Petróleo pode subir até aos 140 dólares se o conflito persistir
O especialista em energia António Costa Silva estima que o petróleo poderá subir até 140 dólares se o conflito na Ucrânia persistir, depois o barril de petróleo Brent, de referência na Europa, ter hoje voltado a bater os 100 dólares.
"As perspetivas, se a guerra na Ucrânia se prolongar são de uma subida até aos 120 dólares por barril", num cenário em que o governo ucraniano capitula à Rússia, ou "mesmo [chegar aos] 140 [dólares] se o conflito persistir", "com a Ucrânia enfraquecida e disfuncional, com a presença russa nos setores vitais do país", afirmou em declarações à Lusa o ex-presidente do Conselho de Administração da Partex.
O também autor da "Visão Estratégica para o Plano de Recuperação Económica de Portugal 2020/2030? e que preside à Comissão Nacional de Acompanhamento do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) assinala, contudo, que o conflito "pode terminar mais cedo" e "com um novo quadro no terreno favorável às pretensões russas", advertindo que, no entanto, "o mal já está feito e algumas consequências vão estar connosco".
O especialista em energia aponta como consequências os "altos preços das matérias-primas, da energia e dos bens alimentares", bem como o "crescimento das tensões inflacionistas", a "subidas das taxas de juro e do serviço da dívida", a "volatilidade e instabilidade nos mercados em particular financeiros" e uma "maior aversão ao risco e ao investimento", assim como "maiores dificuldades para a recuperação rápida da economia no pós-Covid".
Questionado sobre o impacto do conflito para a Europa em termos energéticos, António Costa Silva alerta que é "enorme", uma vez que a Rússia fornece cerca de 40% do petróleo consumido pela Europa e 35% do gás.
"A companhia estatal russa Gazprom é a maior produtora de gás do mundo, controla mais de 30% das reservas mundiais de gás e é um ator energético fortíssimo no mercado europeu sendo que, como aconteceu no passado recente, a Rússia pode usar a energia como arma geopolítica", salienta.
Exemplifica que em 2021 o preço do gás aumentou cinco vezes, assinalando que, "quando a retoma económica começou, a oferta existente não acompanhou a procura e esta dissonância, aliada às disrupções nas cadeias logísticas internacionais, pressionou os preços em alta".
"Com a guerra na Ucrânia o que o presidente russo pretende é adicionar a esta cascata de crises uma crise maior no plano energético e no plano económico, com o aumento expressivo da inflação e o espectro de uma recessão económica. Isso é o pior que pode acontecer numa altura em que estamos a sair de uma crise pandémica profunda", refere.
Para Costa Silva o objetivo de Vladimir Putin "vai muito além da Ucrânia e no fundo é desestabilizar as democracias europeias, desacreditar a ordem liberal democrática e rever a arquitetura de segurança da Europa que vigora desde o fim da Guerra Fria".
Apesar de explicar que o impacto do conflito em Portugal "é marginal" do ponto de vista do fornecimento de energia, uma vez que o país importa gás principalmente da Argélia e da Nigéria "e, no que concerne ao petróleo, tem uma panóplia diversificada de fornecedores", o país deverá sofrer com os efeitos indiretos.
O Governo português garantiu esta quinta-feira que está salvaguardado o abastecimento dos sistemas nacionais de gás e de petróleo, caso a Rússia corte o fornecimento à União Europeia, após invasão à Ucrânia e consequentes sanções internacionais a Moscovo.
"A garantia do abastecimento do Sistema Nacional de Gás e do Sistema Petrolífero Nacional estão salvaguardadas, merecendo e tendo, necessariamente, o acompanhamento próximo e constante pelo Governo e demais entidades competentes", de acordo com uma nota enviada às redações pelo Ministério do Ambiente e da Ação Climática.
O Governo lembrou que em 2021 apenas 10% das importações de gás natural (GN) em Portugal foram provenientes da Rússia, "pelo que não se antevê que uma potencial interrupção do fornecimento por parte da Rússia represente uma disrupção no fornecimento de GN a Portugal".
António Costa Silva identifica, no entanto, o impacto através de efeitos indiretos nos preços da energia e dos bens alimentares, recordando que "a Ucrânia é um dos celeiros do mundo e os preços do milho e em particular do trigo já estão a aumentar significativamente", assim como "a subida da inflação, pressão sobre os bancos centrais para reverem a sua política de estímulos à economia, subida das taxas de juro", levando a uma "forte complicação de todo o cenário macroeconómico tornando mais difícil a recuperação da economia".
"Depois da crise pandémica uma guerra na Europa é tudo o que não precisávamos", argumenta.
A Rússia lançou na quinta-feira de madrugada uma ofensiva militar na Ucrânia, com forças terrestres e bombardeamento de alvos em várias cidades, que já provocaram pelo menos mais de 120 mortos, incluindo civis, e centenas de feridos, em território ucraniano, segundo Kiev. A ONU deu conta de 100.000 deslocados no primeiro dia de combates.
O Presidente russo, Vladimir Putin, disse que a "operação militar especial" na Ucrânia visa "desmilitarizar e desnazificar" o seu vizinho e que era a única maneira de o país se defender, precisando o Kremlin que a ofensiva durará o tempo necessário, dependendo de seus "resultados" e "relevância".
O ataque foi condenado pela generalidade da comunidade internacional e motivou reuniões de emergência de vários governos, incluindo o português, e da Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO), União Europeia (UE) e Conselho de Segurança da ONU, tendo sido aprovadas sanções em massa contra a Rússia.