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Novembro

Estamos em Novembro, com o dealbar de mais um ano já ali ao virar da esquina, tempo propício a balanços do tempo que passou, tempo a acrescentar, inevitavelmente, idade.

A acreditar, e hoje em dia saber no acreditar é uma arte ao alcance de muito poucos, naquele velhinho apotegma popular que reza ser a idade um posto que dá estatuto, temos uma geração, das maiores que temos visto em número dos seus constituintes, cheia de estatutos, vá lá, chamemos-lhes assim!

Tenho um amigo que uma vez disse que os números mais importantes, em termos de poder ter alguma liberdade nas asneiras que se podem soltar, são o 6 e 66: até aos seis anos podemos dizer o que bem nos vem à cabeça que o mais que alguém dirá é – coitadinho ainda não sabe o que diz, e o sessenta e seis, idade a partir da qual também é possível dizer o que bem nos vem à tola, que o mais que alguém dirá é – coitado, já não sabe o que diz.

Tentando, apesar da idade (já passei os 66 e imagino o chorrilho de críticas que vêm por aí abaixo!), analisar se é de facto assim, direi que sim e não.

A idade confere estatuto a quem o pode e merece ter, mas também pode ser um factor condicionante a uma relativa perda do mesmo. Vejamos dois exemplos concretos, ambos madeirenses:

Cristiano Ronaldo, um prodígio no futebol, considerado o melhor jogador do mundo por várias vezes, foi criando, com justiça, um estatuto difícil de igualar, que foi crescendo conforme se passavam os anos e enquanto mantinha intacta a sua enorme capacidade de grande atleta e jogador de futebol. Com a idade a avançar, convenceu-se, ou convenceram-no, que o estatuto dava-lhe o direito de fazer tudo o que bem lhe desse na real gana. Como ainda está dentro daquele intervalo que vai dos 6 aos 66, aconteceu o que não esperava – perdeu estatuto. Dificilmente recuperará. Não é impossível, mas será difícil. Quando deixar de ser útil, veremos.

O Cardeal D. José Tolentino de Mendonça, foi criando estatuto enquanto crescia e, à medida que a idade avançava o estatuto de grande pensador, de grande poeta, de pessoa sabedora, professor de quem quer aprender, foi-se agigantando, cá dentro e lá fora, na hierarquia da Igreja a que pertence por opção. Cada vez que fala, acrescenta estatuto, que vai também crescendo enquanto a idade avança (o “nosso” Cardeal tem, para além da idade e do estatuto, uma outra característica que poucos se podem orgulhar de ter, como veremos adiante).

O estatuto da idade, não é, como diz o adágio, algo que venha automaticamente só porque os anos passam. Há estatutos que se acrescentam, porque quem o tem, acrescenta à idade o saber, o conhecimento, a sabedoria da experiência vivida e, principalmente, transmitida. Ficarmo-nos pelo estatuto que fomos eventualmente granjeando enquanto passavam os anos, se não transmitirmos, se não passarmos o que experimentámos, com a idade passamos a ser velhos ou mais velhos sonhando com um estatuto que na realidade não temos.

Um outro exemplo, recente: o jogador de ténis Roger Federer achou que já não tinha capacidade de manter um nível compatível com o estatuto de melhor do mundo que já tinha ostentado, e retirou-se dos circuitos de ténis que habitualmente competia. Acrescentou estatuto e credibilidade à idade que vai passando.

Aliar estatuto à idade traz consigo, muitas vezes, um outro parâmetro, este mais difícil de alcançar e que não está, seguramente, ao alcance de muitos, quer dizer, está ao alcance de muito poucos – classe!

Um exemplo, mais um, porque é nos exemplos que devemos procurar guias para que a idade possa trazer estatuto por forma a cumprir-se o que a sabedoria popular diz, é o recentemente falecido Professor Doutor Adriano Moreira. Tinha o estatuto que conquistou durante a vida, que se foi reforçando com a idade, aos quais juntou uma classe pessoal que muitos almejam e poucos conseguem ter.

Esta é uma combinação ainda mais rara, alcançada só por alguns que, tal como cantou Camões:

E aqueles que por obras valerosas
Se vão da lei da morte libertando
Cantando espalharei por toda a parte,
Se a tanto me ajudar o engenho e arte
e como Amália que, com a classe que lhe era reconhecida, cantando Camões elevou ainda mais o seu estatuto.

A idade pode ser um posto, mas só com trabalho vem o estatuto e, ter classe, é um privilégio de poucos. Juntar a idade ao estatuto e à classe só é possível àqueles que se vão da lei da morte libertando.

P.S. – O campeonato mundial de futebol não poderia ter sido atribuído ao Qatar, mas esqueçamos isso, Presidente dixit. Adiante. O que não entendo é porque cargas de água vai o País enviar o Presidente acompanhar a selecção. Ah, já sei – esqueçamos isso e fica tudo explicado. A perder estatuto (e classe), Senhor Presidente.