Guerra da Ucrânia pode antecipar discussão sobre serviço militar obrigatório
O general Luís Valença Pinto considerou hoje que o contexto de agressão militar pela Rússia à Ucrânia pode colocar "em cima da mesa" o debate sobre o regresso do serviço militar obrigatório "mais cedo do que se pensava".
O antigo Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas (CEMGFA) entre 2006 e 2011 falava numa conferência virtual intitulada "Cenários de emprego das Forças Armadas no futuro", promovida pela secção de Ciências Militares da Sociedade de Geografia de Lisboa.
"Se me perguntassem há um mês o que é que eu pensava sobre uma eventual retoma do serviço militar obrigatório em Portugal e no resto da Europa eu diria que não havia espaço político nem psicológico para fazer essa discussão e, portanto, seria porventura, independentemente da bondade de cada modelo em si, em termos práticos e pragmáticos, uma discussão a deixar a uma geração seguinte", disse Valença Pinto.
No entanto, face ao contexto de agressão da Rússia à Ucrânia, "e a reação que se viu, por exemplo, em países como a Suécia, como a Finlândia, etc, talvez venha a colocar o debate do serviço militar obrigatório em cima da mesa mais cedo do que se pensava", acrescentou.
O general vincou que é importante que este serviço não seja de curta duração e mostrou-se favorável à ideia de um serviço militar obrigatório integrado num conceito de serviço cívico, com uma componente armada e uma não armada, desde que fosse "geral e universal". O serviço militar deixou de ser obrigatório em Portugal em 2004.
Sobre a guerra na Ucrânia, o general Valença Pinto defendeu também que este país tem ganho o conflito do ponto de vista comunicacional.
"Estando de um dos lados uma potência que todos sabemos ser uma campeã da desinformação, da propaganda e das 'fake news', como essa potência tem levado 'um baile' pelo mesmo tipo de atitudes praticado pelo lado ucraniano. Quem tem ganho a guerra comunicacional tem sido a Ucrânia -- não vou discutir se é tudo propaganda, se é sempre informação, se há 'fake news' ou não, isso é outra conversa, mas na minha leitura e julgo que é inequívoco o lado ucraniano tem ganho essa guerra", disse.
O antigo CEMGFA considerou também que é "empobrecedor conceber a NATO em função do inimigo", vincando o cariz político desta organização.
"Tem como sua maior e mais nítida e evidente expressão a componente militar, isso é inegável, mas a NATO é uma organização política construída em torno de princípios e de valores e de proteção de interesses comuns e é isso que deve prevalecer como referência da coesão e não referência do 'anti'", acrescentou.
Valença Pinto considerou que o mundo está "perante um líder completamente bizarro, um pária muito perigoso com manifestações de sociopatia que não deve ser confundido com o país Rússia e o povo russo", referindo-se a Vladimir Putin.
A Rússia lançou a 24 de fevereiro uma ofensiva militar na Ucrânia que já causou pelo menos 726 mortos e mais de 1.170 feridos, incluindo algumas dezenas de crianças, e provocou a fuga de cerca de 4,8 milhões de pessoas, entre as quais três milhões para os países vizinhos, segundo os mais recentes dados da ONU.
A invasão russa foi condenada pela generalidade da comunidade internacional que respondeu com o envio de armamento para a Ucrânia e o reforço de sanções económicas e políticas a Moscovo.