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Pacto Ecológico: Amplificar a voz dos mais vulneráveis

Nos últimos 20 anos, a Europa enfrentou um rol de desafios que evidenciaram divisões assinaláveis entre vários Estados-membros. Foi assim com a crise do Euro (2010), com a crise migratória (2015), com o Brexit (2019), e de forma idêntica, em 2020, com a crise pandémica. Esta crise, contudo, exigiu maior cooperação e solidariedade efetivas. A Europa, cometendo alguns erros, parece ter aprendido com falhas do passado, encontrando respostas que me parece injusto não as ressalvar. O fundo de recuperação e resiliência e a compra centralizada de vacinas são dois bons exemplos.

O Pacto Ecológico Europeu é próximo grande desafio. Um processo que pode ser aglutinador e cimentar o projeto europeu ou ao invés, o detonador responsável pelo seu desmoronamento.

A emergência climática é uma realidade impossível de contornar. Entre cidadãos europeus, sobretudo as gerações mais novas, emerge a necessidade urgente de implementar políticas em nome de um bem maior: salvar o nosso planeta.

Dados da Comissão Europeia revelam que 90% dos europeus são favoráveis à redução das emissões de CO2. Neste contexto, onde faltar a solidariedade, proliferará o eurocepticismo e os populismos que floresceram no dealbar das crises recentes.

Estaremos preparados para a inevitável subida do preço da energia, para o abandono de um estilo de vida centrado no consumismo, no uso do automóvel e muito dependente de energias fósseis? Países periféricos como Portugal vão evidenciar uma escalada nos números da pobreza energética, na escassez de soluções de transporte, no aumento do custo das matérias primas e bens importados, com evidente prejuízo para as famílias mais pobres e para as pequenas e médias empresas.

Corremos, uma vez mais, um sério risco de espoletar nova clivagem entre norte e sul da Europa já que (inevitavelmente) nos próximos anos continuaremos a experienciar a escassez na oferta de energias renováveis e, com o retomar da economia mundial, um aumento na sua procura. O esquema do problema é simples (a sua resolução nem tanto): aumenta a procura de energia, a oferta não acompanha, o investimento em energia fóssil reduz-se substancialmente, este vazio não é de imediato preenchido pelas renováveis (fornecem apenas 34% da eletricidade na UE), a volatilidade do mercado aumenta e, com ela, os preços, pelo que a escalada no preço da energia poderá ter sido, a primeira de muitas. Situação agravada com a recente invasão Russa da Ucrânia, com Putin a “matar” os acordos de Minsk.

O Quadro Financeiro Plurianual apresenta um substancial reforço das verbas de apoio a esta transição; 30% dos 1,8 biliões€ têm de ser afetados ao clima. No entanto, já se percebeu que este valor será escasso, se ambicionamos atingir os objetivos do Pacto Ecológico Europeu, diminuindo as emissões em 55% até 2030 e as zero emissões até 2050.

Regiões ultraperiféricas, como a Madeira, com mercados de menor escala, com pouca oferta de transportes e com baixo poder de compra vão enfrentar enormes desafios no futuro próximo considerando que não atraem investimentos nas áreas das energias alternativas sustentáveis. É, também, por estas regiões que continuamos a trabalhar. Temos vindo a exigir que a política de ajudas da União seja para: maior apoio financeiro à transição e adequação de políticas que permitam uma transição suavizada no tempo, seja por via de derrogações, seja por via de isenções, caso essa mesma transição se revele impossível.

Atingir as metas climáticas a que se propõe o Pacto Ecológico só será possível se houver uma mobilização de todos os europeus. Mobilização que só acontecerá se ninguém ficar excluído e houver um verdadeiro mecanismo de solidariedade.

O Parlamento Europeu tem em mãos, no momento presente, um pacote legislativo (Fit55) da Comissão Europeia que servirá de instrumento para atingir estas metas. Os Eurodeputados têm a obrigação de amplificar a voz dos mais vulneráveis, dos Países periféricos, da Ultraperiferia. Temos de entregar soluções. Falhar neste mecanismo de igualdade é dar azo a fenómenos como o dos “coletes amarelos” e com isso potenciar um divisionismo, porventura irreparável, no projeto europeu.