Não gostamos de futebol?
É melhor um do que nenhum clube regional no topo do futebol
Há uma ideia generalizada de que todos gostamos de futebol. O desporto rei atrai multidões e fanatiza muitos dos seus apaixonados. Há estádios cheios de adeptos que, antes que tudo, querem assistir à vitória da sua equipa. Repetem semanalmente a romaria esperando um regresso a casa com alegria.
Há países fantásticos no jogo da bola que proporcionam, juntamente jogadores e adeptos, momentos únicos de emoção, adrenalina e absoluta incerteza sobre o resultado. Espectáculos únicos.
Em Portugal não é assim! Igual na Madeira!
Inglaterra, França, Alemanha, Espanha, Itália e Holanda, criaram um negócio multi-bilionário do futebol baseado em regras simples: equilíbrio nos jogos, árbitros sem suspeita, clubes que são autênticas empresas e administradores que não se vêem nem ouvem. Apenas são referenciados os treinadores e jogadores.
É tudo uma questão de resultado... financeiro. E esse não tem a ver com o final de cada jogo. Tem a ver com atitude, ambição e sustentabilidade do clube.
Por isso em Manchester existem mais de quarenta clubes de futebol. Cada um com a sua história e ambição de voltar ao topo. O Manchester United e o Bradford City, em extremos opostos mas com iguais lotações esgotadas. Um tem oitenta mil adeptos no estádio e o outro cerca de vinte e cinco mil. Cada um tem a dimensão que tem, mas, há vinte anos, ambos jogaram, lado a lado, na mesma Premier League. O sonho é voltar a esse confronto, nunca desistir e, principalmente, nunca ser adepto do clube/rei da região. Cada um é do seu e mais nenhum.
Birmingham tem uns cinco ou seis clubes nas duas primeiras Ligas. Londres uma enormidade deles. Todas as cidades de envergadura têm dois, três ou mais clubes. Em diversos escalões mas diferenciando-se por muito pouco. É um sobe e desce.
Quando estudei em Inglaterra, Exeter 1970, vinha a Londres para ir ao futebol com o Senhor Camacho, madeirense dono de um pequeno hotel junto ao Albert Hall. Estes dois nacionalistas iam ver o Chelsea, clube daquela área de Londres. Tinha ganho um campeonato (1950) e acabado de conquistar uma taça de Inglaterra. O Belenenses lá do sítio. Só que, nos trinta anos seguintes, tornou-se num dos mais ricos e poderosos clubes do mundo. Um estádio velho, de média dimensão, onde não se consegue uma cadeira disponível. Continua igual. O investimento foi na equipa. Rendeu e rende milhões.
O bilionário Abramovich investiu na equipa e nem um novo camarote fez para si próprio.
Aqui é ao contrário. Os adeptos do Nacional e do Marítimo não estão para esperar esse tempo todo por umas vitórias. Preferem ser do Benfica, Porto ou Sporting, ser campeão algumas vezes, que esperar por um dia de glória do seu clube regional.
E nem o facto de o Marítimo ter sido Campeão de Portugal, em 1926, e ido a duas finais da Taça, e o Nacional, por duas vezes ter sido quarto na primeira Liga, mudou fosse o que fosse. É preciso ganhar muito mais. Esse palmarés não é suficiente para justificar amor exclusivo ao clube da Ilha natal.
Dois factores são determinantes:
1 - haver dirigentes eleitos em vez de proprietários. Só quem não tem responsabilidades financeiras de qualquer natureza é que administra com tanto desprezo pelo dinheiro dos sócios. Nos países acima referidos, prejuízos fazem os seus proprietários perderem dinheiro, por isso… nunca perdem. Por sua vez, lucros proporcionam reinvestimentos na equipa para valorizar o património (clube). Uma gestão calculista e séria faz perceber a qualidade do caminho e a ambição do resultado. Não há truques nem segredos. É muito transparente.
Tudo o que não é por cá.
Imaginam como não estaria, neste momento, Rui Fontes se o Clube fosse dele? Teria comprado o Marítimo a Carlos Pereira, no pressuposto que para mandar era preciso ser dono? E os que agora contestam estariam disponíveis para comprar o clube? Não acredito!
Tudo isto só acontece porque é à borla. Melhor dizendo, com o dinheiro dos outros. Dos que mandam o dinheiro é zero, como é nulo o respectivo risco financeiro.
Se se irritarem amanhã, desaparecem e o mal foi… batatas. Para eles, não para o clube.
No meu Nacional nada é diferente nem melhor. Basta dizer que a nova e moderna bancada da Choupana, não fez atrair mais público. Fora o jogo com o Atlético de Bilbau todos os espectadores cabem na bancada antiga. Palco épico que terá provocado o deslumbramento.
