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Revisitando a Hospitalização Domiciliária

Nos hospitais portugueses do SNS tratam-se, anualmente, cerca de 1.000.000 doentes

As Políticas de Longevidade complementarão esta atitude/ação/visão clínica.

É sabido que os hospitais de Portugal - não será exceção o Hospital Central do Funchal - têm grande carência de camas.

Interessa analisar algumas razões para essa carência ser tão notada, quando comparada com os dados europeus ou mesmo internacionais

Nos hospitais portugueses do SNS tratam-se, anualmente, cerca de 1.000.000 doentes. Desses, e utilizando as classificações habituais, temos 4 níveis de estágios de internamento (1,2,3,4), em função da severidade da doença, ou da complexidade posta para o seu tratamento (IDC 10). Sabemos, por um lado, que os de estágios 1 e 2 poderiam (digo mesmo, DEVERIAM) ser tratados noutro ambiente que não o hospitalar, porque tal medida traria para o SNS grandes vantagens, não só económicas e de gestão de internamentos, mas também uma concentração de meios mais sofisticados para serem postos ao serviço dos profissionais e, consequentemente, dos doentes de estádios 3 e 4. Sabe-se, por outro lado, que 65 a 70% dos cerca de 1 milhão de internamentos são de níveis 1 e 2. Portanto, cerca de 600.000 a 700.000 doentes (numa estimativa em baixa), poderiam ter acesso a outro tipo de tratamentos adequados às suas situações clínicas. Ficariam nos hospitais cerca de 450.000 a 600.000 doentes para serem tratados em ambiente hospitalar, já que alguns do estágio 2 poderiam justificar juntar-se aos de maior severidade. Sabemos, ainda, que consta do plano do Governo Nacional, a intenção do Ministério da Saúde, conseguir atingir este patamar, em sete anos.

Qual o resultado?

• Deixaríamos, naturalmente, de ter falta de camas, pelo que os seus rácios melhorariam,

• Teríamos uma melhor atenção sobre esses estágios de severidade 3 e 4;

• Deixaríamos de ter listas de espera enormes para exames e tratamentos e,

• Teríamos uma recuperação mais adequada para todos!

Assim, os portugueses regressariam ao seu posto de trabalho mais cedo, contribuindo para uma melhoria da economia nacional. Escuso-me de mencionar, ou mesmo fazer as contas, do que se pouparia em baixas por doença, cobrança de impostos, etc. etc. etc.

Outro indicador muito relevante diz respeito à taxa de mortalidade, que ronda os 4% - 5% dos doentes em ambiente hospitalar nos dois primeiros estágios de severidade; sendo que, na Hospitalização Domiciliária (HD) é ligeiramente acima dos 1%, ou seja, “quatro vezes menos”. Por sua vez, a taxa de reinternamento a 30 dias (BDMH) é de 9% nos internamentos convencionais, contra 2% na HD.

No Orçamento do Estado para 2022 consta a “consolidação do programa de HD”. Delfim Rodrigues, coordenador do Programa Nacional de Implementação das Unidades de Hospitalização Domiciliárias nas unidades públicas, explica que o objetivo é o de retirar das enfermarias os doentes com menor severidade e tratá-los em casa “nas mesmas circunstâncias, com os mesmos apoios e meios técnicos usados no hospital”.

Todos estes dados foram publicados no “Expresso Economia” e em “Saúde”, do dia 19 de setembro, baseados no relatório da Administração Central dos Serviços de Saúde de Agosto sobre Hospitalização Domiciliária (quadro Q9 ponto 11).

Analisemos, por analogia, o que se passaria na RAM, afirmando só em termos de poupança. A nossa população representa cerca de 2,7% da população nacional. A poupança nacional seria de 700 milhões a 800 milhões de euros: na RAM teríamos uma poupança entre os 16 e os 18 milhões de Euros, já que na Região os internamentos podem ser um pouco mais caros do que no Continente.

E ainda a propósito de HD, vou referir, por cópia, uma afirmação que vi escrita num artigo do Dr. Delfim Rodrigues, na Revista da Associação dos Administradores Hospitalares, n.º 20 (Janeiro, Fevereiro e Março de 2020), pág. 44:

“O Prof. Covinsky, internista, Universidade da Califórnia, adianta que um terço dos doentes com mais de 70 anos, e mais de 50% com mais de 85 anos, têm alta dos Hospitais com estatuto de saúde agravado em relação ao momento de admissão. Por sua vez, sabemos que esses mesmos doentes com mais de 85 anos, nos 30 dias pós alta:

• 30% entram em declínio funcional;

• 20% morrem;

• 40% necessitam de cuidador a tempo inteiro, por referência à data de entrada no Hospital”

(Maganizer et al, 2000, Boyd et al, 2008, Buurman et al, 2011, Croty et al, 2013)

O que se propõe em termos de cuidados de longa duração, já que sabemos que teremos muito brevemente pessoas com mais de 65 anos com rácios de 317/100 face aos jovens, em 2080 (previsões do INE), será diferenciar os de responsabilidade da SRSPC, cuidados paliativos, convalescença e reabilitação (HD ou Serviços de internamento específicos, sob responsabilidade hospitalar) e todos os outros da alçada da SRIC e SS, nomeadamente Lares de 3ª Idade (privados e IPSS) e os meramente de índole social, por incapacidades várias, inclusive familiares.