Um arquipélago de salários baixos
«Adequado para quê, adequado para quem? Adequado por quanto tempo? Adequado por quem?» Veit-Wilson, citado em «Rendimento adequado em Portugal»
Um dos grandes problemas com que a Região é confrontada há décadas tem que ver com o facto de não acertamos numa forma de garantir que as pessoas consigam viver com um rendimento adequado às suas necessidades.
Quase cinco décadas de PSD à frente dos destinos da Região, com uma economia pouco ambiciosa, assente em salários baixos em vez de uma economia de valor acrescentado, traduzem-se numa realidade que nos deve sobressaltar: temos a mais alta taxa de risco de pobreza e exclusão social do País (32,7%), ostentamos a mais alta taxa de privação material e social severa do País (11%) e uma taxa de risco de pobreza da população empregada (17,8%) que é 8,3 pontos percentuais acima da média nacional; não surpreende, por isso, que a Madeira seja também a região do País que tem o menor poder de compra. Somos um arquipélago maioritariamente de salários baixos mas cujo custo de vida está tabelado por cima.
Um dos primeiros problemas está no facto de não se reconhecer a pobreza como sendo um dos nossos maiores problemas nem tão pouco se admitir que as medidas adotadas no último ano, ou nos últimos dois, cinco ou 10 anos não têm sido eficazes e que por isso é preciso alterá-las. Pelo contrário, quando os números da pobreza são invocados para reflexão, ouvimos uma série de argumentos que podem ir desde a justificação de que não estão certos (apesar de a fonte ser a Direção Regional de Estatística e, por isso, facilmente corroborados), até à justificação de que a pobreza é estrutural nas regiões ultraperiféricas, esquecendo que o governo dos Açores tem conseguido indicadores melhores do que os nossos.
Somos cada vez mais um arquipélago de salários baixos mas o Governo Regional insiste em manter o acréscimo salarial ao salário mínimo nos 2,5%. Para pôr a questão em perspetiva, os Açores têm implementado, ano após ano, 5% de acréscimo e o facto é que os ultrapassamos em matéria de pobreza. A pobreza que grassa no nosso arquipélago, constituído por duas ilhas habitadas, não pode ser mais estrutural do que a de um arquipélago que tem de gerir nove ilhas habitadas.
Lembro-me do primeiro debate nesta legislatura sobre o acréscimo salarial a vigorar em 2020: na altura, a Secretária Regional da Inclusão Social e Cidadania justificava a opção do Governo com o facto de que as pessoas depois poderiam pedir outros apoios sociais. Ou seja, assumiu que era opção do Governo manter uma política assistencialista, de mão estendida, em vez de valorizar o trabalho. É certo que nunca mais se afirmou publicamente o mesmo. Mas se há uma contenção nas palavras, certo é que, na prática, a política implementada não mudou. Três anos depois, com números estatísticos que nos dizem que estamos pior, o acréscimo salarial ao salário mínimo na Região continua a ser, em 2022, os mesmos 2,5% de sempre; só não se disse que as pessoas poderiam depois pedinchar apoios sociais.
As políticas sociais devem estabelecer mínimos sociais que garantam a valorização da dignidade humana. O grande problema é que as políticas adotadas na Região não foram pensadas a partir deste pressuposto nem para benefício da maioria das pessoas. E como não funcionam para a maioria das pessoas, assistimos a um avolumar dos problemas sociais e a uma crise demográfica que põe em risco o futuro da Região. Estamos perante uma realidade em que as pessoas, das menos às mais qualificadas, emigram para outras regiões que pagam francamente melhor e proporcionam, com isso, mais segurança e estabilidade financeira às famílias. Temos cada vez menos a oferecer a quem fica – e a quem regressa. E para lá de todo o fogo de artifício e controlo exercido, a verdade é que os/as emigrantes e lusodescendentes que regressaram nos últimos anos não têm tido o apoio propagandeado – e também quem veio pensa cada vez mais em tornar a partir. A falta de esperança traduz-se no facto de que já chegamos ao ponto de haver dias em que não há um único nascimento e que a continuar assim, passaremos de um arquipélago de salários baixos para um arquipélago sem gente dentro.
O PS-Madeira tem apresentado, em sede de Assembleia Legislativa Regional, múltiplas propostas no sentido de inverter esta realidade, propostas essas que têm sido sucessivamente barradas pelos partidos que suportam o Governo Regional. Apesar de o PSD ter perdido a maioria em 2019, o CDS garantiu que nada mudava, enviesando a vontade expressa pelo eleitorado.
Mas esta realidade pode ser alteradas em 2023.
Convido-vos a seguirem o Congresso do PS-Madeira que acontece este fim-de-semana e que marca o início de um novo ciclo sob a liderança de Sérgio Gonçalves. O Partido Socialista da Madeira tem todas as condições para implementar uma forma de fazer política que quebre a falta de rasgo e empenho que pulsa na governação atual. Assume claramente o compromisso de apresentar um programa de Governo que aposte em políticas inovadoras focadas no desenvolvimento da Região.
Estamos a construir um projeto para transformar um arquipélago de salários baixos num arquipélago que investe realmente nas pessoas e no futuro. O futuro começa aqui.