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Pode vir aí uma "nova crise económica global"

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Foto EPA

O bastonário da Ordem dos Economistas, António Mendonça, alerta que os últimos desenvolvimentos na tensão entre a Rússia e a Ucrânia podem desencadear uma nova crise económica mundial, advertindo para o impacto nos preços da energia.

"Pode ser que estejamos à beira do desencadear de uma nova crise económica global, a juntar-se à crise financeira de 2008-2009 e à mais recente crise da covid-19. Poderá ser catastrófico", disse António Mendonça, em declarações à Lusa.

O professor catedrático do ISEG assinala que os impactos das sanções económicas à Rússia serão variáveis, dependendo da dimensão das relações económicas, mas, apesar de considerar que vários projetos em curso serão afetados, acredita que "Portugal não será seguramente o mais afetado".

Para o economista, "não é claro qual o tipo de consenso que existe na União Europeia relativamente à qualidade e à dimensão das sanções, nem quanto à sua aplicação efetiva", justificando ser "sintomático que, tendo em conta a evolução dos acontecimentos, não tenha sido preparada, também, uma resposta escalada, à medida da evolução do conflito".

"O que está a acontecer era previsível e, mais uma vez, os americanos têm marcado a dinâmica da resposta ocidental, o que não deixa de ser prejudicial para a própria União Europeia que corre sérios riscos de perder completamente a iniciativa numa questão em que os europeus serão sempre os mais afetados", argumenta.

Questionado sobre o impacto para setores fundamentais, como o da energia, António Mendonça antecipa que "serão grandes", tendo em conta a dependência energética da Europa da Rússia, particularmente do gás.

"O Nord Stream 2 será seguramente afetado, mas ainda não tem impactos no abastecimento da Europa. As consequências negativas são, sobretudo, para a Rússia", vinca, acrescentando: "Naturalmente que os impactos sobre os preços serão grandes, com todas as repercussões em cadeia".

Ainda assim, o economista espera "que tenham sido tomadas medidas para minorar os prováveis impactos em termos de abastecimento, particularmente dos mais dependentes, como é o caso da Alemanha. Os Estados Unidos, por exemplo, podem vir a ser bastante beneficiados, com o desvio das importações europeias".

No entanto, admite que "não será fácil substituir de um momento para o outro mais de 20% do gás consumido na Europa".

"Pode ser uma oportunidade para fazer valer os projetos energéticos de Portugal e designadamente o papel do porto de Sines como porta de entrada energética da Europa. E neste domínio um argumento para reforçar o sistema de transporte energético na Península Ibérica e as suas ligações com a Europa", defende, acrescentando poder ser "uma boa ocasião para a União Europeia pensar como unidade e não como um somatório de interesses dos mais fortes".

Para o bastonário dos Economistas, "o efeito mais importante será a alteração do clima político geral, na Europa e no mundo. Esta é uma situação que poderá afetar a evolução de outros conflitos, como o da China com Taiwan".

"Mais do que avaliar os efeitos económicos -- que serão múltiplos -- é necessário pugnar pelo bom senso, de parte a parte. Não podemos permitir que ocorra uma tragédia, de dimensão incalculável à partida, dentro da nossa casa", vinca.

A União Europeia anunciou hoje a aprovação, por unanimidade entre os 27 Estados-membros, de um pacote de sanções à Rússia, visando "atingir e muito" as autoridades russas, após reconhecimento de territórios separatistas no leste ucraniano.

A posição da UE surge após o Presidente russo, Vladimir Putin, ter assinado, na segunda-feira à noite, um decreto que reconhece as autoproclamadas repúblicas de Lugansk e de Donetsk, no Donbass (leste da Ucrânia), e de ter ordenado a mobilização do exército russo para "manutenção da paz" nestes territórios separatistas pró-russos.

A decisão de Putin foi condenada pela generalidade dos países ocidentais, que temiam há meses que a Rússia invadisse novamente a Ucrânia, depois de ter anexado a península ucraniana da Crimeia em 2014.

Em 2014, a Rússia anexou a península ucraniana da Crimeia, depois da queda do Governo pró-russo em Kiev, e elaborou um referendo sobre o regresso do território à Federação Russa. Desde então, Kiev está em conflito com separatistas pró-russos no leste do país.

A guerra no leste da Ucrânia entre as forças de Kiev e milícias separatistas fiz até ao momento mais de 14 mil mortos, de acordo com as Nações Unidas.