A revolta da Madeira de 1931: um evento fotografável - I
FOTOGRAMAS
A imagem que hoje trazemos concerne a chamada revolta da Madeira de 1931, um ano que seria o “grande e derradeiro susto da ditadura” (e não ainda regime do Estado Novo fundado pela constituição de 1933), numa conjuntura de agitação, descontentamento social, contestações, lutas internas à escala nacional e então de revoltas em grande medida despoletadas por esta. Nas páginas que dedicadas ao acontecimento no sétimo volume da História de Portugal com direção de José Mattoso, o qual é coordenado pelo historiador Fernando Rosas, reconhece-se que perante as dificuldades de conspirações que fizessem face à ditadura após 1928, parte dos opositores e exilados políticos tinham a ideia de arrancar com uma revolução nas ilhas e então colónias, onde não só o “aparelho policial-militar da ditadura” era mais fraco como “se juntava a sobreconcentração de deportados civis e militares gozando de liberdade de movimentos” que potenciaria uma sublevação. Contudo, neste volume é igualmente reconhecido que a revolta tem, “na sua origem, causas regionais específicas: descontentamento provocado pela crise económica (crise das exportações tradicionais, do turismo, das indústrias dos bordados e dos lacticínios, desemprego crescente), pela crise financeira (falência das principais casas bancárias madeirenses) e pelo consequente reavivar dos sentimentos autonomistas.” O ambiente torna-se ainda mais propício perante os levantamentos populares e tumultos provocados pelo aumento do preço do pão originado por um decreto de 22 de janeiro, o qual a ditadura entretanto suspende, enviando contudo tropas para a ilha, e optando por uma postura repressiva e de ingerência no poder militar local. É ainda do próprio “núcleo de oficiais vindos do continente – sobretudo do tenente Manuel Camões – que parte a conspiração, em colaboração com parte da oficialidade local” e, embora os oficiais e políticos aqui deportados não adiram no início, aderem posteriormente integrando a Junta Revolucionária sob a presidência do general Sousa Dias. Numa publicação da autoria de Marco Gonçalves de 4 de abril de 2021 nas redes sociais do próprio Museu de Fotografia da Madeira – Atelier Vicente’s, detalhava-se a ordem dos acontecimentos. “O pronunciamento iniciou-se pelas 07h00 de 4 de abril de 1931, numa operação chefiada pelo tenente médico Manuel Ferreira Camões (1898-1963), que envolveu forças de Caçadores 5, Metralhadoras 1, Infantaria 13 e Artilharia 3, que toma o Palácio de São Lourenço, onde são aprisionados os coronéis Silva Leal (Alto Comissário do Governo) e José Maria de Freitas (Governador Militar). O Governador Civil de então, o capitão Almeida Cabaço, é também detido. Nesse mesmo dia, foi constituída uma Junta Governativa da Madeira, presidida pelo general Sousa Dias (1865-1934) e composta pelos oficiais Armando Hasse Ferreira, Augusto Casimiro, Carlos Bragança Parreira, Carlos Vilhena, Fernando Freiria, Filipe de Sousa, José Mendes dos Reis, Manuel Ferreira Camões e Sebastião Costa, que declara só depor armas assim que o Governo de Lisboa assegure o retorno ao sistema constitucional e o fim da censura.” A revolta terá tido adesão popular com manifestações no Largo da Restauração, sublinhando-se, no volume coordenado por Rosas, que o sucesso do movimento dependeria da sua capacidade em despoletar o levantamento no Continente, e esperando-se que o regime se fragilizasse na repressão, quer enviasse “tropas fortes” abrindo espaço para a vitória de uma ação no Continente, ou inversamente ao enviar “tropas fracas” suscetíveis de passar para o lado dos rebeldes. Nenhum dos casos se verifica e a revolta durará vinte e oito dias. Sobre alguns dos seus registos fotográficos da autoria de Charles Courtney Shaw, (como este aqui reproduzido), falaremos na nossa próxima crónica.
Ana Gandum
com a colaboração do Museu de Fotografia da Madeira – Atelier Vicente’s.