Detidas centenas de pessoas por apelarem para protestos no Egipto
Centenas de pessoas foram detidas nas últimas duas semanas no Egito por instarem à realização de manifestações durante a 27.ª Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (COP27), que decorre em Sharm el-Sheikh até 18 de novembro.
A denúncia foi feita pela Amnistia Internacional (AI) num comunicado hoje divulgado, sublinhando que estas detenções recordam "a triste realidade da política egípcia de detenção arbitrária em massa para silenciar a dissidência", já que elas ocorreram no centro do Cairo e de zonas movimentadas de outras cidades egípcias, com base no conteúdo dos telemóveis dos transeuntes.
Pelo menos 151 desses detidos "estão neste momento a ser investigados pela Procuradoria Suprema de Segurança do Estado, ao passo que centenas de outros foram sujeitos a períodos de prisão e interrogatório mais curtos", precisou a organização não-governamental de defesa dos direitos humanos no comunicado.
"A detenção de centenas de pessoas simplesmente por serem suspeitas de apoiar a convocação de protestos pacíficos suscita graves preocupações relativamente à forma como as autoridades reagirão perante pessoas que pretendam manifestar-se durante a COP27 -- uma característica fundamental de qualquer conferência da ONU sobre o clima", sublinhou o diretor de Investigação e Defesa da AI para o Médio Oriente e o norte de África, Philip Luther, citado na nota de imprensa.
"As autoridades egípcias devem permitir que manifestantes pacíficos se concentrem livremente e abster-se de fazer uso de força ilegal ou detenções arbitrárias para impedir protestos", defendeu o responsável.
Segundo Philip Luther, "os líderes mundiais que estão a chegar a Sharm el-Sheikh para a COP27 não devem ser iludidos pela campanha de relações públicas do Egito: longe dos deslumbrantes hotéis de luxo, milhares de pessoas, incluindo defensores dos direitos humanos, jornalistas, manifestantes pacíficos e opositores políticos continuam a ser injustamente detidos".
Por essa razão, prosseguiu, os dirigentes mundiais "devem instar o Presidente Abdelfattah al-Sissi a libertar todos aqueles que foram arbitrariamente detidos por exercerem os seus direitos humanos" e, acrescentou, "por uma questão de urgência, tal deve incluir o ativista preso Alaa Abdel Fattah, que hoje agravou o seu protesto, passando de greve da fome para parar também de beber água".
Também o antigo candidato presidencial e líder partidário Abdelmoneim Abulfotoh corre riscos de saúde na prisão, bem como os advogados Hoda Abdelmoniem e Mohamed Baker, que continuam presos apenas pelo trabalho que fazem em defesa de vítimas de violações dos direitos humanos.
As autoridades excluíram amplamente desta política de repressão todos quantos se pensa pertencerem ou estarem de algum modo ligados à Irmandade Muçulmana.
De acordo com a Amnistia, no período imediatamente anterior ao início da COP27, a 06 de novembro, naquela estância balnear egípcia, "as autoridades libertaram 766 prisioneiros, na sequência de uma decisão do Presidente al-Sissi de reativar uma Comissão de Perdões Presidenciais (PPC) em abril".
"No entanto, durante o mesmo período, a Amnistia Internacional documentou a detenção do dobro desse número de pessoas: 1.540 pessoas, que foram interrogadas sobre o exercício da liberdade de expressão e associação", indicou a organização.
Todos estes dados foram coligidos nos últimos seis meses pela AI com base em testemunhos de dezenas de advogados que regularmente estão presentes em interrogatórios e audiências de prolongamento de detenções, revisão de decisões judiciais e outros documentos oficiais e entrevistas a ex-prisioneiros e familiares de detidos.
E mesmo aqueles que foram libertados após a reativação da PPC continuam a enfrentar restrições à sua liberdade de expressão e de movimentos: sete pessoas recentemente libertadas disseram à Amnistia que a Agência de Segurança Nacional lhes tinha ordenado que removessem o conteúdo crítico que tinham publicado nas redes sociais e ameaçou detê-las novamente quando a COP27 terminasse.
Algumas pessoas que não acataram essa ordem já foram novamente detidas, como Sherif al-Rubi, um ativista libertado em junho e que voltou à prisão em setembro, depois de conceder uma entrevista à imprensa sobre as dificuldades que os ex-prisioneiros enfrentam. Outros recentemente libertados continuam sob vigilância policial, enquanto muitos deles estão arbitrariamente proibidos de viajar.
A página da internet da Presidência egípcia para a COP27 indica que quem quiser organizar protestos em Sharm el-Sheikh deve informar as autoridades com 36 horas de antecedência e mostrar à organização um crachá da COP27.
Os protestos só serão autorizados entre as 10:00 e as 17:00, numa zona distante do local onde decorre a conferência e vigiada por câmaras. As autoridades também limitaram o conteúdo dos protestos a questões relacionadas com o clima, referiu a AI.
"A Amnistia Internacional considera estas medidas desnecessárias e desproporcionais, destinadas a restringir a possibilidade de as pessoas protestarem em segurança de uma forma que lhes permita serem vistas e ouvidas", sustenta a organização, frisando que "as autoridades devem assegurar-se de que as exigências de notificação apenas são usadas para facilitar os protestos e não implicam uma autorização e abster-se totalmente de dispersar ou de outra forma reprimir quaisquer protestos que não cumpram aquele requisito".
A organização denunciou ainda que "também foram adotadas medidas arbitrárias e desproporcionais contra os cidadãos egípcios, tendo as autoridades instaurado a obrigatoriedade de apresentação de passes e reservas de hotel para limitar o acesso àquela estância balnear, além de que os próprios egípcios que trabalham em Sharm el-Sheikh estão também severamente limitados nos seus movimentos".