Milhares de refugiados recebidos na estação central de comboios de Berlim
Milhares de refugiados que fogem da guerra na Ucrânia estão a ser recebidos diariamente por voluntários e cidadãos anónimos na estação central de comboios de Berlim, onde se oferece ajuda, alojamento, bens essenciais e algum conforto.
Chegam cada dia aos milhares. Muitos, com pouco mais de uma mochila, com crianças de mão dada ou ao colo, e um cansaço acumulado de muitas horas de viagem e de incertezas, sobre o presente e o futuro.
À espera estão centenas de voluntários, muitos deles com a crise de refugiados de 2015 ainda bem presente no pensamento.
Com um colete amarelo fluorescente, Tatijana vem oferecer ajuda. É o primeiro dia da voluntária, de origem russa, a trabalhar na estação central de comboios de Berlim. Conta que hoje foram tantos os voluntários que chegaram para tentar ajudar, que tiveram de mandar muitos para casa.
"Não podia ficar simplesmente sentada em casa sem fazer nada. Não conseguia. Aqui estou a ajudar as pessoas porque falo a língua. Quando chegam, tento perceber o que precisam e encaminhá-las para o melhor local", relata à Lusa.
Na estação, em pleno centro da capital alemã, o frenesim mantém-se. A fachada do edifício tem as cores da bandeira ucraniana e, logo à entrada, há cartazes e símbolos pintados de azul e amarelo que indicam o caminho para o piso inferior. Uma parte foi transformada e adaptada à chegada de ucranianos procedentes da Polónia.
É o caso de Natália, que traz a filha pela mão. O marido, o irmão e o pai ficaram para trás a combater pelo país. É de perto de Radekhiv, entre as cidades de Lutsk e Lviv.
Fez uma pausa em Varsóvia, na Polónia, onde ficou com um familiar, e agora vai seguir para o sul da Alemanha, para casa de uns amigos que as esperam.
"Estou cansada, até para falar. Tento não chorar mais para não preocupar a minha filha, mas sinto uma tristeza muito grande, não dá para explicar. Tenho sorte porque conheço algumas pessoas, mas só penso em voltar para a minha casa", conta esta funcionária de uma escola.
No interior do edifício da central de comboios, as várias ajudas disponíveis para os que chegam estão bem definidas.
Há um ponto para carregar os telemóveis, outro com bebidas quentes e alimentos, uma zona com roupa em cabides e calçado alinhado no chão e outra com mantas e agasalhos.
Com tantas crianças entre os refugiados, uma grande torre com fraldas também se destaca em outra área de apoio.
Ainda dentro da estação, há voluntários a dar ajuda com o idioma e centenas de pessoas de pé, num corredor, com cartazes feitos à mão, a oferecer alojamento.
"Três a quatro camas para uma família pequena com duas crianças e uma mulher durante vários meses na nossa casa", pode ler-se num cartão.
Muitos dos que oferecem casa não falam russo ou ucraniano, mas acreditam que existem outras formas ainda mais importantes de comunicação.
Entre os muitos que estão disponíveis para dar alojamento está Aleksei, de Omsk, uma das maiores cidades da Sibéria.
A viver sozinho em Berlim, Aleksei diz à Lusa que está a oferecer um sofá-cama para uma ou duas pessoas durante várias semanas e, nesse sentido, registou o apartamento numa plataforma de alojamento temporário dedicada a ajudar refugiados ucranianos.
"Não sei como é que a guerra vai terminar. Ficou claro que o plano de Putin falhou e que está a ir na direção errada. Eles esperavam uma 'vitória em pouco tempo' ou uma 'operação especial', como lhes chamam nos jornais russos. Em troca receberam uma resposta firme do povo ucraniano", sublinha o voluntário, cuja mãe é natural de Donetsk, no Donbass (leste ucraniano), cenário de um conflito entre as tropas de Kiev e forças separatistas pró-russas desde 2014.
"De uma coisa estou certo, esta guerra vai deixar muita gente a precisar de ajuda. Seja de pessoas que fogem da Ucrânia, ou de quem teve de ficar no país", lamenta.
As horas vão passando na estação central de Berlim e está um novo comboio prestes a chegar.
Num altifalante improvisado, uma das voluntárias vai dando orientações aos voluntários.
Todos aqueles que chegam devem ser ajudados, sem ser necessário pedir passaporte, independentemente da nacionalidade, sexo, cor ou idade.
Ao final de mais um dia, ouvem-se palmas e o respirar fundo dos muitos que ali passam horas a tentar ajudar.
"É só o começo e o número de refugiados deverá continuar a aumentar", assegura Tatijana, após ter terminado o primeiro dia da sua missão como voluntária.
A Rússia lançou na madrugada de 24 de fevereiro uma ofensiva militar com três frentes na Ucrânia, com forças terrestres e bombardeamentos em várias cidades.
As autoridades de Kiev contabilizaram, até ao momento, mais de 2.000 civis mortos, incluindo crianças, e, segundo a ONU, os ataques já fizeram mais de 1,2 milhões de refugiados na Polónia, Hungria, Moldova e Roménia, entre outros países.