante” e voltou a merecer diversas considerações do painel de economistas do Debate da Semana emitido pela TSF-Madeira. Cristina Pedra, André Barreto e Paulo Pereira tornaram a abordar o assunto, neste caso em concreto o paradigma regional.
Confrontado por Ricardo Miguel Oliveira com o facto desta semana termos ficado a saber que o aumento da venda de casas no último ano provocou uma descida de 5% no 'stock' do parque habitacional disponível à venda na Madeira, Paulo Pereira foi questionado sobre quem pode, afinal, comprar ou até alugar casa, na Região. Para o economista “no seu grosso” tudo está ligado a “uma grande consequência de acções desejadas ou indesejadas, previstas ou não, de políticos”.
Isto vem num processo de impressão de dinheiro que culminou numa inflacção generalizada. Estamos desde a crise de 2008 a imprimir dinheiro. Para tudo o que é problema imprime-se dinheiro. Como vivemos do imediato - meto um post e se não tenho um like entro em depressão -os políticos acham que se imprimirem dinheiro não têm logo a inflação e que ela não existe. Paulo Pereira
Oferta de habitação à venda na Madeira desceu 5%
O aumento da venda de casas no último ano provocou uma descida de 5% no 'stock' do parque habitacional disponível à venda na Madeira no primeiro trimestre de 2022, face ao que estava disponível no mesmo período de 2021, revela um estudo do idealista.
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Paulo Pereira recordou que “vivemos anos de bolsas a disparar", tal como "o mercado obrigacionista" e "o mercado de arte”, pelo que “qualquer peça de arte valia milhões”, bem como “carros antigos e imobiliário”. “Obviamente que aqui as coisas chegam tarde, tal como o primeiro caso de Covid, mas chegou. Chega sempre”, frisou.
E chegou “porque há pessoas com muito dinheiro” e “os vistos gold vieram empurrar mais gente rica para aqui” quando o que realmente queriam era investir em Lisboa e no Porto – “onde eles queriam estar”.
Foi neste ponto que o economista alertou para a questão de em Portugal “a carga fiscal na construção de casas e apartamentos” representar “50% do custo final do imóvel”.
Aqueles que andam preocupados com os pobres e a classe média, que não têm acesso à habitação, vão lá buscar 50%. Paulo Pereira
Além disso “temos também a questão de toda uma burocracia associada à construção” num país que é “um inferno” no processo de legalização da habitação. Tais entraves à volta da 'papelada' fazem com que “os promotores imobiliários” sintam “tanto risco e tanta incerteza que ainda metem mais margem”.
“É o índice de cagaço e em Portugal este índice de cagaço é muito alargado. Temos de meter muita margem em cima”, criticou.
Se quero estar neste negócio vou apontar as minhas baterias àqueles que são menos sensíveis a variações de 150 mil euros. Vou para o luxo, porque os daqui já estão fora do mercado. O Plano de Recuperação e Resiliência vem agora com 120 milhões, o presidente do Governo não quer fazer bairros sociais – quer diluir isto tudo. Estou desejando de ver se haverá uma nova Bagdad ao lado no novo Dubai. Poderá ser curioso. Para ficar equilibrado o Funchal. Isto, a prazo, e já está a acontecer, vamos andar com as cestas básicas na habitação. Já andámos com as cestas básicas na alimentação – e as autárquicas foram um bom exemplo dessa necessidade – e agora vamos estar a empurrar a população, em nome do assistencialismo, para esta situação. É impossível as pessoas pagarem estes preços. Não se pode fazer nada quanto a isto e a única solução que temos a médio e longo prazo é aumentar salários, para que as pessoas possam acompanhar todo o processo. Paulo Pereira
Então, como é que se aumenta salários? “Voltamos à mesma questão: só vai lá com aumentos de produtividade”. Seguindo a lógica de Paulo Pereira, “as empresas não podem pagar mais por decreto” e “para haver mais produtividade tem de haver bons investimentos: em pessoas, em máquinas, em estruturas, e para isso as pessoas precisam de capital. Não é de dívidas, nem de mais esmolas. É de capital”.
E isto leva-nos a “uma palavra que as pessoas odeiam neste país: com lucros acumulados e poupanças acumuladas nas famílias”. É por isso que “as empresas, além da sua pequena dimensão, têm problemas de capital”.
![Paulo Pereira diz que o índice de cagaço é muito elevado em Portugal.](https://static-storage.dnoticias.pt/www-assets.dnoticias.pt/images/configuration/OR/Clipboard_20_BEntIo2.jpg)
Mão-de-obra tende a ir procurar trabalho na construção civil
André Barreto comungou da visão de Paulo Pereira e olhou para "este fomento do sector imobiliário" trazer "ainda outra questão a jusante".
Sendo este "um sector pouco fiscalizado e com um histórico de vencimentos, entre aquilo que é oficial e aquilo que se paga por fora - mais alto que noutras indústrias - a mão-de-obra tende a ir procurar trabalho" nesta área, "muito naturalmente, porque com 18 anos" se um jovem "vai para pedreiro leva para casa 1.000 euros limpinhos".
"Se for estudar recebe 800 euros brutos. A opção é evidente e o que é que acontece? Falta noutros lados e acabamos por agravar aquilo que para mim é o nosso maior problema económico há décadas que é o baixíssimo nível de formação da nossa população. É verdade que isto dá para vender apartamentos em bitcoins, mas continuo a achar que o problema é outro", defendeu.
Num território onde o terreno é um bem escasso e onde só se permite construir num terço desse território acho que seria importante pensar com outro cuidado o que se anda a fazer sob pena de continuarmos a ajudar destruir aquele que para mim é o nosso maior património, que é esta belíssima ilha bafejada pela natureza com estas condições que temos diariamente a possibilidade de usufruir. André Barreto
André Barreto que visou os “edifícios que ultrapassam em mais do dobro o índice de construção estabelecido”, as “experiências de construção tipo LEGO em zonas novas da cidade” ou a “cogumelização de parte da cidade que está igual a Canárias no seu pior”. Tudo isto com “um impacto grande em quem nos visita” e que “acabam por ter a sensação de que isto é mesmo para turista”.
Podemos vir a ter uma bolha
Quanto a Cristina Pedra, a vice-presidente da Câmara Municipal do Funchal admitiu a possibilidade de virmos a ter uma bolha.
"Diria que grande parte da oferta imobiliária que existe hoje não é para o mercado regional. Não é para os jovens, não é para a classe média”, referiu a economista, ligando a dois factores o interesse no investimento estrangeiro na aquisição de habitação na Região: imobiliário como forma de distribuir diversos investimentos e, por outro lado, uma zona de entrada para a Europa através dos vistos gold.
Tais evidências fazem “com que exista procura para o mercado elevado, de qualidade, e se existir algum travão para que deixem de fazer esta procura teremos aqui uma grande bolha imobiliária, porque não está sequer adequada ao tecido regional e poderá deixar de ter a procura internacional”.
Apesar da hipótese que foi levantada, Cristina Pedra assume que “felizmente tudo o que está a ser construído” já se encontra “previamente” vendido.