Por um Sistema Fiscal Específico (Parte I)
Ou seja, tudo aquilo para que o regime do CINM foi pensado e aplicado, deixou de fazer sentido
O recente Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia (que, refira-se, ainda é passível de recurso), embora não seja, necessariamente, uma “sentença de morte” do CINM (pois não afecta, de forma substancial, a continuidade da Zona Franca Industrial e do Registo Internacional de Navios), demonstra claramente que o mesmo, tal como preconizado pela Comissão Europeia, não constitui um instrumento adequado/eficaz para o desenvolvimento da RAM, designada e especialmente no que diz respeito ao sector dos serviços e do comércio internacional.
Na verdade, qualquer que venha a ser o desfecho desta acção, já ficou claro que a Comissão Europeia só aceita/aceitará um regime fiscal em que (i) as actividades sejam materialmente exercidas na RAM e (ii) os trabalhadores sejam residentes fiscais na RAM. E assim sendo, excepto para os sectores da Hotelaria e da Restauração, e, mesmo assim, apenas na parte respeitante a transacções com clientes não residentes em Portugal, o actual regime fiscal do CINM não só é, basicamente, inútil, como não constitui, de todo, uma ferramenta de internacionalização da economia Madeirense e/ou de captação de investimento estrangeiro.
Ou seja, tudo aquilo para que o regime do CINM foi pensado e aplicado, deixou de fazer – se é que, alguma vez fez – sentido e nunca mais voltará a ser permitido/autorizado. Pena é que se tenha demorado tantos anos a perceber – ou a assumir? – que o entendido/pretendido, por um lado, pela Comissão Europeia e, por outro, por Portugal e pela Madeira é (e sempre foi) totalmente divergente.
Qual é então – se é que existe alguma – a alternativa?
Desde logo, e necessariamente, um regime fiscal que não fique sujeito ao espartilho e às incongruências do regime comunitário dos Auxílios de Estado, que, na prática, serve mais para proteger os fortes, do que para ajudar os necessitados, bem como para desenvolver ideias que são bonitas na teoria, mas inúteis na prática.
Ora, quanto a isto, o Acórdão do Tribunal de Justiça fornece, salvo melhor opinião, 2 importantes “pistas”. Com efeito, e em primeiro lugar, o Tribunal não nega que, nos termos do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, e desde que com recurso a adequada fundamentação, as regiões ultraperiféricas podem beneficiar de um tratamento especial/diferenciado ao nível da política fiscal.
Por outro lado, o Tribunal também dá a entender que seria muito mais fácil justificar/defender o regime do CINM, se o mesmo fosse aplicável a todas as empresas da RAM, e não apenas às empresas especificamente licenciadas para operar no âmbito do primeiro, “restrição” que torna o mesmo selectivo e “extravagante”, mesmo no âmbito geográfico da própria Região.
Assim, aparentemente – e na minha modesta opinião – a solução passa por criar um regime fiscal geral para a RAM, que seja indistintamente aplicável a todas as empresas domiciliadas na mesma, “internacionais”, ou não. Um regime análogo ao do actual regime do CINM, e que, no essencial, garanta que a RAM seja uma zona de baixa/reduzida tributação, capaz de competir com outras regiões naturalmente – ou engenhosamente – privilegiadas.
E já agora – acrescento eu – estender tal regime de baixa/reduzida tributação aos contribuintes individuais, nomeadamente, não só para que a Madeira seja capaz de atrair e reter talentos e profissionais de alto valor acrescentado (sem o que poucas, ou nenhumas, empresas estarão disponíveis para se estabelecerem na Região), mas também para aumentar a base contributiva em sede de IRS.
Mas será esta solução permitida pela Constituição da República Portuguesa? E sendo, como pode/deve ser implementada?
Responderei a estas questões já a seguir…