Madeira

André Barreto defende preço único para todos portugueses viajarem até à Madeira

Economista e empresário ligado ao sector hoteleiro olha para o exemplo dos espanhóis e diz que esta é uma forma de dinamizar o turismo cá dentro

O Debate da Semana emitido pela TSF-Madeira contou com a presença de André Barreto, Cristina Pedra e Paulo Pereira.

O tema dedicado à mobilidade ocupou grande parte do Debate da Semana. O início da operação da Ryanair no Aeroporto da Madeira foi lançado por Leonel de Freitas para a mesa do estúdio da TSF e suscitou diversas leituras e abordagens do painel de comentadores.

Para o economista André Barreto, mais do que a chegada da companhia low-cost irlandesa à pista de Santa Cruz, a verdade é que o país continua "a não ter a capacidade de entender a questão do princípio da continuidade territorial de forma biunívoca", isto é, que seja igual para todos os portugueses. O empresário ligado ao sector hoteleiro não entende como é que o subsídio de mobilidade "pode ter uma leitura diferente" daquela que partilhou.

Nós, locais, pagamos um preço fixo para podermos deslocarmo-nos a Lisboa ou ao Porto. Porque é que ao inverso não se aplica da mesma forma? Isto não é uma invenção da cabeça do André, seria perigoso, eu compreendo. Em Espanha, nos dois sentidos, um madrileno paga para ir a Canárias o mesmo que um canário paga para ir a Madrid. Porquê? Porque o país é o mesmo. Entende-se que esta é também uma forma de fomentar o turismo interno que eu acho que faz sentido. André Barreto

O moderador acabou por questionar André Barreto se haveria capacidade do Estado português em suportar estes custos. “Não tenho a mais pequena dúvida disso. É a mesma coisa que investimento em promoção. É o melhor investimento que o Estado pode fazer. Muito melhor do que em rotundas”, atirou de forma satírica, vincando posteriormente que "há uma colecta de impostos que advêm do sector" turístico.

André Barreto que lamentou o facto desta questão nunca ter sido discutida nestes termos, mesmo que pessoalmente não seja favorável a um preço fixo numa viagem aérea entre Funchal/Lisboa.

“A verdade é que o valor da portagem para quem vive em Bragança é igual ao valor da portagem de um lisboeta que vai a Bragança. A lógica é a mesma. O valor não varia conforme seja ou não residente. A minha perspectiva é portajar uma viagem entre Funchal/Lisboa de forma igual a um lisboeta ou bragantino”, explicou, acrescentado que "o benefício" seria "imediato". 

Paulo Pereira acabou por comentar a ideia e referiu que, quanto à continuidade territorial, “a nossa constituição diz muitas coisas”. Por exemplo, diz que “toda a gente tem direito à habitação, mas não nem toda a gente tem uma casa”.

Espanha é um país muito mais complexo do que em nosso em questões geopolíticas e de eventuais desagregações – é uma nação mais recente do que a nossa como um todo – e usam essas ferramentas como factor de unificação com custos brutais. Paulo Pereira

A aterragem da Ryanair

Cristina Pedra não teceu qualquer opinião sobre a ideia avançada por André Barreto, mas falou da sua “principal preocupação” com a chegada a Ryanair à Madeira.

Para a vice-presidente da Câmara Municipal do Funchal é importante “receber” o turismo que aterra na Região a bordo da companhia low-cost “com qualidade” e, consequentemente, “fidelizar o destino” com “recursos humanos bem apetrechados, bem qualificados, bem formados e com regras de atendimento”.

Ainda bem que Ryanair vem para cá. Desde logo, porque aumenta a oferta. Mais concorrência é sempre melhor e isto fará com que exista um tabelamento – porque são as leis da oferta e do mercado dos preços pornográficos que a TAP pratica muitas vezes – e tendo aqui capacidade de resposta há aqui uma livre opção. Por azar, o início da operação da Ryanair começou logo com dois voos divergidos, o que se calhar não é estranho por ter algumas horas de pista, mas tudo faz parte de um processo de aprendizagem. Cristina Pedra

Já Paulo Pereira assume que “a Ryanair vir é óptimo e é mais um passo num processo de liberalização” e “é a prova que a concorrência tem efeito deflacionário, ou seja, os preços vão baixar nos voos e com os preços a baixar nos voos vai compensar muitos dos problemas que estão a haver da inflacção e perda de poder de compra, na Europa”.

Tudo indica que será um óptimo ano e acredito que se não houver distorções criadas no mercado a própria capacidade de mão-de-obra há-de se resolver, porque muitos subsídios de desemprego vão terminar e a hotelaria poderá pagar mais. Paulo Pereira

Quanto a André Barreto não há qualquer dúvida. “Foi a melhor notícia que tivemos para o turismo nos últimos cinco anos”. Na óptica do gestor hoteleiro “muitos dizem que vai trazer um tipo de turista que não nos interessa, mas é uma falsa questão”.

“Quando temos hotelaria de cinco estrelas a vender-se a 50 e tal euros o problema não é a Ryanair. É outro completamente diferente. Estamos mais ou menos preparados, o pior é perceber que não temos na hotelaria gente suficiente para trabalhar - porque ela desapareceu. O impacto, no imediato, é altamente positivo, não só em termos de ocupação, como também no preço médio que podemos praticar, porque há um valor teórico que as pessoas gastam numa viagem que é libertado para gastar mais no destino em detrimento de gastar na companhia aérea”, afirmou.

