Moscovo anuncia cessar-fogo em Mariupol para que civis sejam retirados
O Ministério da Defesa de Rússia anunciou na noite de hoje um "regime de silêncio", ou um cessar-fogo local, a partir das 10:00 (07:00, em Lisboa) de quinta-feira, para retirar civis da cidade ucraniana cercada de Mariupol.
Esta medida deverá permitir a abertura de um corredor humanitário para a cidade ucraniana de Zaporizhzhia com escala no porto de Berdiansk, sob controlo russo.
"Para que esta operação humanitária seja bem-sucedida, propomos realizá-la com a participação direta de representantes do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) e do Comité Internacional da Cruz Vermelha (CICV)", lê-se num comunicado governamental.
O Ministério da Defesa russo também pede que Kiev garanta o "respeito incondicional" deste cessar-fogo local através de uma nota escrita enviada ao Kremlin, ao ACNUR e ao CICV antes das 06:00 (03:00, em Lisboa) de quinta-feira.
Moscovo também exige que o Exército ucraniano se comprometa a garantir a segurança dos comboios de autocarros que irão viajar pela rota definida.
Pelo menos 5.000 pessoas foram mortas em Mariupol, no sudeste da Ucrânia, desde o início da invasão russa, anunciou segunda-feira uma conselheira da Presidência ucraniana, encarregada dos corredores humanitários.
"Cerca de 5.000 pessoas foram enterradas, mas há dez dias que as pessoas já não são enterradas, por causa dos constantes bombardeamentos", declarou Tetiana Lomakina, citada pela agência noticiosa francesa AFP, estimando que "dado o número de pessoas ainda sob os escombros (...), poderá haver à volta de 10.000 mortos".
A cidade portuária de Mariupol está cercada pelo exército russo desde o final de fevereiro, o que obrigou milhares dos seus habitantes a viver em condições muito difíceis, sem eletricidade, água potável ou comida.
De uma população em tempo de paz de 450.000 pessoas, cerca de 160.000 ainda lá estão encurraladas, segundo o presidente da câmara, Vadim Boïtchenko.
"Todas as entradas e saídas da cidade estão bloqueadas (...), é impossível fazer entrar em Mariupol víveres e medicamentos", lamentou no domingo à noite o Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky.
"As forças russas estão a bombardear as colunas de ajuda humanitária e a matar os motoristas", acrescentou, indicando que as ruas estão cheias de "cadáveres" que é impossível sepultar.
Quase duas semanas após o bombardeamento do teatro da cidade, ainda se ignora o que aconteceu às centenas de civis que ali estavam refugiados: a autarquia, citando testemunhas, disse recear que haja "cerca de 300 mortos". Mas uma deputada municipal que conseguiu fugir de Mariupol no dia desse bombardeamento disse que é impossível proceder a qualquer contagem de vítimas, devido às falhas nas comunicações e à ausência de autoridades locais.
O Presidente francês, Emmanuel Macron, tinha anunciado no domingo que falaria com o seu homólogo russo, Vladimir Putin, hoje ou na terça-feira para organizar uma "operação humanitária" de evacuação da cidade, em conjunto com a Turquia e a Grécia.
Mariupol é uma cidade estratégica no mar de Azov, cobiçada pelos russos para que as suas Forças Armadas possam fazer a ligação entre a Crimeia anexada por Moscovo em 2014 e as regiões separatistas pró-russas de Donetsk e Lugansk, no leste do território ucraniano.
O anterior balanço da câmara municipal, em meados de março, apontava para mais de 2.000 civis mortos desde o início da guerra na Ucrânia.
A Rússia lançou em 24 de fevereiro uma ofensiva militar na Ucrânia que matou pelo menos 1.189 civis, incluindo 108 crianças, e feriu 1.901, entre os quais 142 crianças, segundo os mais recentes dados da ONU, que alerta para a probabilidade de o número real de vítimas civis ser muito maior.
A guerra provocou a fuga de mais de 10 milhões de pessoas, incluindo mais de 4 milhões de refugiados em países vizinhos e quase 6,5 milhões de deslocados internos.
A ONU estima que cerca de 13 milhões de pessoas necessitam de assistência humanitária na Ucrânia.
A invasão russa foi condenada pela generalidade da comunidade internacional, que respondeu com o envio de armamento para a Ucrânia e o reforço de sanções económicas e políticas a Moscovo.