PSD recorre de despacho de Santos Silva com mesmo acórdão que fundamenta recusa
O PSD formalizou hoje o recurso contra a decisão do presidente do parlamento de não admitir o seu projeto de referendo sobre a eutanásia, recorrendo ao mesmo acórdão do Tribunal Constitucional usado por Santos Silva para fundamentar a recusa.
No recurso, os sociais-democratas defendem que a sua iniciativa não viola o princípio constitucional que determina que não podem ser apresentadas na mesma sessão legislativa iniciativas já definitivamente rejeitadas (número 4 do artigo 167.º).
"É certo que, em 9 de junho de 2022, foi rejeitado o projeto de resolução do Chega (...) mas a verdade é que não há qualquer identidade entre esta iniciativa de referendo e aquela que é agora apresentada pelo PSD", defende o partido.
Por um lado, os deputados consideram que "não existe identidade subjetiva" entre os dois diplomas, uma vez que os proponentes são grupos parlamentares diferentes, e, por outro, defendem que "não existe identidade material - de substância - entre uma e outra iniciativa de referendo".
"Desde logo, o teor da pergunta proposta em ambas as iniciativas não é o mesmo", salientam, realçando que a questão do PSD versa sobre "o novo quadro legislativo que se pretende aprovar relativamente à morte medicamente assistida", enquanto a do Chega incide sobre a continuidade do quadro legislativo em vigor que impede a morte medicamente assistida.
Para os deputados do PSD, "a diferente formulação das perguntas entre uma e outra iniciativa de referendo não são, ao contrário do que é afirmado no douto despacho recorrido, 'diferenças simples de pormenor'".
"São diferenças substanciais que tornam evidente e manifesto que a pergunta contida projeto do PSD tem um sentido prescritivo muito diverso da que constava do projeto do Chega", dizem, acrescentando que "até a definição do universo eleitoral não é a mesma".
O PSD sublinha que "o critério decisivo para aferir se há ou não desrespeito" pela norma constitucional "é precisamente o da identidade de sentidos prescritivos, como aliás reconhece o douto Despacho recorrido".
O PSD cita, a este propósito, os constitucionalistas Jorge Miranda e Rui Medeiros: "O que conta é a identidade de sentidos prescritivos, de normas que se propõem sucessivamente (conquanto haja aparentes variações verbais); o que a Constituição proíbe é que a Assembleia venha deliberar sobre um projeto ou uma proposta de lei com certo conteúdo normativo depois de já ter rejeitado, na mesma sessão legislativa, projeto ou proposta de idêntico conteúdo".
A este propósito, o PSD recorre ao acórdão do Tribunal Constitucional de 2005, também citado por Augusto Santos Silva no despacho de não admissão, e que incidia no caso sobre propostas de referendo sobre a Interrupção Voluntária da Gravidez.
"Se houver, porém, diferença substancial de conteúdo preceptivo, a razão de ser da proibição do artigo cessa e esta não será aplicável", citam, dizendo que se conclui "sem margem para dúvidas" que a iniciativa do PSD não viola nem a Constituição nem a Lei Orgânica do Regime do Referendo.
O PSD defende ainda que o seu projeto foi apresentado "em circunstâncias significativamente diferentes daquelas que fundaram a rejeição" da iniciativa do Chega, uma vez que só a dos sociais-democratas incide sobre o texto final que vai a votos na sexta-feira.
"O senhor Presidente da Assembleia da República já admitiu projetos de lei cujo teor era idêntico a outros rejeitados na mesma sessão legislativa com o argumento de ter sido apresentado 'em circunstâncias significativamente diferentes daquelas que fundaram a rejeição dos projetos de lei de idêntico teor'", referem, citando em concreto um despacho em que Santos Silva admitiu uma iniciativa do Chega sobre alterações ao IVA, depois de terem sido rejeitados projetos do PCP e IL sobre a mesma matéria.
"Em quarto lugar e último lugar, não pode constituir critério para aplicação da norma constitucional prevista no n.º 4 do artigo 167.º da Constituição a mera identidade da matéria da iniciativa - referendo à morte medicamente assistida", afirmam, considerando que tal seria "uma compressão desproporcional e injustificada do poder de iniciativa dos Deputados, bem como do poder legislativo da própria Assembleia da República".
Por estas razões, o PSD conclui que o seu projeto de resolução "não é inconstitucional, já que não constitui a renovação de iniciativa de referendo definitivamente rejeitada na mesma sessão legislativa", apelando a que seja admitido, num recurso que terá de ser votado em plenário.