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Os egos

O problema histórico do CDS reside num facto: a proporção de gente com ego elevado que pulula nos corredores é inversamente proporcional à dimensão eleitoral e social do partido. Todos sabemos que egos elevados não se limitam a salas de conselhos ou de comissões políticas, pois têm a firme convicção de que o mundo espera, ansioso, as doutas palavras que as suas razões de sempre – mesmo que, de vez em quando, essas razões mudem – os fazem debitar.

É a vida e não vai mudar, mesmo que o partido chegue ao poder; mesmo que tenha a presidência do parlamento; mesmo que contribua para a estabilidade governativa, num tempo em que somos ameaçados por uma crise sem precedentes; mesmo que seja importante na única vitória num país que ainda acredita em histórias cor de rosa; mesmo que tenha sido relevante para resgatar autarquias ao Partido Socialista; mesmo que os cargos executivos sejam desempenhados com competência; mesmo que centenas de militantes, reconhecidos, conhecidos e também anónimos venham para a rua nas campanhas; mesmo que as propostas sejam aprovadas por unanimidade ou por esmagadora maioria nos conselhos regionais e nacionais e nas comissões políticas; mesmo que o céu esteja azul, que o dia seja claro, que a voz da Dina ecoe a falar da mesma canção, que a comida esteja ótima, que a dor de dentes tenha passado, que o vinho seja bom e que a banda, afinal, tenha tom, os egos não desvanecem e lá vêm os “testes de pureza” do sangue centrista (ou democrata cristão, ou conservador, ou o Diabo a quatro - citando o Zé Mário Branco e arriscando ficar sem certificado, “qual é a tua, ó meu (...) é só puxar a Pontinha, cai o Carmo e a Trindade no mesmo dia”, e lá vem o símbolo que não está mas que afinal até estava; lá vem a estratégia que a gente defendeu mas da qual já não gosta, por pessoalíssimas razões de interesse geral; lá aparece, escarrapachada, a palavra “repensar”, que nunca fora usada em reuniões internas, ou por falta de comparência ou por falta de outra coisa qualquer; lá vem o “posicionamento” e o “reposicionamento” e o “planeamento” e lá vem o esquecimento, porque há egos que querem repensar olvidando o papel desempenhado em conselhos estratégicos que, suponho eu, tenham aconselhado estrategicamente a direção nacional que ajudou a remover o partido do Parlamento. “Belamento”!

A mim, que sou avesso a lições de moral, resta-me voltar ao início, viajando nas letras de uma frase atribuída a São Marcos: “aliena vitia in oculis habemus, a tergo nostra sunt” e concluindo com clareza: entendo que na Madeira, o caminho passa por continuar o trabalho conjunto com o PSD, em 2023. Se isso fizer a infelicidade de muita gente, nos dois lados, aconselho a direção do CDS-M a entregar a chave e esperar que quem vier, faça melhor. O meu ego é suficientemente democrático para aceitar.

Nota: quero agradecer às dezenas de militantes do CDS-M que caminharam comigo na última campanha eleitoral. Adaptando o “hino” do Liverpool, “I have never walked alone”. O contributo que deram foi extraordinariamente relevante para a vitória alcançada.