Das Hespérides
1. Para uns, o eterno mito da Atlântida, naufragado no antanho e quiçá encalhado ainda no presente. Para outros, o Jardim das Hespérides, igualmente mito com a sua eterna árvore e os seus pomos de ouro. E há quem, mais recentemente, olhe para os arquipélagos – Açores, Madeira, Canárias e Cabo Verde -, com as suas dezenas de ilhas, irradiadas entre dois meridianos do oceano Atlântico, e os classifique de Macaronésia, conceito presumidamente biogeográfico, que antecede e transcende Gaspar Frutuoso e a sua obra “Saudades da Terra”, no século XVI.
Em tudo, quando se olha para a Macaronésia, vê-se a intencionalidade geoestratégica a ressignificá-la, ao sabor dos alísios da política, em região intersecionada pelo Atlântico Norte (quase Europa e América) e pelo Atlântico Médio (quase Europa e África), quando não, à ordem dos fatores de grandes interesses internacionais, em região trans-regionalizada e trans-localizada da América do Norte (costa leste), da Europa Ibérica (costa ocidental) e da África Ocidental.
É também percepcionada como uma multi-região com diásporas, com as suas respetivas comunidades espalhadas pelo mundo, num prospecto babélico e bíblico de mobilidade e transumância antropológica, demográfica e cultural, com pequenos sinais de fogo que, se ajuntados, podem (que potencial não falhe) ser uma venturosa flama de Prometeu.
O que se pode fazer com a Macaronésia? Para além da criação de um espaço de concertação política e de cooperação para o desenvolvimento entre os arquipélagos, quero dizer. Cultura, antes de mais. Poesia. O Encontro dos Poetas da Macaronésia faz sentido. É a iniciativa que faz sentido, por estruturalmente estratégica!
2. O matemático brasileiro Celso José da Costa acaba de ganhar o Prémio LeYa 2022, com o romance “A Arte de Driblar Destinos”. Outro brasileiro, ainda por cima mineiro (para o meu profundo regozijo), o crítico e ficcionista Silviano Santiago venceu o Prémio Camões 2022. Viva a literatura do Brasil! Todavia, para que 2022 seja de facto um ano abençoado, conta-se com a eleição do candidato Lula da Silva a Presidente da República, no dia 30 de outubro. O Brasil democrático, moderno e desenvolvido, que se quer resgatado, não pode ficar de costas voltadas para o futuro. Haja consciência da gravidade da atual situação (corrupção, desigualdade, ódio, violência e negacionismo) e da necessidade premente de driblar destinos. A pestilência, continuada...dá “gastura”!
3. Pode também ser (e, assim, tornando-se título de um livro) “Oráculo para começo de conversa”, com estórias vindas do nada e, com vida própria (fabulazinha de dar gosto), rumo ao infinito. Não que nos enfeitice, ou nos conte do passarinho verde, ou nos lembre um beijo no elevador. Apesar dos insólitos e das paisagens (e nós, aí dentro, sujeitos da História), só o tempo, real, surreal e irreal. Só ele, existencialmente ele, ora interessa...