ONG denuncia detenções arbitrárias de pelo menos 20 jornalistas em 2021
Pelo menos vinte jornalistas foram arbitrariamente detidos na Venezuela em 2021, segundo dados de uma organização não-governamental (ONG), que registou ainda 87 atos de ameaças, assédio e ataques a civis e trabalhadores da imprensa.
Os dados fazem parte do relatório sobre "Liberdade de Expressão -- 2021" que foi apresentado terça-feira aos jornalistas, pela "Um Mundo Sem Mordaça" (UMSM), que pela primeira vez avaliou o fenómeno da autocensura na população e como isso afeta a liberdade de imprensa no país.
"A UMSM documentou 41 incidentes de detenções e prisões arbitrárias de jornalistas e indivíduos no exercício da divulgação e do livre acesso à informação, deixando 20 jornalistas e 21 civis vítimas destas violações", explicou a porta-voz da ONG numa conferência de imprensa.
Segundo Lucina Denício, foram também registados "87 atos de ameaças, assédio ou agressões entre civis e trabalhadores da imprensa, ataques que consistiram em ameaças de funcionários públicos nas redes sociais, perseguição, apreensão de equipamento e material de trabalho, intimidações, ameaças, agressões físicas, morais e psicológicas, entre outras".
"Relativamente aos meios de comunicação tradicionais, registámos 39 casos, dirigidos a canais de televisão e estações de rádio, em que mais de 50% deles foram censurados através de sanções administrativas ou judiciais. Um dos casos mais notáveis foi o da estação de Rádio Rumbos 670 AM, que foi forçada, por uma decisão do Supremo Tribunal de Justiça a suspender a sua programação e a desocupar a sua sede", explicou.
Por outro lado, foram registados 21 casos de bloqueios de páginas web e redes sociais de portais informativos.
A UMSM documentou seis casos de violação dos direitos à propriedade (física), um deles o embargo contra a sede do jornal El Nacional. Também ataques contra a sede dos canais de televisão Venevisión (em Puerto Ordáz) e da VPI TV, em Caracas. Além da Rádio Rumbos 670AM, ouve também uma sanção judicial contra a Rádio Selecta 102.7 FM, atacada por simpatizantes do regime e funcionários públicos.
Em Cumaná (400 quilómetros a leste de Caracas) a sede do Colégio Nacional de Jornalistas (equivalente à Comissão da Carteira Profissional de Jornalista) foi alvo de um incêndio provocado.
Segundo a ONG, funcionários do Estado e simpatizantes do regime realizaram 64 ataques a jornalistas e civis, desde assédio, a investigações, do roubo de equipamentos à obstrução de acesso para reportar e à intimidação.
"Os meios de comunicação pró-governamentais perpetraram 10,3% das ameaças e assédio verbais nas redes sociais, sendo ultrapassados pelos funcionários públicos com 31%", explica-se no relatório da UMSM, precisando que 6,8% das agressões foram realizados por grupos de civis armados afetos ao regime, chamados de "coletivos".
Segundo a ONG, na Venezuela "o direito à liberdade de expressão tem sido afetado pelo não cumprimento das obrigações do Estado de respeitar, garantir, assegurar, cooperar, promover e adotar medidas internas, cada uma das quais tem sido continuamente violada. Esta repetida limitação e privação dos direitos fundamentais à liberdade de expressão e acesso à informação foram documentados desde 2019".
"Isto permitiu compreender a política de sistematização dos processos de violação dos direitos e um notório padrão na falta de compromisso do Estado venezuelano na proteção dos direitos dos cidadãos".
No relatório, a UMSM faz várias recomendações ao Estado venezuelano para travar a perseguição e intimidação nas redes sociais e dos jornalistas, bem como para permitir um acesso mais transparente a estatísticas oficiais, travar a censura e cessar a perseguição e intimidação de cidadãos por divulgarem informações, opiniões e ideias relacionadas com a pandemia da covid-19 no país.
Entre outros dados, a ONG afirmou que 93% da sociedade civil diz não poder exercer plenamente o direito de expressar-se e que 565 pessoas disseram que "não há possibilidade de expressar-se de maneira pacífica" no país e que praticaram "a autocensura por temer represálias governamentais".