Os expulsos da cidade
Importa despertar para a gravidade das políticas de incentivo à especulação imobiliária e à segregação residencial na cidade, promovidas pelos governantes, que, ao fomentarem a remoção do povo da cidade, estão a ampliar as consequências negativas do empobrecimento, tão sentido por tanta gente na Região Autónoma da Madeira.
Aparentemente, a propaganda sobre a reabilitação de imóveis ou de zonas da cidade parece indiciar algum altruísmo ou alguma boa vontade da parte de quem se prontifica a “reabilitar”. Porém, é um processo indesligável do problema do agravamento da exclusão social. A reabilitação aproveita-se do empobrecimento de crescentes camadas sociais e intensifica-se com a segregação residencial na cidade. Em nome de uma dita reabilitação urbanística, estão a ser excluídas para as ultraperiferias as populações com menores rendimentos.
Estamos em presença de uma dupla forma de penalização social de quem está a empobrecer. Quem empobrece, para além de não ter meios para responder à especulação imobiliária, é expulso para as periferias. E este é um perverso mecanismo de segregação social e de desintegração dos sectores populares que eram do centro da cidade.
Os ainda-não-pobres estão a ser pontapeados para fora da cidade em processos de segregação residencial. Nestes processos de empobrecimento, na decorrência do aumento do custo de vida e da crescente desigualdade social, resulta que tanta gente não pobre está a ser impelida para lugares sociais estranhos, para sítios de exclusão, nas periferias.
Não nos opomos à revalorização de áreas do centro urbano ou de “centros históricos”. Contestamos a expulsão do povo da cidade. Nada nos move contra os esforços de revitalização urbana, nem contra o potenciar da vocação turística da cidade. O problema está na exclusão, no processo de segregação que favorece a elitização. A questão essencial radica em quem deixa de poder continuar na cidade. É que tanta gente a todo o custo quer permanecer ou regressar ao seu chão de pertença na cidade, mas que, por desvantagem económica, é pontapeada para fora do seu lugar de memória e de identidade nesses territórios.
Em face dos incentivos à especulação imobiliária facultada pelos governantes, através do financiamento à fixação de sectores socio económicos médios ou altos na cidade, importará perceber que, inerentes a estes processos de segregação social, estão em curso desastrosas dinâmicas, a médio prazo, de conflitualidades e de ruturas sociais.