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Transportes: em política não basta (a)parecer

A Região Autónoma da Madeira não pode ficar à margem, sob pena de perder poder de atracção

O Regulamento (UE) n.º 1315/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho relativo às orientações da União para o desenvolvimento da Rede Transeuropeia de Transportes - adiante RTE-T - encontra-se num processo de revisão, cuja proposta a Comissão já enviou ao Parlamento, sendo neste momento alvo de negociações entre grupos políticos.

É de crucial importância para a transição energética e diminuição de emissões, complementando outras propostas legislativas do pacote Fit For 55, como o Combustível Sustentável para a Aviação (Refuel EU Aviation) e para o Transporte Marítimo (Fuel Maritime), Infraestruturas para Combustíveis Alternativos (AFIR) e o Sistema de Comércio de Emissões da UE (ETS), apenas para nomear alguns.

Para além de procurar promover uma utilização e gestão eficientes do sistema de transportes da União, a RTE-T tem por objectivo eliminar barreiras ainda existentes entre países através da definição de corredores multimodais, que permitam uma abordagem coordenada entre Estados-Membros, quer ao nível das infraestruturas, quer ao nível dos sistemas de gestão.

Mas a RTE-T é também um instrumento de coesão territorial, económica e social. Uma boa rede de transportes aproxima os cidadãos europeus dos centros de decisão, permitindo que zonas periféricas quebrem o seu ciclo de isolamento. É, por isso, fundamental fazer parte da rede principal de transportes para captar financiamento comunitário.

Como se compreende, as regiões ultraperiféricas como a Madeira são detentoras de infraestruturas que podem, e devem fazer parte da rede principal, como forma de captar investimento e serem competitivas numa lógica de transição energética, relativamente à qual a Região Autónoma da Madeira não pode ficar à margem, sob pena de perder poder de atracção face a outros destinos, ou de ver as suas importações e exportações de mercadorias fortemente oneradas, com implicações directas na subida de preços junto do consumidor final.

Neste contexto, e tendo em conta as propostas legislativas para o combustível sustentável para a aviação e para o transporte marítimo, é importante que estas contemplem derrogações que permitam um período de adaptação justo e necessário para as regiões ultraperiféricas, com pequenas economias de escala. Mas derrogar não deve significar exclusão deste processo de transição, sob pena de ficarmos para trás.

É crucial que a União Europeia compreenda estas singularidades das RUP - e o PSD no Parlamento Europeu de tudo tem feito para que esta mensagem e posição política passe e para que juridicamente o artigo 349.º do TFUE seja devidamente contemplado nas propostas legislativas -, porque são regiões com necessidades próprias, que não devem comparar-se com nenhuma outra região europeia.

O Sistema de Comércio de Emissões (ETS) é um outro exemplo, nomeadamente o ETS para o sector marítimo. Sabemos que os portos são a principal porta de entrada e saída de mercadorias das RUP. Não existe uma alternativa viável do ponto de vista económico. Querer aplicar taxas a este meio de transporte é desconhecer a realidade e obrigar as populações locais a pagar ainda mais pelos produtos que consomem, inclusive os de primeira necessidade.

O PSD tem sido firme na reivindicação de uma isenção de 100%, pelo menos num período transitório até os combustíveis sustentáveis ganharem escala de produção. Fomos capazes de convencer o deputado alemão do PPE – negociador principal - para o carácter justo desta reivindicação. Infelizmente, o homólogo do Grupo S&D (do qual faz parte o PS), tem-se revelado intransigente, apenas considerando uma isenção de 55%.

Como afirmei aquando da votação em plenário, este valor, sendo melhor que a proposta inicial da Comissão Europeia, não nos serve (à Madeira) e não é justo. É importante que nas negociações com o Conselho, o Parlamento ceda e adopte a posição do primeiro - que contempla a isenção total -, mas, para que isso aconteça, é crucial que os Socialistas deixem de ser um obstáculo.

Defender as RUP tem de ser muito mais do que um post nas redes socais, ou uma notícia de jornal anunciando, com pompa, um rol de boas intenções. É, acima de tudo, manter-se firme quando tal se exigir, afrontando poderes instalados, mesmo que isso implique o desconforto de afrontar o seu próprio grupo político, quando em causa estiver o supremo interesse de quem nos elege.