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Europa em Economia de Guerra

A solução para esta dependência passa pela aquisição centralizada de energia por parte da Comissão Europeia

A recente escalada do preço dos combustíveis coloca a União Europeia e Portugal numa encruzilhada de problemas cujo culminar é difícil de vislumbrar. Começou em 2021, com a recuperação económica e o retomar da produção industrial, depois de dois anos de pandemia, o que fez aumentar a procura, criando problemas no abastecimento, perturbando a oferta. O problema agravou-se com o conflito na Ucrânia e o consequente choque do lado do fornecimento na sequência do embargo às importações de crude e gás da Rússia. O mercado internacional do Brent está muito volátil, mas a tendência é claramente de subida - as estimativas da Morgan Stanley apontam para os 120 dólares o barril, no terceiro trimestre, e a Goldman Sachs prevê que possa atingir os 175 dólares até final o ano.

Perante a subida dos combustíveis, que soluções dispõe Portugal para atenuar os efeitos na vida das pessoas e empresas? Serão a imposição de preços ou margens máximas, ou a redução de impostos soluções eficazes?

Perante este desequilíbrio, é natural que a oferta demore a ajustar-se, e o aumento de preços seja uma realidade inevitável, pelo que, no meu entender, não fará sentido limitar preços ou controlar margens dos produtores e/ou distribuidores. Perante expectativas de escassez na oferta, preços artificialmente baixos poderiam levar ao açambarcamento e rutura de stocks, (aconteceu na crise petrolífera de 70) não se percebendo assim que o executivo de Biden encare o recurso a este expediente.

A descida de impostos, sobretudo em Portugal, com uma das maiores cargas fiscais sobre os combustíveis na União, será uma questão de justiça, com benefícios no curto prazo. No entanto, por si só não resolve o problema, até porque estimularia artificialmente o consumo, criando desequilíbrios, sendo parte desses benefícios apropriados pelos fornecedores.

Reconheço que são as políticas mais populares ao alcance dos governos europeus, mas, numa economia de mercado como a nossa, é a lei da oferta e da procura que garante o ajustamento, servindo este acréscimo nas receitas, por via de preços mais altos, de incentivo à entrada de novos fornecedores no mercado, o que levaria ao equilíbrio futuro.

Perante os efeitos pouco quantificáveis destas políticas, julgo que a melhor solução passaria pelo apoio direto às pessoas e empresas, cujos rendimentos não lhes permitem optar por alternativas, estando ainda muito dependentes de combustíveis fósseis. Apostaria em apoios diretos, simples, com resultados visíveis nas suas carteiras - como a tarifa social da energia -, em tudo diferente de instrumentos complicados como o “ivaucher” ou o “autovaucher”, cujo alcance fica muito aquém do esperado e propagandeado pelo Governo. Seria importante aferir o porquê da taxa de execução do primeiro de, apenas, 23,8%!

A Alemanha, muito dependente sobretudo do gás, está renitente face a um embargo total às importações de combustíveis da Rússia. Perante este facto, e no sentido de não bloquear a indústria europeia - reconhecendo que a economia germânica é ainda a alavanca do crescimento europeu -, poderiam ser aplicadas taxas alfandegárias elevadas à importação destes produtos, o que obrigaria os próprios agentes a procurar soluções de fornecimento alternativas. O crude e o gás ficariam mais caros, o seu consumo diminuiria, mas não haveria rutura no curto prazo, garantindo-se, simultaneamente, cortes significativos no fluxo financeiro que alimenta a máquina de guerra de Putin.

Estou convicta que, a médio prazo, a solução para esta dependência passa pela aquisição centralizada de energia por parte da Comissão Europeia - em linha com o que se fez com as vacinas Covid e poderá fazer com a compra de cereais -, enquanto se investe em alternativas renováveis - atualmente, apenas 20% da energia da UE provém destas fontes.

Está em discussão nas instituições europeias a criação de um novo instrumento de apoio aos Estados-membros, semelhante ao NextGenerationEU, que tem subjacente a emissão de dívida conjunta. Seria uma boa solução, permitindo algum desafogo financeiro e libertando os Estados mais endividados para políticas de apoio direto aos mais necessitados. Temo-lo defendido no Parlamento mas está agora nas mãos dos Estados-membros e até ao fecho deste artigo ainda não havia “luz verde” do Conselho Europeu.