Começaram as queixas à Ryanair

Cancelamento de dois voos em dia de estreia e falta de informações motivam reparos

Hoje, cada vez mais, desvaloriza-se a questão da viagem, porque se percebe que é um momento a caminho daquele que é o objectivo, que é passar férias num determinado sítio. Não se dá grande valor ao avião. Pretende-se que seja seguro, cumpra horários e tenha o mínimo custo possível. O caminho é esse. A TAP, em alguns destinos, o seu mindset é igual a uma qualquer companhia low-cost. André Barreto

Porto Santo como destino seguro?

Os problemas com o mau tempo em Santa Cruz tendem a empurrar as aeronaves para o Porto Santo e transporta-nos à velha questão do plano de contingência. André Barreto considerou pertinente recordar os custos que daí advêm.

“O primeiro grande caso ocorreu, salvo erro, em Agosto de 2017. Durante uma série de dias o Aeroporto viu-se impossibilitado de abrir e o movimento desviado nessa altura representou uma perda muito significativa para o sector e consequentemente para o sacrossanto cofre do Estado. Um estudo recente da Universidade da Madeira, aponta para uma perda média anual superior a 30 milhões de euros por via destes agora muito frequentes constrangimentos. Esta semana, a Ryanair que tinha acabado de iniciar a sua operação desviou dois voos”, apontou.

Não sendo eu especialista em aeronáutica, atrevo-me a criticar quem o é, porque imagine-se se este estudo está errado em 90% da sua estimativa as perdas já seriam razão suficiente para uma decisão que não pode admitir-se, em circunstância alguma, demorar cinco anos a ser tomada. Cinco meses seria muito, cinco anos é um absurdo. Acho isto uma completa vergonha que estes senhores da ANAC não sejam tratados como eu fui, no início da pandemia, só pelo facto de ser sócio-gerente de uma empresa e ter sido impossibilitado de receber apoio para o meu vencimento. Estes senhores que em cinco anos não tomam decisão nenhuma, não têm capacidade de responder em termos técnicos a uma questão que é urgente, não são nem despedidos, nem têm ordenados cortados, nem ninguém vai atrás deles para sacar responsabilidades. André Barreto

“Por cá, a coisa também não corre bem, porque nestes últimos cinco anos também não houve capacidade em montar um plano de contingência e convém que os senhores governantes saibam que do rumor já não se livram e, talvez, conviesse que ele exista”, prosseguiu André Barreto, observado que “parece” ser “consensual” que “a solução passa pelo Porto Santo e passa pela existência de um barco rápido entre o Porto Santo e Caniçal para fazer o transporte daqueles que se vêm impedidos de aterrar no Aeroporto da Madeira”.

Ter um elefante a meio da sala e fingir que ele não existe não faz parte do meu feitio. E, portanto, partilhando da opinião que o novo radar é uma necessidade, a alteração dos limites de vento é uma necessidade, um plano de contingência com base no Porto Santo necessidade é, não posso deixar que nada se faça. André Barreto

Ryanair reforça mobilidade e competitividade

Albuquerque diz que agora só fica a faltar os radares para tornar o aeroporto da Madeira mais operacional

Cristina Pedra comungou da opinião do economista de que o Aeroporto do Porto Santo “tem de ser alternativo”. A autarca considerou igualmente a necessidade de “haver um plano de contingência” e que o mesmo “tem de ser estudado”.

Preocupa-me muito mais não ver essa discussão. É um dossier que não é discutido. Tem de ser evidentemente equacionado e implementado um plano de contingência (…) Não é um dossier fácil, mas tem de ser discutido. As partes interessadas têm de ser envolvidas. E quando digo partes interessadas são, desde logo, os próprios ‘players’ do ‘trade’, assim como a ANA, Governo ou ACIF. Tem de avançar. Cristina Pedra

Quando tudo “aponta para que este ano o turismo, na Região, supere as boas expectativas que existem neste momento” – como é o caso do mês de Abril, em que existe já “capacidade esgotada” e, portanto, “prevê-se um ano de overbooking” – Cristina Pedra espera que esta afluência seja utilizada “para poder estancar um período doloroso de perdas permanentes do próprio sector”.

Mas, Cristina Pedra também espera que haja bom-senso em adequar o RevPAR para que se tenha “um destino que aposte na excelência transversal” pois “só assim é que podemos nos posicionar estrategicamente para o futuro da Região” e, consequentemente, “para os postos de trabalho que são criados e outros que se vão criar”.

Voltando à questão do aeroporto, Paulo Pereira admitiu que esteve a estudar o tema e a consumir o máximo de informação possível, pelo que sentiu confortável para explicar de forma clara que “a ANAC precisa de radares novos”, mais que não seja porque “os limites [de vento] foram estabelecidos nos anos 70, baseados nos aviões dos anos 40, portanto, aquilo está tudo errado”.

A gravidade da situação é que a ANAC pertence ao Ministério da Administração Interna, que por normas públicas não pode a Associação de Promoção da Madeira oferecer os radares, o Governo Regional não pode oferecer os radares pi uma Câmara qualquer não pode oferecer os radares. Tem de ser do Orçamento do Estado para a tutela devida. Parecia que estava prometido, mas no Orçamento que foi chumbado não constava. Paulo Pereira

Segundo o que transmitiram a Paulo Pereira, estão a tentar criar o lóbi em São Bento, “mas vamos ver se é mais uma derrota dos seis deputados que lá estão” quando for discutido o novo Orçamento.

Desengane-se que os radares vão ser a solução. Os radares vão ficar três ou quatro anos a gerar informação para que depois a ANAC tenha condições e base de dados minimamente confortáveis para tomar a eventual decisão para os limites. Portanto, temos um problema para vários anos. A questão do Porto Santo tem de ser revista e o dossier está adormecido, porque nunca mais foi assunto. Paulo Pereira

O Debate da Semana é emitido todas as sextas-feiras depois das 19 horas, com reposição aos sábados pelo meio-dia.