Estados devem dar mais protecção a refugiados ucranianos para evitar tráfico e discriminação
Os refugiados da Ucrânia precisam de proteção dos Estados sobretudo para evitar o tráfico humano e as discriminações, defenderam hoje organizações humanitárias, avisando que os governos estão a delegar demasiado as suas responsabilidades em voluntários.
"O Governo polaco [cerca de 60% dos refugiados ucranianos vão para a Polónia] necessita de providenciar um registo adequado, alojamento a longo prazo, apoio psicossocial, transporte e outros tipos de assistência", defendeu hoje a Amnistia Internacional, em comunicado.
Segundo a organização, que enviou uma equipa para a Polónia durante 10 dias para observar o processo de receção dos refugiados, "os voluntários foram muito mais visíveis e ativos do que as autoridades governamentais".
Uma situação que a Amnistia Internacional considera não só arriscada para os refugiados mas também insustentável a longo prazo.
"A falta de intervenção pelo Governo polaco deixa aqueles que fugiram da Ucrânia mais expostos à violência e ao tráfico", explicou, acrescentando que a equipa da organização "visitou várias instalações de receção temporárias, organizadas também para oferecer transporte/alojamento o mais rapidamente possível" que confiaram, muitas vezes, em particulares para oferecer essas medidas.
Além disso, adiantou, "os relatos emergentes de violência baseada no género contra mulheres e raparigas são particularmente preocupantes", tendo organizações polacas de direitos humanos referido estar a "receber relatos de casos adicionais de violência sexual, que permanecem confidenciais".
Também a Agência dos Direitos Fundamentais (FRA) da União Europeia alertou hoje para um "alto risco de tráfico humano" e "grandes preocupações com discriminação e racismo" identificados pelas equipas da organização nos pontos de acolhimento dos refugiados ucranianos.
"Embora a FRA tenha testemunhado um apoio esmagador a todos que fogem do conflito, a agência sublinha a necessidade de se permanecer vigilante e garantir que os direitos das pessoas são respeitados", afirmou.
"Saúdo calorosamente a solidariedade sincera demonstrada em toda a Europa para com as pessoas que fogem do conflito na Ucrânia", disse o diretor da FRA, Michael O'Flaherty, avisando, no entanto, que "há motivos para preocupação imediata que precisam ser abordadas com urgência".
"Os países da UE têm de começar a planear com antecedência as necessidades de milhões de pessoas que podem não ter mais um lar para onde voltar", referiu a propósito da apresentação de um relatório denominado "Pontos de controlo fronteiriços UE-Ucrânia: primeiras observações no terreno".
No documento, a FRA elogia "a enorme solidariedade para com as pessoas que fogem da Ucrânia", mas alerta para "o elevado perigo de tráfico de seres humanos" e as "muitas alegações de racismo".
Segundo adianta, as equipas da FRA observaram "indivíduos a oferecer transporte, trabalho e acomodação" aos refugiados sem controlo das autoridades, pelo que a organização sugere que "as autoridades relevantes envidem esforços adicionais para informar, em linguagem simples e ponderada, sobre os riscos do tráfico" e "aconselhem [os refugiados], logo no controlo de passaporte, a não aceitar passeios ou acomodações não autorizadas".
Por outro lado, "para evitar o risco de tráfico, todas as crianças desacompanhadas devem ser imediatamente colocadas sob cuidados de proteção".
Além destas preocupações mais imediatas, a FRA considera que os governos devem preparar-se para tomar medidas destinadas ao longo prazo, como é o caso da educação das crianças refugiadas.
"Em alguns países, as crianças foram imediatamente colocadas em turmas de escolas locais. Tais iniciativas devem ser continuadas e replicadas", mas "haverá também a necessidade de aprendizagem de línguas para que as crianças possam continuar a sua educação", alertou.
O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) anunciou, na terça-feira, que mais de 3,5 milhões de pessoas fugiram da Ucrânia desde a invasão da Rússia, mais de metade das quais para a Polónia, mas uma grande fatia também para a Roménia e a Moldova.
A agência da ONU deu ainda conta de mais de 6,6 milhões de deslocados dentro da Ucrânia, tendo já admitido que esta é a pior crise de refugiados na Europa desde a Segunda Guerra Mundial.
A Rússia lançou, a 24 de fevereiro, uma ofensiva militar na Ucrânia, depois de meses a concentrar militares e armamento na fronteira com a justificação de estar a preparar exercícios.
A guerra já matou pelo menos quase mil civis e feriu cerca de 1.500, incluindo mais de 170 crianças, de acordo com as Nações Unidas.
A invasão russa foi condenada pela generalidade da comunidade internacional, que respondeu com o envio de armamento para a Ucrânia e o reforço de sanções económicas e políticas a Moscovo.