Análise

Compromissos de Advento

Importa agir já se é que queremos festas felizes e com gestos diferenciadores

O calendário litúrgico propõe, a partir de hoje, um Tempo de Advento que visa preparar os corações daqueles que acreditam para a celebração autêntica do Natal, desse momento de encontro com o essencial e de entrega às grandes causas, capaz de gerar gestos de boa vontade, esperança e gratidão. A condição humana carente de um plano redentor a vários níveis tem assim uma oportunidade sublime de fazer diferente, por vezes o que ainda não foi feito, se é que quer festas felizes. O bispo do Funchal sugere que cuidemos daqueles que, talvez bem ao nosso lado, possam ter uma quadra natalícia mais difícil e, também por isso, sugere um “gesto diocesano de renúncia que ajude a reconstrução do Santuário do Terreiro da Luta, cujas obras já começaram”.

Não duvidamos da importância da dádiva colectiva para um espaço que D. Nuno Brás julga ser “um verdadeiro convite à paz”, mas propomos outros caminhos, também para a Igreja peregrina na Região, na última semana entretida com polémicas públicas em torno da veneração de relíquias, geradoras de discórdia entre padres e de opiniões contraditórias entre os fiéis, argumentações que dizem muito sobre a (des)atenção aos sinais dos tempos por parte de uma instituição com responsabilidades acrescidas na sociedade em que se insere, e que não podem estar confinadas a questões doutrinais, a anacrónicos rituais e a outros expedientes banais.

Propomos ainda um Advento de compromisso com a qualidade de vida dos madeirenses por parte dos decisores, hábeis na justificação célere das lacunas indesmentíveis, mas pouco ágeis na resolução efectiva, a tempo e horas, daquilo que na economia, na justiça, na saúde, na educação, na banca, no ambiente, na segurança e na gestão dos dinheiros públicos contribui para o desespero, para a incerteza e para a manifesta perda de direitos, liberdades e garantias. Precisamos de menos comentário e mais influência, menos comunicados e mais acção, menos problemas e mais soluções, menos ontem e mais amanhã.

Propomos também um calendário de Advento com dimensão humana e solidária, capaz de libertar do sufoco permanente e angustiante famílias perdidas com contas que não conseguem pagar, mesmo que trabalhem com dignidade e dedicação. Sabemos que para muitas o Natal de cada dia é miragem, sobretudo quando o suor de cada rosto apenas garante salários miseráveis, ansiedade doentia e tristeza compulsiva.

Num contexto de deriva preocupante, mais do que dar peixe, importa partilhar ferramentas e estratégias com todos quantos queiram aprender a pescar. Ou seja, mais do que dar os tradicionais cabazes, que devem estar reservados ao casos comprovadamente urgentes, convém formar para o futuro e gerar oportunidades de emprego ou então assegurar o passe social enquanto houver crise e o pagamento da factura energética durante determinado período.

Certos que alguns parceiros do DIÁRIO serão cúmplices desta iniciativa, desafiamos as instituições que tenham identificadas as necessidades específicas de apoio que nos contactem de modo a que possamos ver como satisfazê-las.