Jornalista russa presente a tribunal por manifestação em directo
Marina Ovsyannikova interrompeu a emissão do noticiário com mais audiências na Rússia exibindo um cartaz criticando a guerra na Crimeia em plena emissão "da propaganda e mentiras do Kremlin".
A jornalista russa que protestou contra a guerra na Ucrânia na televisão russa está a ser julgada hoje por se ter manifestado ilegalmente e declarou-se inocente da acusação, segundo um tribunal moscovita.
A audiência está em curso, de acordo com o tribunal do distrito Ostankino de Moscovo, e a arguida, Marina Ovsyannikova - que na segunda-feira irrompeu num noticiário em direto de um canal televisivo estatal russo, com um cartaz protestando contra a guerra na Ucrânia e a propaganda russa - poderá ser condenada a dez dias de prisão.
"Não admito culpa", declarou, na sala de audiência, sublinhando que expressou a sua oposição ao conflito.
"Continuo convencida de que a Rússia está a cometer um crime (...) e que ela é o agressor da Ucrânia", acrescentou.
Ainda segundo o tribunal, Ovsyannikova não foi até agora formalmente acusada do crime de publicação de "informações falsas" sobre o exército russo, passível de uma pena máxima de 15 anos de prisão.
Entretanto, o Presidente francês, Emmanuel Macron, anunciou hoje que França está pronta para oferecer a sua proteção à jornalista russa, na embaixada ou concedendo-lhe asilo, e exigiu a Moscovo "todos os esclarecimentos" sobre a sua situação.
"Vamos tomar medidas para oferecer proteção, seja na embaixada, seja através de asilo, à vossa colega", disse à imprensa, acrescentando que terá "oportunidade no próximo encontro com o Presidente Putin de propor esta solução de forma direta".
A Presidência francesa pretende oferecer a Marina Ovsyannikova proteção consular na sua embaixada em Moscovo, mas precisa do acordo da Rússia, explicou o palácio do Eliseu.
Também o Alto-Comissariado da ONU para os Direitos Humanos reagiu hoje ao caso de Ovsyannikova, pedindo às autoridades russas que não adotem medidas de retaliação contra a jornalista.
"Acompanhamos o seu caso e estamos em contacto com as autoridades para lhes pedir que não adotem represálias contra ela", disse, em conferência de imprensa, a porta-voz da agência da ONU, Ravina Shamdasani.
A jornalista, filha de pai ucraniano e mãe russa, entrou no estúdio de televisão durante o noticiário Vremya (Tempo), do Canal 1, mostrando, atrás da 'pivot', um cartaz com a mensagem "Não à guerra. Ponham fim à guerra. Não acreditem na propaganda. Aqui, estão a mentir-vos. Russos contra a guerra".
Ativistas de direitos humanos denunciaram que, após o protesto, Marina Ovsyannikova foi detida pela polícia e está a ser investigada pelas autoridades.
A ação de protesto da jornalista foi elogiada, entre outros, pela Comissão Europeia, cuja porta-voz da Política Externa a considerou "uma tomada de posição moral corajosa", e pelo Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, que, num discurso, agradeceu a sua coragem "e a dos russos que continuam a tentar transmitir a verdade".
A Rússia lançou na madrugada de 24 de fevereiro uma ofensiva militar na Ucrânia que causou já a fuga de 4,8 milhões de pessoas, mais de três milhões das quais para os países vizinhos, de acordo com os mais recentes dados da ONU -- a pior crise na Europa desde a Segunda Guerra Mundial (1939-1945).
A invasão russa foi condenada pela generalidade da comunidade internacional, e muitos países e organizações impuseram à Rússia sanções que atingem praticamente todos os setores, da banca ao desporto.
A guerra na Ucrânia, que entrou hoje no 20.º dia, causou um número ainda por determinar de mortos e feridos, que poderá ser da ordem dos milhares.
Embora admitindo que "os números reais são consideravelmente mais elevados", a ONU confirmou hoje pelo menos 691 mortos e 1.143 feridos entre a população civil, incluindo mais de uma centena de crianças.