‘Bloom’ que vem de longe
Há mais de uma década que a substância anda nas notícias pelas piores razões
Não é verdade que uma “nova droga” ande a enlouquecer os jovens na Madeira. Infelizmente, o ‘bloom’ vem de longe, já deu cabo de muita boa gente e anda nas nossas notícias há mais de uma década. Logo, o que nos tira o sono não são os vídeos virais mais recentes ou a exploração mediática da insegurança crescente, mas sim os anos de alienação e de relativização de fenómenos que, não sendo debelados a tempo, ganham proporções inimagináveis. A 28 Maio de 2011 o DIÁRIO revelava em manchete o desespero do Governo Regional que pedia ao Ministério Público ajuda para travar as drogas legais. O fenómeno do ‘bloom’, que não constava da lista de substâncias proibidas, começava a ser alarmante. No arranque desse ano 30 jovens já tinham ido às Urgências e 6 acabavam internados. Depois, o drama atingiu contornos nunca vistos. Há 10 anos, no nosso balanço a 2012, há uma passagem eloquente que talvez seja terapêutico recordar: “O que também esgotou, pelo menos nas prateleiras das ‘smartshops’, foi o ‘bloom’ e outras drogas sintéticas de efeito semelhante, cuja venda foi ilegalizada no dia 1 de Novembro, através de um Decreto Legislativo Regional... De Janeiro a Novembro, morreram quatro pessoas, 190 foram internadas na Casa de Saúde de São João de Deus e um sem número continua a sofrer problemas graves como esquizofrenia, psicoses e insuficiências renais e hepáticas.
Pelo hospital, chegaram a passar mais de 20 pessoas por dia, com episódios de alucinação que provocaram, em alguns casos, grande alarme social. Há o caso do homem que ameaçou atirar-se de uma ponte. O do jovem que agrediu com violência um taxista, por este recusar-se a transportar um rebanho imaginário de ovelhas. Ou o do ‘ninja’, que atravessou ‘meia ilha’ em contra-mão na via rápida, depois de ter lançado o pânico em Machico, onde apareceu na praia armado de facas e sabres. Os dramas familiares e as preocupações dos pais foram subindo de tom, à medida que mais casos e consequências iam sendo conhecidos. As lojas - no início do ano, existia apenas uma - multiplicaram-se como cogumelos, e a pressão da opinião pública foi tanta que o Parlamento Regional aprovou uma lei a proibir a venda”.
Já na altura, quase todos os dias eram descobertas novas substâncias, muitas vezes alterando apenas uma molécula, tornando moroso o processo de ilegalização. Por isso, vir agora dar como novo o que perdura, talvez porque não foi resolvido com mestria pela Nação, é branquear anos de omissões e de mortes, de brandos costumes e de permissividade. Contudo, os mais distraídos e os mentores da generalização abusiva dos efeitos nefastos de uma substância com cadastro na Região podem ainda prestar um importante serviço público, por via da abordagem mais focada nos aspectos legais que complicam o combate e dificultam a cura. Cada um é que sabe o papel que quer desempenhar nesta extenuante cruzada contra aquilo que começou, manhosamente, a ser vendido como fertilizante para plantas. O nosso e o de outras forças atentas aos riscos foi feito na altura certa. E apesar de termos sido ameaçados e tratados como inimigos, abrimos os olhos a muita gente e salvámos vidas.