A idade, a experiência ou o nome que se queira dar a isto de andar por aqui desde o tempo dos desenhos animados na televisão a preto e branco traz agarrada uma dose de desesperança. Quantos sonhos, quantos bons projectos vimos desfeitos em cacos e não foram só nossos. Aconteceu com outros, pessoas inteligentes, cheios de vitalidade que, nem se sabe bem como, foram tragados – eles e os sonhos – pela rotina, por falta de oportunidades ou por terem atirado fora, uma e outra vez, todas as boas possibilidades que lhes surgiram ao caminho.

Eu admito, os anos trouxeram-me um certo desalento e, talvez por isso, as histórias que mais me comovem são as que falam de segundas, terceiras ou quintas oportunidades, de pessoas que, contra o que parecia uma fatalidade, estão de novo em jogo. Pessoas como os 15 finalistas dos cursos de formação de adultos da Escola do Galeão que, daqui por mês, vão estar vestidos a rigor para a benção das capas. Não sei exactamente os detalhes que os levaram a só agora acabar o 12º ano, mas sei, pois contaram-me, como estão felizes.

As aulas têm lugar nos centros comunitários dos bairros sociais, onde uma parte dos alunos vive, num ambiente que é, em muitos casos, hostil à integração e onde a maior luta dos professores é evitar que desistam. O primeiro passo para quebrar o ciclo de exclusão é, como me explicou o diretor de turma, tornar estes finalistas melhores cidadãos e isso não se resolve apenas com um certificado. O papel a dizer que têm o 12º ano irá abrir portas, garantir acesso a empregos diferentes, mas não é apenas por isso que estão tão ansiosos por entrar na igreja dos Álamos.

Os mais velhos estão na casa dos 50 anos e, de certa maneira, entraram naquela idade do desalento, em que se começa a pensar que a vida terá pouco para oferecer, em que já não se espera grandes mudanças. E são eles os mais entusiasmados com a ideia de entrar na igreja com o fato e a capa, os mais orgulhosos. O 12º ano era um sonho posto de parte, algo fora do alcance e, por uma reviravolta do destino, está ali, é de novo possível. Não escondem a alegria, está na cara. Aos 50 o triunfo não se fica pelos próprios: querem oferecer aos pais, aos filhos, aos amigos, aos professores.

Sei que vivemos um momento pouco sensível aos que tropeçam, aos que cometem erros, são tempos pouco generosos. Os apoios sociais são mal vistos, há sempre relatos de quem se aproveita, de mandriões que sobrevivem à sombra dos que pagam impostos e de uma classe média esforçada e que se sente espoliada. De certo haverá verdade em muitas destas queixas, dos desempregados que rejeitam ofertas de emprego, dos excluídos que não querem deixar de ser excluídos. E depois há estas histórias, de quem se agarra às oportunidades e coloca lá todo o empenho, faz o que pode e o que sabe.

Não são heróis, são apenas pessoas atrás de um sonho e isso é bonito, muito bonito seja aos 20 ou aos 50, seja no bairro social ou no condomínio de luxo. Ou talvez seja de mim, que me comovo sempre que alguém tem e vence numa segunda, terceira ou quinta oportunidade.