TdC aponta falta de rigor das medidas de combate ao impacto económico da pandemia
As necessidades decorrentes do impacto económico da pandemia "não foram determinadas com rigor" pelo Governo, faltando informação sobre as medidas extraordinárias tomadas e "transparência" e "escrutínio" públicos quanto à sua eficácia, concluiu o Tribunal de Contas (TdC).
"Não foram determinadas com rigor as necessidades decorrentes do impacto adverso da pandemia", sustenta o TdC numa auditoria que avaliou se a reação ao impacto negativo da pandemia foi adequada para assegurar a recuperação da economia, através do exame da eficácia das 24 medidas identificadas pelo Ministério da Economia e da Transição Digital (METD) para o efeito.
Salientando que a redução de 7,6% do Produto Interno Bruto (PIB) português, em termos reais, em 2020 foi "mais acentuada do que na média dos países da área do euro (6,6%) e mais expressiva do que a prevista no Orçamento Suplementar (6,9%) em junho de 2020", o Tribunal nota que, contudo, só foi "gasto com as medidas de reação à pandemia menos de 10% (98 milhões de euros) da despesa orçamental do Programa Orçamental Economia (1.006 milhões de euros)".
No relatório, hoje divulgado, o TdC considera ainda que "a informação prestada sobre as medidas extraordinárias não foi completa, nem suficiente, não tendo promovido a responsabilização, a transparência e o escrutínio públicos quanto à eficácia dessas medidas em atingir os seus objetivos e assegurar a recuperação do impacto adverso da pandemia na economia".
"A estrutura existente não se revelou adequada para monitorizar e controlar eficazmente (de forma ativa e tempestiva) as medidas, identificando e quantificando a situação inicial (anterior à pandemia), o impacto adverso da pandemia, a reação a esse impacto adverso e a recuperação desse impacto através da correspondência, para cada medida tomada, entre objetivo pretendido (expresso pela meta a atingir) e resultado obtido", sustenta.
Segundo o TdC, "foram reportados à auditoria 11.008 milhões de euros gastos com nove das 24 medidas de reação ao impacto adverso da pandemia na economia, até 31/12/2021", dos quais "9.091 milhões de euros com responsabilidades contingentes (crédito atribuído pelo sistema financeiro, com garantia pública), 1.409 milhões de euros de despesa, 200 milhões de euros de receita diferida, 185 milhões de euros de empréstimos, 104 milhões de euros de despesa antecipada e 20 milhões de euros com locação".
Ora, considera o Tribunal, "além da insuficiente execução financeira das medidas (84% do previsto), só sete tiveram meta definida e só uma a atingiu, 15 não apresentaram resultados e não foi demonstrada a eficácia das medidas em alcançar os seus objetivos, nem em recuperar a situação inicial (15 por falta de execução, nove porque os seus indicadores não mediam o cumprimento dos seus objetivos e 23 por não ter sido reportada situação inicial)".
Em contraditório, o Ministério da Economia alegou que, "na definição de políticas públicas durante a pandemia, o processo de tomada de decisão tem ocorrido em circunstâncias de elevada incerteza, complexidade e de rápida mudança".
Embora reconheça estas dificuldades, o TdC defende que cabe ao executivo "reduzir os riscos materializados por incompletude e insuficiência da informação reportada, insuficiência do grau de execução e ineficácia das medidas em alcançar os seus objetivos, bem como os demais riscos significativos identificados, nos quais já consta o relativo ao impacto adverso da duração e da extensão do conflito militar na Ucrânia".
Entre estes outros "riscos significativos" identificados pela auditoria está também "a dimensão das responsabilidades contingentes assumidas como reação à pandemia".
"Por agravar a vulnerabilidade das finanças públicas", o TdC considera que "importa divulgar integralmente" estes dados, de forma a "apreciar devidamente a posição financeira do Estado face ao aumento expressivo das responsabilidades pela concessão de garantias públicas, visando a liquidez e a atividade das empresas".
É que, enfatiza, "não obstante este aumento constituir um risco orçamental a divulgar adequada e designadamente na CGE [Conta Geral do Estado], a CGE não avalia o risco destas responsabilidades serem exigíveis no futuro".
Face às insuficiências apuradas, o TdC recomenda ao Governo que promova "a articulação das medidas tomadas como reação ao impacto adverso da pandemia (e a outros impactos adversos extraordinários) na economia com a prossecução do interesse público".
O objetivo é que se garanta que "as necessidades decorrentes de cada impacto adverso sejam determinadas com rigor", "essas necessidades sejam refletidas nessas medidas e nos seus objetivos (expressos por metas)", "o financiamento e a vigência das medidas sejam suficientes para atingirem os seus objetivos" e "as medidas integrem o respetivo programa orçamental (incluindo o seu custo extraorçamental)".
Pretende-se ainda que "a informação reportada sobre as medidas seja integral, fiável e consistente", "a execução das medidas seja tempestiva e objeto de monitorização e controlo adequados" e "as medidas sejam adequadas e eficazes para atingir os seus objetivos (expressos nas metas)".
Também recomendado é que o executivo disponha de "uma estrutura adequada para monitorizar e controlar eficazmente (de forma ativa e tempestiva) as medidas tomadas" e que "identifique e quantifique, para cada medida, a situação inicial (anterior a cada impacto), o impacto adverso da pandemia, a reação a esse impacto adverso e a recuperação desse impacto".
Por sua vez, às entidades gestoras das medidas -- IAPMEI-Agência para a Competitividade e Inovação, AGPOCI (Autoridade de Gestão do Programa Operacional Competitividade e Internacionalização), TF (Turismo Fundos), TP (Turismo de Portugal) e BPF (Banco Português de Fomento) -- o Tribunal de Contas recomenda que concebam e implementem "um modelo de avaliação da eficácia das medidas que disponibilize um conjunto de informações relevantes sobre cada medida".