O Otimismo
No mundo dos ismos, o otimismo fez a sua aparição, não no significado corrente da palavra (encarar as coisas pelo lado positivo, em qualquer circunstância), mas num sentido mais aprofundado, o de conceito filosófico, ou mesmo doutrinário, sinal dos tempos do consumismo, até das ideias.
Nem é nada de novo: já o matemático e filósofo alemão Leibniz, tinha considerado que o Universo, criado por Deus, não podia ser senão perfeito.
Voltaire glosaria este tema na sua célebre obra Candide, ou l´Otimisme, que divertiu e escandalizou a sua época, e as que se seguiram. Nela, o jovem Candide recebe do seu mentor Pangloss a ideia chave resumida na frase “tudo vai bem no melhor dos mundos”. Claro que as suas experiências nas andanças deste mundo, nomeadamente o terramoto de Lisboa, o fizerem mudar de ideias – mas sem afastar completamente a ideia base.
Decerto os grandes decisores deste mundo não têm tempo para recordar Leibniz ou o Candide (se é que os leram), e muito menos para meditar sobre clássicos, como este.
Mas, curiosamente, o Otimismo anda por aí, e em força.
Na previsão do crescimento da economia, na elaboração dos orçamentos, na redução do desemprego, na crise energética, no combate às doenças, e até nas competições desportivas, não faltam seguidores de Pangloss, repetindo o mantra “tudo vai bem no melhor dos mundos”.
Decerto as oposições se destacam pelo pessimismo, o conceito contrário, mas não esqueçamos que as oposições, cedo ou tarde, serão governo, e aí invertem-se as posições: os pessimistas viram otimistas, e vice-versa.
O tema do momento, a Guerra da Ucrânia, é um desfilar de otimismos. Por parte de (certos) ocidentais, que julgaram poder ignorar o combinado em 2014, e alargar a NATO para Leste, sem que a Rússia reagisse; de Putin, ao julgar que a “Operação Militar Especial” seria um passeio militar, com os ucranianos aclamando os “libertadores”; dos EUA, NATO e UE, julgando que as sanções seriam eficazes e inócuas, sem efeitos secundários, tipo boomerang, nas suas próprias economias; dos alemães, julgando que o abastecimento de gás russo era um dado adquirido; e assim por diante.
Lenine, o poeirento doutrinário, intitulou uma das obras “O imperialismo, estado supremo do capitalismo”. Por extensão, este conceito foi adaptado ao colonialismo.
Parafraseando a centenária locução, poderíamos dizer que “o otimismo é o estado supremo de todos os ismos”, todos confundidos numa alegre confiança, no melhor dos mundos.
E, na mesma onda de parafrasear slogans caducos, ir até ao apelo “otimistas de todo o mundo, uni-vos!”
E assim teríamos um futuro radioso, angelical - mas o pouco provável.