Trégua no Iémen é "oportunidade genuína" para relançar processo político, diz Guterres
O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, celebrou hoje o anúncio de uma trégua de dois meses no Iémen e afirmou que esta será uma "oportunidade genuína para reiniciar o processo político" no país.
De acordo com Guterres, esta trégua, que "tem possibilidade de renovação", coincide com o início do mês sagrado muçulmano do Ramadão e abre as portas para atender às necessidades humanitárias e económicas urgentes do Iémen.
"Esta trégua deve ser o primeiro passo para acabar com a guerra devastadora do Iémen. A paralisação dos combates, aliada à entrada de navios de combustível, e a flexibilização das restrições à circulação de pessoas e mercadorias, fora e dentro do país, contribuirão para a construção da confiança e de um ambiente propício à retoma das negociações para uma paz e resolução do conflito", afirmou o secretário-geral.
Na sede das Nações Unidas, em Nova Iorque, António Guterres aproveitou para destacar os "esforços incansáveis" do seu enviado especial, Hans Grundberg, e da sua equipa para chegar a este acordo e felicitou o Governo do Iémen, a coligação liderada pela Arábia Saudita e os rebeldes Huthis por concordarem com esta trégua de dois meses no Iémen, que incluiu ataques transfronteiriços.
"Exorto todas as partes a tomarem as providências necessárias para apoiar a implementação bem-sucedida da trégua e operacionalizar os mecanismos de cooperação sem demora", apelou o ex-primeiro-ministro português.
Guterres anunciou que as partes aceitaram suspender todas as operações militares ofensivas aéreas, terrestres e marítimas dentro do Iémen e além das suas fronteiras.
"A trégua pode ser renovada além do período de dois meses com o consentimento das partes", frisou Guterres.
O Governo internacionalmente reconhecido do Iémen anunciou que libertará dois dos quatro petroleiros retidos a caminho de um porto controlado pelos rebeldes Huthis, para assegurar o acordo de cessar-fogo.
O ministro dos Negócios Estrangeiros iemenita, Ahmed Awad bin Mubarak, anunciou na rede social Twitter "a libertação imediata dos primeiros barcos de combustível no porto de Al-Hudeida", situado no mar Vermelho.
A coligação militar internacional liderada pela Arábia Saudita, que intervém na guerra civil do Iémen desde 2015 em apoio ao Governo internacionalmente reconhecido, tem intercetados quatro navios petroleiros e tem estado a limitar o acesso do crude às zonas controladas pelos Huthis, onde este recurso é cada vez mais caro e mais escasso.
Segundo o ministro, a medida tem como objetivo apoiar os esforços para aliviar o sofrimento dos iemenitas e responder às "iniciativas regionais e internacionais que pedem uma trégua por ocasião do mês sagrado" do Ramadão, que começa no sábado.
Bin Mubarak disse que, além disso, recebeu "diretrizes claras" do Presidente do Iémen, Abdo Rabu Mansur Hadi, exilado em Riad, para "facilitar todos os preparativos" para reabrir o aeroporto da capital iemenita, Sanaa, sob o controlo dos Huthies e que foi alvo de bloqueio durante mais de seis anos.
A coligação impôs um bloqueio aéreo e marítimo nas zonas controladas pelos Huthies, dando acesso quase exclusivamente a voos humanitários das Nações Unidas.
O MNE iemenita indicou igualmente que outra das diretrizes recebidas foi a de completar o processo para uma troca de prisioneiros, que está a ser mediado pela ONU, e que envolve cerca de 2.400 pessoas, entre as quais se encontra um dos irmãos do Presidente do país.
Uma fonte dos Huthis próxima das negociações mediadas pela ONU, citada pela agência noticiosa espanhola Efe a coberto do anonimatom acrescentou que o acordo incluirá o acesso de 20 petroleiros ao porto de Al-Hudeida e a possibilidade de fretar 50 aviões a partir de Sanaa para transportar feridos para o Cairo e Amã.
Na quarta-feira, às 06:00 locais (04:00 em Lisboa), entrou em vigor um cessar-fogo unilateral por parte da coligação internacional no Iémen, numa altura em que decorre uma série de consultas entre grupos iemenitas -- sem a participação dos Huthis -- para elaborar um plano para pôr fim à guerra iniciada em 2014.
Os rebeldes, que já tinham decretado uma suspensão das hostilidades na semana passada, rejeitaram esta trégua por considerarem que não estavam preenchidas as condições prévias necessárias, como o levantamento do bloqueio aéreo e marítimo.
A guerra civil iemenita, que começou em 2014 quando os Huthis tomaram vastas parcelas de território do norte e oeste do país, incluindo a capital, fez centenas de milhares de mortos em quase oito anos de guerra -- não só vítimas dos combates, como também de causas indiretas, como falta de água potável, fome e doenças -, pelo que é considerada pela ONU a maior catástrofe humanitária do planeta, com milhões de pessoas à beira da fome e "mais de 80% da população a precisar de ajuda humanitária".