Meios de comunicação independentes impedidos de cobrirem protestos no Cazaquistão
Jornalistas e meios de comunicação independentes estão a sentir grandes dificuldades na cobertura dos protestos antigovernamentais sem precedentes no Cazaquistão, denunciou hoje a organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF), que instou o Presidente cazaque a garantir a liberdade de imprensa.
O Cazaquistão regista há vários dias massivos protestos contra o aumento dos preços do gás, que levaram à declaração do estado de emergência no maior país da Ásia central, sendo que jornalistas e meios de comunicação que procuram fazer a cobertura dos protestos estão a ser vítimas de perseguição pelo regime, realçou a RSF em comunicado divulgado no seu sítio oficial na Internet.
Como principais obstáculos para o trabalho jornalístico, a RSF aponta as prisões arbitrárias, a violência policial, telecomunicações bloqueadas e cortes na Internet.
As autoridades que tentam controlar a cobertura de notícias intensificaram os ataques a jornalistas independentes nos últimos dois dias, alerta ainda.
"As autoridades não estão a medir esforços para controlar as informações sobre os protestos e para limitar a cobertura dos media", apontou a responsável da RSF para a Europa Oriental e Ásia Central, Jeanne Cavelier.
"Esta agitação não deve servir de pretexto para censurar os meios de comunicação - muito pelo contrário. Instamos o presidente Kassym-Jomart Tokayev a restaurar imediatamente o acesso à Internet e a sites bloqueados, e a permitir que os jornalistas operem livremente, sem medo da polícia, para que possam cobrir um movimento de protesto que já é histórico", acrescentou.
Esta organização denunciou que muitos repórteres, que utilizavam coletes de imprensa, foram detidos sem motivo, exceto por "estarem a testemunhar a violência policial contra os manifestantes".
"Além dessas prisões arbitrárias, jornalistas também foram submetidos a ataques físicos e intimidações", apontou.
A RSF revelou ainda que os jornalistas têm sido alvo dos próprios manifestantes, relatando ameaças sobre uma equipa de reportagem que foi expulsa de uma manifestação.
Com o corte de Internet generalizado pelo país, as autoridades têm também reprimido os meios de comunicação 'online', "os únicos normalmente capazes de fornecerem cobertura irrestrita de notícias no Cazaquistão".
"Messenger, WhatsApp, Telegram e Signal deixaram de funcionar no início da noite de 04 de janeiro. E a Internet foi totalmente suspensa em todo o país por volta das 13:00 ontem [quarta-feira], a tal ponto que era até impossível ligar usando VPN's ou outros métodos, de acordo com a ONG especializada Netblocks", referiu a RSF, acrescentando que a Internet foi temporariamente restaurada durante a noite para um discurso do Presidente Tokayev, transmitido pela televisão.
De acordo com diversas agências noticiosas russas, que citam o Ministério do Interior cazaque, pelo menos 18 membros das forças de segurança foram mortos e 748 feridos nos tumultos que decorrem desde domingo.
Um anterior balanço referia-se a 13 mortos e 353 feridos nas fileiras das forças de segurança.
Segundo a mesma fonte, foram detidas pelo menos 2.298 pessoas envolvidas nos protestos.
"A situação é mais difícil em Almaty, onde elementos armados se apoderaram das instalações de diversas instituições, organizações financeiras e cadeias de televisão, que foram parcialmente destruídas", declarou o Ministério do Interior cazaque, citado pelas agências noticiosas russas.
"Estradas e uma linha de caminho de ferro também foram bloqueadas", acrescentou.
Em Almaty (sudeste), a maior cidade do país, os manifestantes atacaram e incendiaram edifícios oficiais, incluindo a câmara municipal e a residência presidencial.
O Cazaquistão, com o apoio da Organização do Tratado de Segurança Coletiva (OTSC), uma aliança militar que agrupa seis ex-repúblicas soviéticas, incluindo a Rússia, procura pôr termo aos distúrbios, que implicaram a declaração do estado de emergência no país pelo Presidente Kassym-Jomart Tokayev.
Com cerca de 18 milhões de habitantes, o Cazaquistão está a viver os protestos de rua mais graves desde que conquistou a independência, há três décadas.
A antiga república soviética da Ásia central vende a maior parte das suas exportações de petróleo à China e é um aliado estratégico da Rússia, dois países seus vizinhos.