Livro de BD de lusodescendente retrata chegada dos portugueses a França
O livro "Les Portugais" chega às livrarias francesas a 03 de fevereiro e conta em banda desenhada a odisseia dos portugueses nos anos 70 em França, numa obra que o autor Olivier Afonso espera "abrir o debate" sobre a emigração lusa em França.
"Fico contente que haja um vestígio destas histórias e, se isto puder ajudar as pessoas a compreenderem melhor tudo o que se passou, ficarei muito feliz. Era bom que servisse também para abrir o debate sobre a emigração portuguesa em França, acho que os portugueses são muito pudicos sobre a sua própria história", disse Olivier Afonso, autor desta história, em declarações à Agência Lusa.
Olivier Afonso nasceu nos anos 1970 em França, filho de emigrantes portugueses vindos de Monção e Felgueiras, e cresceu nos arredores de Paris tendo desde muito cedo apetência para as artes. É artista plástico e há mais de 20 anos que realiza maquilhagem e efeitos especiais para cinema, tendo participado na conceção de alguns dos filmes de maior sucesso em França nos últimos anos, tendo realizado o filme "Girls with Balls".
No entanto, uma história foi ficando sempre contar, a da chegada dos seus pais. Desde 2000 que Olivier Afonso afinou o que pensava que viria a ser um argumento para um filme sobre as suas origens, mas ao ter encontrado o ilustrador Aurélien Ottenwaelter, a ideia de uma banda desenhada, um género de culto em França, pareceu-lhe evidente.
"Eu sei que as pessoas têm alguma dificuldade em ler livros porque é algo rígido e, para mim, era importante que fosse em formato de banda desenhada porque as imagens falam. Há também a cor, algo que é cinematográfico", explicou.
Através da história escrita por Olivier Afonso, de fotografias da época e investigação sobre o momento histórico da vinda de muitos portugueses até França nos anos 70, nasceu o álbum de banda desenhada "Les Portugais", editado pela editora Les Arènes, que vai ser lançado no dia 03 de fevereiro em várias livrarias um pouco por todo o território gaulês.
O livro conta a história de dois portugueses, Mário e Nel, desde o momento em que são deixados pelo passador em França e as peripécias para chegar a Paris, onde são confrontados com a realidade dos bairros de lata e a discriminação, mas sem se deixarem abater e sempre com esperança de uma vida melhor. Inspirado na história do seu pai, que também se chama Mário, Olivier Afonso traçou a trajetória de muitos portugueses em França, mesmo se alguns episódios são difíceis de contar.
"Eu quis ser honesto com o que escrevi. A uma altura o meu pai contou-me que antes de começar a trabalhar nas obras, quando chegou a França, um homem verificou os músculos dele, os dentes. Como se fosse um animal ou um escravo. Perguntaram-me se queria mesmo incluir isso no livro e eu disse que sim, claro! É a verdade", declarou.
Foi também a escrita desta história que permitiu a Olivier Afonso reencontrar-se com as suas próprias origens, já que durante muito tempo não se sentiu nem português, nem francês.
"Eu cresci entre uma cultura que eu aprendia na escola, a cultura francesa, e uma cultura que me era transmitida pelos meus pais. [...] Apercebi-me, ao crescer, que os portugueses eram uma comunidade muito gozada em França. Eu sempre fui grande, portanto nunca me chatearam muito, mas soube recentemente que a minha irmã sofreu muito com isso, assim como amigas que preferiam dizer que eram italianas do que portuguesas", confessou, falando dos constantes estereótipos que associam portugueses às limpezas ou trabalhadores da construção civil.
Hoje, Olivier Afonso diz que há uma evolução desta imagem m França, que este tipo de referências são "moderadas" e que, enfim, os franceses descobrem um povo e um país "magnífico".
Com uma primeira edição de 6.000 livros, o próximo passo para o livro "Les Portugais" é uma tradução em português, de forma a contar também em Portugal a história dos emigrantes em França. O livro vai ser apresentado no dia 04 de fevereiro em Paris, na livrara "Rubriques à Bulles", no 11º bairro, havendo já outras datas previstas na capital, mas também em Bruxelas e na Córsega.