Alguém comeu o meu frango!
Com o início da nova legislatura, na Assembleia da República, começamos a perceber quais as prioridades dos vários partidos e do governo, consubstanciadas na apresentação das primeiras propostas legislativas. Das já anunciadas, verificamos que a insistência em matérias importantes como a habitação, salário mínimo ou a despenalização da morte assistida sobressaem como algumas das mais emblemáticas iniciativas que devem merecer o empenho de todos. Todavia, talvez fosse bom que, numa conjuntura, outra vez, de empobrecimento da população não se limitassem a olhar, apenas, para o aumento do Salário Mínimo Nacional (SMN) como panaceia para os males de que milhares de conterrâneos nossos padecem. A valorização dos salários de todos os trabalhadores, do setor público e do setor privado, deve ser uma prioridade para combater a degradação das condições de vida de tantas famílias deste país. Na Administração Pública, por exemplo, os trabalhadores que têm rendimentos um pouco acima do SMN têm visto o seu poder de compra diminuir consideravelmente e o seus salários serem ‘engolidos’ por uma inflação galopante e pelo custo de vida, cada vez mais, insuportável. A narrativa de que os trabalhadores da administração pública têm, em média, salários mais elevados do que os restantes trabalhadores é uma falácia porquanto dão a ilusão de que os servidores do Estado “ganham muito”. Esta conversa faz-me lembrar a história de dois homens que, em média, comiam um frango cada um quando, na verdade, um deles comia os dois frangos e o outro só cheirava.
Assim é esta história dos salários, supostamente, elevados na Função Pública. Existem efetivamente alguns salários altos sendo que a generalidade das pessoas, têm salários irrisórios, prestes a serem ‘apanhados’ pela valorização do Salário Mínimo. É vergonhoso que um Assistente Operacional, com 30 anos de serviço na Função Pública leve para casa, aproximadamente, o valor do salário mínimo. É inaceitável que um Assistente Técnico, com 30 anos de serviço leve para casa 800 euros por mês.
Como é vergonhoso que tenhamos técnicos superiores, nos nossos serviços públicos, a auferirem rendimentos líquidos mensais, entre 850 e 1000 euros. É preciso que não nos fiquemos pela necessária valorização do SMN. É necessário que, urgentemente, sejam criadas as condições para a atualização da generalidade dos salários, nas nossas empresas e no Estado, para níveis condizentes com as necessidades de quem vive do seu salário. Não sendo assim, o empobrecimento e os males sociais aprofundar-se-ão irremediavelmente e, como na história dos frangos, muita gente dirá, com razão, que “alguém comeu o meu frango”!