Mas era só preciso ter bom senso para aceitar que o investimento global no Clube ia reduzir as disponibilidades financeiras, com isso as equipas seriam piores, os resultados desanimadores e, rapidamente, caberíamos num cantinho do estádio.
2 - o erro assassino foi gastar dinheiro em estádios, puras fantasias de quem não põe dinheiro seu. Em vez de investirem em equipas que fossem rentabilizadas, provocassem crescimento do negócio e arrastassem mais pessoas, o que fizeram foi gastar estupidamente dinheiro público, próprio de um novo riquismo governamental que não fazia contas e que comprava tudo e todos.
Dar o mesmo ao União e ao Marítimo, para ser desbaratado como quisessem, é “crime” indesculpável. E por aqui me fico, para não me arrepender.
O estádio devia ser o dos Barreiros e não era preciso mais nenhum. Tinham poupado no investimento e a manutenção era muito reduzida. Ficavam disponíveis para investir no negócio. E campos de treino fazem parte do negócio.
Fazer um estádio no meio dos pinheiros e do nevoeiro só para quem não quer público. O Nacional é o único clube do mundo que não tem adeptos do bairro onde está. Porque pura e simplesmente não há bairro.
É por tudo isto que o Chelsea tem grandes equipas e um velho estádio. Novos estádios próprios, em Inglaterra, há os do Arsenal, Manchester City, Tottenham e Brighton. O resto vão melhorando sempre que possível. Ou alugam. Dinheiro é na equipa. No estádio o mínimo. Ainda há estádios com colunas de suporte da cobertura entre a bancada e o relvado.
Na Madeira, luxuosos estádios e fracas equipas.
Obviamente quem pagou e está a pagar tudo isto somos nós todos com os nossos impostos. Culpado: quem disse que oferecia e pagou.
Entretanto, o dinheiro público foi desviado para outras prioridades e hoje é escasso para um orçamento de clube digno do topo nacional. Os sócios pagam o que podem, as empresas são débeis e fracas patrocinadoras, a televisão dá bom dinheiro ao Marítimo, o único com audiência razoável, e a receita total não é suficiente. Dos mais baixos orçamentos na primeira Liga onde, no Continente, já abundam investidores. O Braga acaba de vender mais de 20 % da sua SAD ao Paris Saint Germain.
Mas dá muito trabalho e maçada. Candidatam-se aos lugares com proveitos. Não compram nem investem seja o que for. Gerem o dinheiro do governo e da televisão. Estão ali para receber e contratar quem faça o trabalho.
Agora que o dinheiro público está a minguar devem estar de saída. Acabou o que era bom.
O presidente do meu Clube, há dias, quando em último lugar e depois de afirmar que o objectivo era a simples manutenção, veio corrigir para subida à primeira Liga. Pudera! Tinha comprado um contentor de catorze novos jogadores. Três num só dia. Nos próximos dois ou três anos não terá espaço financeiro para mais contratações. Deve estar de saída. Basta ler o que diz. Sem dinheiro não lhe interessa.
Sendo assim, para o comum dos adeptos, é mais fácil e confortável ser dum grande português que intervir e se chatear com o seu amor regional. É vê-los nos jogos na Madeira, apoiando o “seu” clube continental, já que a perda desses três pontos pode ser fatal para vencer o campeonato. É reconhecê-los nos seus lugares cativos nos estádios de Lisboa e Porto.
Nunca dei com inglês que fosse de outro clube que não o da sua cidade ou vila. Ajudam-no a ser o maior possível e não traem as origens.
Por aqui, tudo vai de mal a pior. Os clubes definham e os seus dirigentes não garantem futuro próspero. Só se o governo regional pagar. Cada vez mais haverá benfiquistas, sportinguistas e portistas.
Em Maio próximo a Avenida do Mar encher-se-á de bandeiras vermelhas com águia da vitória. Ou com dragão.
Uma coisa parece certa: não contem com o governo regional para novas loucuras futebolísticas. A torneira está fechada. Podem ir embora.
Clube Único
As pessoas esquecem que o clube único de Alberto João Jardim chamava-se Marítimo, tinha as cores azul e amarelo e, o emblema, seria o do Nacional. Uma aberração. O erro histórico foi não fazer um clube novo, o Clube de Futebol da Madeira. Sem dinheiro os clubes regionais estariam sem capacidade de continuar competição nacional. Hoje seríamos, claramente, o quarto maior clube português. Arrepia-me Jardim ter erradamente avaliado a realidade de então, mesmo com os clubes dirigidos por fortes personalidades do PSD: Nélio Mendonça, Rui Fontes e Jaime Ramos. Um erro para a História.
É melhor um do que nenhum clube regional no topo do futebol nacional.